domingo, novembro 23, 2003

CEIFEIROS

Estes ceifeiros não são
Os ceifeiros do Fialho.
Têm braços, mãos, almas duras,
Têm fogo no coração,
Têm amor ao seu trabalho,
Por ser trabalhar no pão.

Estes ceifeiros são
Grilhetas, são orgulhosos
De darem, ao mundo, pão;
Porque são eles que o dão
A pobres ou poderosos

Está hoje vento suão.
Está quente, - oh gentes! Está quente!
Vamos lá, outro empurrão!
Não vá desgranar-se o grão ...
- E a fila marcha prà frente.

Range o restolho cortado,
Pela serrilha da foice,
E aquele mar ondulado,
Que foi lindo mar doirado,
Não tem espiga que baloice.

Quando a gente está afeito,
Quase não sente o calor.
Cortar o pão quer-se feito
Co'a ternura, gosto e jeito
Com que se fala de amor.

A espiga está grada e bela.
O Inverno ainda vem longe
E, nesta vida singela,
Ter pão é estar à janela
E poder olhar pra longe.

Estes ceifeiros não sabem
Mais que a vida natural.
Mas têm a intuição que cabem,
As mãos que esta fama acabem,
Dons do sobrenatural.

Francisco Bugalho