Lições de um fiasco
As organizações envolvidas na abortada manobra do barco do aborto esfalfam-se por encontrar as formas de diminuir os estragos, e retirar ainda os proveitos possíveis da iniciativa.
Entretanto, como em tudo na vida, alguns ensinamentos ficam no ar, à disposição de quem queira.
Copio um parágrafo de uma notícia do "Portugal Diário":
"A organização Women on Waves recebeu cerca de 20 chamadas de mulheres portuguesas a pedir informação sobre o "Barco do Aborto", mas a linha de atendimento especial está desligada, disse hoje à Agência Lusa fonte da associação".
Como se pode, depois disto, continuar a apresentar a questão do aborto como um dramático problema de saúde pública que afecta multidões de portuguesas que por aí sofrem sofrimentos inomináveis enquanto aguardam alterações legislativas? Não será altura de confessar abertamente que se trata apenas de um ponto programático de grupos políticos de dimensão quase confidencial que por esta forma procuram evidenciar-se?
Não será evidente que a esmagadora maioria dos portugueses e das portuguesas está fartíssima de tal conversa, e vota o assunto à indiferença e ao esquecimento?
Vinte chamadas a pedir informação! Depois da aluvião propangadística! E dessas vinte provavelmente quase todas serão de jornalistas e outros curiosos...
Por aqui fica à vista a magnitude e a urgência do "problema".
Apetece-me aprofundar a análise e atacar a fundo: quem tem um sério problema é uma certa esquerda, sociologicamente de extracção exclusivamente burguesa, que há muito abandonou as causas ligadas ao social que lhe garantiam a boa consciência (os trabalhadores foram relegados para o baú da história..), e agora se agarra desesperada aos temas "fracturantes", de cariz moral sobretudo, e de preferência conexas com a moralidade sexual ou afins, a fim de garantir a sua própria sobrevivência - já não nas "massas trabalhadoras", mas antes nas camadas da burguesia urbana alienadas pela sociedade de consumo, que dita o domínio da facilidade, o princípio do prazer, a busca da satisfação imediata, e para quem a simples existência de uma moral, que exige e impõe, já é uma ideia insuportável.
Enterrada a esquerda dos operários, temos no seu esplendor a esquerda dos costureiros, dos publicitários, dos manequins e das vedetas de televisão.
Termino por aqui, para não ultrapassar o limite de atenção do cibernauta médio.
Não deixo no entanto de fazer uma referência a outra descoberta que estas polémicas permitiram: pelo menos duas das organizações integrantes da plataforma que organizou a vinda do barco do aborto e toda a agitação mediática gerada à sua volta têm como fonte de financiamento conhecido os dinheiros públicos. Vivem com o dinheiro dos nossos impostos, que recebem através de subsídios do Instituto da Juventude. Ignora-se quais sejam as actividades que justificarão a atribuição de tais subsídios - as actividades que se lhes conhecem são estas.
E pergunto eu: se o dinheirinho é de todos nós, como se explica que vá parar precisamente às mãos destes?
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