domingo, junho 13, 2004

Vamos aos votos!

A minha gente é muito ciosa dos seus votos. Regra geral, não há como levá-la até às urnas. É pessoal que não acredita neles, e pronto: vai daí manifesta forte alergia aos rituais de legitimação do sistema. Seja porque não há em quem votar, seja porque não serve para nada, seja porque não lhe apetece, seja porque tem mais que fazer, o certo é que dificilmente nos apanham lá. É um mecanismo inconsciente, incontrolável, ou sabe-se lá se é inconfessadamente para ficar entre os vencedores - o partido da abstenção é sempre o maior, e isto é tudo gente mais afeita às derrotas que às vitórias - a verdade é que em dia de eleições nessa é que não encontro os meus. Aliás, nesses dias acontece nem os encontrar; ignoro onde se escondem, mas com efeito nessa altura desaparecem de todo e só surgem de novo à luz do dia após cumprido o cerimonial todo, quando o país retorna às ocupações usuais.
Nessa altura regressam todos, aliviados por já ter passado a perturbação eleiçoeira, e tão críticos como antes. Para dizer bem até voltam com o criticismo redobrado, porque é norma os resultados confirmarem que aquilo não servia para nada - e o meu pessoal, nisso não se distinguindo do português médio, adora ter razão e fazê-lo notar.
Não há gente tão crítica quanto ao valor dos papelinhos mas ao mesmo tempo tão agarrada aos mesmos. É o cabo dos trabalhos para largarem um quadradinho de papel devidamente preenchido (sim, porque às vezes, por pressão familiar ou curiosidade para ver como se faz, alguns ainda caminham até lá, mas no sítio não resistem e na posse do mesmo dá-lhes uma fúria e escrevem no dito nem eu sei bem o quê).
É assim a modos que uma superstição, uma mania, uma desconfiança insuperável. Conheci um que me dizia sempre, com ar alarmado: "- Votar?!!! Eu só voto em mim.... e é de pé atrás!..."
Dito isto, o que é que eu quero afinal? Pois quero simplesmente que sorriam e vão votar. Nesta época luminosa em que o progresso, a liberdade e a democracia desfizeram finalmente todos os tabús não temos o direito de ficar presos a medos irracionais. Vamos lá aos votos! Vão ver que não custa nada, e aos depois um homem até se sente melhor. Afinal, cá na nossa sociedade, e como diriam solenes todos os bonzos deste pagode, votar é um grande dever.