sexta-feira, outubro 24, 2003

Arqueobibliografia

No "Católico e de Direita" questiona-se a ausência de Gustavo Corção nas letras portuguesas. A interrogação é oportuna, e foi logo respondida pelo próprio: são frutos do tempo.
Mas nem sempre o desconhecimento foi total: houve uma época em que Corção era lido e seguido em certos meios intelectuais católicos lusitanos. Estes é que mudaram, quando Corção não mudou. Tal como aconteceu no Brasil com Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde), primeiro compagnon de route e mais tarde, depois do seu aggiornamento, alvo predilecto das setas de Corção. Tudo tem a ver com o dilúvio do progressismo católico.
Dessa primeira época ficou a edição em Lisboa de duas obras de Corção: "A descoberta do outro", editado em 1943 e 1955, e "Lições de Abismo”, editado em 1955. Ou seja: a última edição data de 1955!
Mas para melhor compreensão do que digo leia-se o prefácio de António Alçada Baptista à edição de 1955 de "A descoberta do outro". Coisas dos vencidos do catolicismo, para usar a expressão de Rui Belo já adoptada também por João Bénard da Costa, dois desses ilustres vencidos, como Alçada.
Depois de todas as rupturas consumadas, Corção ficou a ser património exclusivo dos reaccionários subsistentes. Sei que esteve em Lisboa em 1973, onde se deu ao convívio das hostes. Leia-se a este respeito o que escreve João Bigotte Chorão no seu "Reino Dividido (Diário 1969-75)".
Há também uma curiosa alusão a Corção num poema de Rodrigo Emílio, denotando estima e conhecimento; o poeta ameaça ir também para Pasárgada, "pra junto de seu Manuel", e apela "você me cede um corcel? / decerto cede, Corção" ...
E termino, que o postal já vai longo. Mas um dia destes vou publicar aqui um velho artigo de Nelson Rodrigues a propósito do ostracismo decretado contra Gustavo Corção em terras de Vera Cruz.