Os barbos da Foz do Sabor
Por ter falado, no postal anterior, em Francisco José Viegas - vejam só os mistérios da mente! - vieram-me à boca umas sensações gustativas que vêm das profundezas da memória.
Explica-se a coisa por aqui há uns anos, quando eu ainda comprava jornais, ao Domingo, ter deparado com uma crónica em que o dito Viegas dissertava, com a alma cheia, sobre umas petiscadas in situ.
Fiquei preso ao papel, saboreando a experiência. E revivendo. Pois saibam que nunca mais me passou a recordação dessa crónica.
A Foz do Sabor é um desses locais mágicos, entre a terra e o céu, em que a marca da Criação se sente a cada olhar.
Ali o riozinho que atravessa as penedias do planalto espraia-se e espreguiça-se, descansando antes de se entregar nos braços do gigante.
O local é frequentado essencialmente por pescadores, caçadores, e outros amantes da petisqueira. Entretanto nasceu amesendamento para tal.
Dominam, porém, esmagadores, o silêncio e a paisagem.
Quando li o artigo tinha eu já em arquivo de vida umas valentes soalheiras que passei por ali, cismando na má sina que por insondável desígnio levava os peixinhos a fugir de mim, tanto mais quanto eu teimava em lançar-lhes isco e engodo.
Os barbos e os escalos eram teimosos, fosse lá por embirrarem comigo ou por lhes terem dito que eu era alentejano, e refugiavam-se todos lampeiros no anzol prestimoso do senhor Leitão, meu inestimável companheiro, enchendo-lhe o bornal, perante o meu olhar perplexo e ciumento.
Mas o final compensava: fritinhos, marchando ao ritmo de um vinhito fresco e saltitante, com uma saladinha a condizer, e sentia-me que nem o Jacinto em Tormes.
Era isso também o que dizia, com muitíssimo mais talento, o Francisco José Viegas, na tal crónica que não guardei mas que me ficou guardada.
O que ele nunca papou foi um butelo com cascas que me foi dado a comer certa vez em Peredo de Bemposta – porque aí até a prosa mais refinada não pode dar senão um cheirinho.
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