terça-feira, junho 08, 2004

Os vencidos do catolicismo

Já aqui tinha chamado a atenção para o livro de João Bénard da Costa, "Nós, os vencidos do catolicismo", pela singular importância que se me afigurou ter para o conhecimento do itinerário geracional, e pessoal, de um conjunto de gente, entre as quais personalidades notáveis a vários títulos, que marcaram presença na vida portuguesa a partir da década de cinquenta do século XX.
Desde logo o livro, a que já tinha tomado o sabor pela leitura parcial em crónicas no "Independente", parecia-me ter muito de memória, mas também de testemunho, ou testamento, ou até de carta pessoal e interpelante dirigida a D. António dos Reis Rodrigues. Que assim era pareceu-me de certo modo confirmado pouco depois quando vi nas livrarias as memórias do Bispo.
Adquiri mais certeza sobre a relevância do depoimento e reflexões de Bénard da Costa, como autoretrato dessa geração de homens todos eles agora com mais de setenta anos e que viveram intensamente uma ilusão de catolicismo - e as desilusões desse caminho. Como superiormente está no poema de Ruy Belo, o bardo do grupo, que deu o título ao livro. ("Nós, os vencidos do catolicismo/ que não sabemos já de onde a luz mana"...)
Recordei hoje o livro pela evocação que dele faz em "O Diabo" o Dr. Dinis da Fonseca, que também foi presidente da Juventude Universitária Católica no final do seu curso de Medicina, por 1958/1959.
Não surgirão muito mais depoimentos vindos de dentro, dada a idade dos protagonistas. Poderia ser interessante que o fizessem Alçada Baptista, que está presente nos primórdios e também no final do trajecto, com a sua "Moraes Editores", e "O Tempo e o Modo", como seria interessante conhecer a visão de Vasco Pulido Valente, que apanhou, sendo mais novo, a parte final da história, as iniciativas dos anos sessenta em que, finalmente, acabou por dissolver-se toda a lógica de grupo ou de geração, por degenerescência ou desistência ou transformação. Ou derrota, como no fundo dizem Bénard e Ruy Belo.
O livro traça um percurso de 1954 a 1968. E não consigo afastar a ideia que a isto tudo outros católicos teriam também uma palavra relevante a acrescentar. Até porque a história de uns pode explicar ou ajudar a explicar o percurso dos outros. Podia ser a deixa para o Dr. Cruz Rodrigues.