sexta-feira, setembro 12, 2003

Memórias

Segundo informam as agências, o jornal alemão “Die Welt” publicou no mês passado a ficha da STASI, os serviços secretos leste-alemães, referente ao conhecido escritor Gunter Wallraff.
Segundo essa ficha o dito intelectual da Alemanha Ocidental era colaborador desses serviços, integrado no departamento X, que estava encarregado da desinformação no Ocidente – e isso já desde o remoto ano de 1968.
Fica assim mais compreensível a biografia desta vedeta mediática, omnipresente durante muitos anos nos media sobretudo alemães e franceses – mas que também teve o seu momento de glória em Portugal, como se contará mais adiante.
Com efeito, recordam as agências que o momento alto da carreira do escritor foi já nos anos oitenta, como o romance “Ganz Unten”, que foi best-seller na Alemanha e também em França, com o título “Tête de turc”. Não sei se está publicado em Portugal. No Brasil está, também com o título “Cabeça de Turco”.
Mas tivessem as senhoras agências consultado este vosso amigo e muito mais ficariam a saber.
Na verdade, esse rapaz, então nada conhecido, apareceu por cá no ano de 1975. Como se recordam os menos novos, o país estava em ebulição. Apresentou-se ele então a pessoas referenciadas como importantes expoentes da direita clandestina, insinuando ligações internacionais do maior relevo para a luta anti-comunista – e os tais altos expoentes engoliram o isco e o anzol.
Com a intrínseca generosidade da referida direita, todas as portas lhe foram abertas: andou o homem por aí em reuniões secretas, país fora, comeu e bebeu à conta dos anfitriões, foi conduzido até aos deuses, teve acesso a tudo, cá dentro e em Madrid. Até ao Caco Baldé ...
Passados poucos meses, desaparecido o misterioso agente que iria trazer imprescindíveis apoios internacionais para a causa da contra-revolução, surgiu, com grande aparato, o livro onde o jornalista e escritor Gunter Wallraff, então já assim identificado, contava o resultado das suas investigações no seio da tenebrosa extrema-direita portuguesa, que se preparava para as piores malfeitorias contra a jovem e indefesa democracia.
Chamou-se o livrinho “A descoberta de uma conspiração”, e tornou então o Wallraff um herói do “jornalismo de investigação” e uma bandeira da esquerda doméstica.
E mais do que isto estou eu à espera de saber há mais de 25 anos, nas prometidas memórias do José Valle de Figueiredo. Prometidas estão.