Mário Beirão
Neste Domingo que antecede o 1º de Dezembro, lembrei-me de Mário Beirão. Lembrei-me de outros primeiros de Dezembro em que saíamos pelas ruas da cidade cantando versos de Mário Beirão.
Foi esse o pecado de Mário Beirão, o pecado sem perdão que o condena para sempre à maldição e ao esquecimento – escrever aqueles versos ... Poucos poetas terão pago tão alto preço pr um poema!
Em Beja, onde ele nasceu e que ele amou, venera-se o saramago, rasteira erva daninha que traiçoeira se enrola no caule do trigo, com as suas pequenas folhas ásperas e furtivas flores brancas a ocultar o vermelho do ódio.
Não se lembra o poeta maior do Baixo Alentejo, que esse escreveu para a mocidade a sua marcha.
Mas que importa – se não for amanhã será depois de amanhã, alguém irá descobrir os livros escondidos. E das páginas de “O último Lusíada”, “Ausente”, “Lusitânia”, “Pastorais”, “A noite humana”, “Novas estrelas”, “Mar de Cristo”, “O pão da ceia”, “O oiro e a cinza”, sairá vibrante o cântico que ele sonhou.
E pelas ruas das cidades soará a melodia que proclama “lá vamos, que o sonho é lindo,/ torres e torres erguendo,/ rasgões, clareiras, abrindo,/ alvas de luz imortal” ...
Hoje, em homenagem à sua terra, fica aqui um poema de Mário Beirão dedicado aos cantadores do Baixo Alentejo.
MODA ALENTEJANA
(Para os cantadores de Montes Velhos)
A ribeira do Xacafre
Vai rasa dos meus cuidados:
No escuro das águas tristes,
Há laivos ensanguentados...
Ó meus olhos, ó meus olhos,
- Noite e dia - que estais vendo?
A ribeira do Xacafre,
Da minha alma discorrendo!
Na ribeira do Xacafre,
Uma voz suspira fundo:
A voz da minha saudade,
A despedir-se do mundo!
Aldeia de Montes Velhos,
Não posso querer-te mais:
És a luz do sol-nascente,
Abrindo, em flor, nos meus ais!
Aldeia de Montes Velhos
És sempre luz de Alvorada
És sempre rosa de altar
Da chama de uma queimada!
Eu hei-de florir na urze,
Arder no vento suão,
Lá, na Charneca das Naves,
- Mar alto da Solidão!
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