Os novos ministérios
No amplo salão fez-se um silêncio cavo. As seis dúzias de sábios que pensavam e decidiam em redor da mesa do conselho entreolharam-se curiosos. Então o chefe do governo explicou.:
- Meditei, realmente meditei sobre o assunto e cheguei à conclusão que devíamos alterar o já decidido. Em vez de uma Comissão de Inquérito à Corrupção, como aprovámos há dias, vamos antes criar uma Secretaria de Estado para a Corrupção. Talvez mesmo um Ministério... Tem mais dignidade, maior amplitude e está afinal mais de acordo com os nossos processos.
- Muito bem! – aplaudiram alguns dos presentes. Um deles acrescentou:
- É preciso legalizar a corrupção! Nós queremos um Estado de Direito! É preciso libertar a corrupção das grilhetas da marginalidade!
- Bem! – acudiu o primeiro-ministro, - não se trata propriamente de libertar a corrupção, mas de satisfazer mais um dos nossos correligionários, de chamar mais um dos bons do nosso partido às cadeiras do governo...
Um sujeito muito escuro, que estava ao lado do primeiro-ministro, abanou a cabeça de mocho-sábio careca e rosnou:
- É verdade que nos acusam de sermos o país com o maior governo do mundo que desgoverna o país mais pequeno do mundo...
Levantou-se a mão interruptora do chefe do governo:
- O mais pequeno, não exageremos!... Então a Albânia? E o Luxemburgo? E Andorra? Vocês cada vez sabem menos de Geografia. E ainda estão apegados às ideias de grandeza de outros tempos. Ora, em vez das manias do antigamente, nós temos de viver as realidades do presente. E para isso há que preparar as estruturas adequadas...
- Está bem! – acudiu um homenzinho fanhoso. – Está mesmo muito bem. Só não percebo por que diabo se há-de criar um Ministério da Corrupção, da Corrupção, que é uma coisa que nós temos... Podíamos antes criar um ministério de coisas que não temos. Como a Educação e Cultura, como a Agricultura e Pescas, como a Economia, como as Finanças...
Vozes na sala: - Não! Não! Fora! Fora!
Tornou o homenzinho fanhoso:
- Assim já nos entendemos. Criamos um Ministério da Corrupção, porque há muita corrupção. Mas também há muito lixo. Sim, meus senhores, muito lixo! Não só em Lisboa. Vão por esse país fora e verão que os detritos que dantes se queimavam ou botavam na estrumeira para fertilizar as terras são hoje despejados para a beira dos caminhos. O país está cheio de lixo. Daqui a pouco, em vez de Portugal, somos Lixual! Mas há mais...
- Mais?!..
- Sim senhores, há mais. Ao lado da corrupção e do lixo, há os roubos. Os roubos com violência, com assaltos, com assassínios. Então os roubos não merecem pelo menos uma Secretaria de Estado? É só a corrupção?
O primeiro-ministro fitou o homem, com espanto, piscando os olhinhos de chinês, e franziu a testa, interrogativo:
- Temos então que o senhor propõe a criação de um Ministério do Lixo, outro da Corrupção, outro do Roubo...
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