Tudo atado e bem atado
Longe vão os tempos, todavia próximos, em que o Presidente Sampaio, certamente aconselhado por assesssores que lhe sopravam que isso caía bem entre o povinho, fazia discursos inócuos proclamando o "excesso de garantismo" do nosso processo penal e a necessidade de corrigir esse mal, que entupia a justiça penal.
Agora o mesmo Presidente, abalado nas suas convicções gerais por azares muito particulares, lançou-se definitivamente na cruzada em prol da defesa dos direitos dos arguidos, que é preciso assegurar sempre e cada vez mais - ao ponto de propor a introdução de mais um recurso, directo para o Tribunal Constitucional, no arsenal de quem se sentir ameaçado pelas perversas perseguições judiciais.
Seria o chamado "recurso de amparo".
Mas escusava o Presidente de se ralar tanto: aqueles que ele tem em mente já estão muito bem amparados.
Apareceu agora a notícia de que o Tribunal Constitucional, dando mais um decidido passo em frente no seu estatuto de junta de salvação dos políticos apanhados nas curvas, pronunciou-se pela ilegalidade da suspensão do mandato da Presidente da Câmara de Felgueiras.
Quer dizer: é um cargo político, com legitimidade electiva, os tribunais não podem tocar nisso. Se o tesoureiro ou o contínuo da repartição meterem ao bolso uns dinheiros da gaveta podem ser de imediato suspensos das suas funções por despacho judicial - para evitar a continuação da actividade criminosa e o alarme social que razoavelmente resultaria do facto de alguém ir pagar as suas taxas ou contribuições a quem na véspera tinha sido apanhado com as mãos na massa.
Mas se quem roubar for o Presidente da Câmara, ou o Presidente da Junta, alto lá: ainda que seja apanhado em flagrante, o tribunal tem de pôr-se em sentido e respeitar a separação dos poderes. O eleito continuará em funções.
Bem poderá destruir a papelada comprometora, reunir com quem sabe para dizer que nada sabe, organizar a defesa e a continuidade do negócio: o tribunal nada pode fazer contra a sua continuidade em funções.
Muito admiro eu a pertinácia e a indignação do Portugal Profundo; mas eles querem lá saber do Portugal profundo!
Tudo está atado e bem atado.
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