Uma estratégia portuguesa
A organização da diáspora portuguesa - um dos principais factores de afirmação de Portugal no Mundo
A actual situação de vulnerabilidade das bases económicas e culturais da independência nacional que se manifesta não só ao nível das estruturas económicas internas, mas também ao nível de afirmação do país no contexto internacional e em particular no contexto europeu, exige dos nossos governantes a realização de uma profunda reflexão visando identificar os factores que possam reforçar a posição de Portugal no mundo na componente da mundialização.
Os responsáveis políticos e os investigadores nacionais têm orientado de um modo limitado e redutor, as suas análises e propostas estratégicas para os factores de competitividade das estruturas económicas internas, e também para a eficácia administrativa dos sectores público e privado.
Esta visão redutora leva os nossos responsáveis a consciente ou inconscientemente esquecer um factor estratégico que já é de facto, e pode revelar-se ainda mais importante no futuro para a afirmação de Portugal no sistema de poder ao nível mundial, a diáspora portuguesa : constituída por comunidades que se implantaram e desenvolveram em grande número de países de vários continentes que se aproximam hoje dos 15 milhões, sendo 5 milhões de portugueses directos, e os restantes luso-descendentes com nacionalidade portuguesa, dupla nacionalidade, ou simplesmente uma ascendência portuguesa. Pelo elevado número, e pela sua cada vez maior importância no contexto social, económico, e político, dos países de acolhimento, as comunidades portuguesas constituem sem dúvida um dos maiores vectores da influência e da afirmação de Portugal ao nível mundial.
É incompreensível em termos políticos e mesmo históricos, que os nossos dirigentes não tenham até agora «devido a uma cegueira política e ideológica que infelizmente tem afectado partidos e intelectuais» tomado consciência, nem concebido estratégias adequadas para dar expressão real à grande força de redinamização e de reforço da nação portuguesa que constitui a nossa diáspora. Esta deve ser organizada de maneira inteligente para poder dar uma nova dimensão, não só politicamente através da participação dos emigrantes na vida política dos países de acolhimento, mas sobretudo ao nível sócio económico por meio de estabelecimento de redes de cooperação empresarial e de solidariedade profissional, ao potencial de afirmação e de influência histórica dos portugueses, e ao reforço da portugalidade no mundo.
O poder político e as administrações públicas e diplomáticas de que o nosso país tem nesta conjuntura, não dispõem de meios, nem de um projecto político à altura para realizar a grande tarefa nacional que é a organização da diáspora portuguesa ao nível mundial.
Face a esta insuficiência, - incapacidade actual do estado, da administração, e do nosso sistema político, - o caminho preferível, o mais evidente, é o do fomento da auto-organização da diáspora através da sua capacidade de iniciativa e dinamismo, cujos grupos mais activos poderão suprir estas insuficiências públicas formando e dinamizando um projecto político e organizativo, um projecto naturalmente virado para defesa dos interesses dos portugueses e de Portugal no mundo, alargada a todos os países de expressão portuguesa, e regiões onde a língua e a memória portuguesa ainda subsiste, como ex. Malaca, Goa, Damão e Diu, Casamança (crioulo português), Indonésia (Flores) Togo e o Benim, sem esquecer a Europa onde em países como a França e Luxemburgo a comunidade portuguesa tem grande relevo.
Malaca, onde 3 milhares falam, cantam, sentem, vivem, e rezam à maneira portuguesa, esquecidos há muitos anos pela pátria de origem que lhes deu uma identidade, sem escolas ou apoios culturais que lhes permita não só a continuação evolutiva da língua, como da sua própria expansão nesse canto da Ásia; Guiné e Senegal onde a língua portuguesa entrou oficialmente nas universidades; S. João Baptista de Ajudá, África do Sul, que começa a despontar a importância nacional da língua portuguesa como forma diferenciada da colonização inglesa com influência e apoio de moçambicanos e angolanos, ocupa já uma posição de relevo nos lugares das línguas oficiais; na Califórnia e na Costa Leste dos Estados Unidos.
Timidamente o governo central de Lisboa começa a tomar conhecimento deste potencial, embora sem ter um projecto político à altura, nem estruturas consequentes de apoio.
Aproveitando os recursos das novas tecnologias da comunicação, há que promover a criação e multiplicação de cyberespaços e de redes Internet de contacto, diálogo e solidariedade entre os grupos que constituem a diáspora portuguesa alargada no mundo.
Existem hoje meios instrumentais e técnicos que nos permitem com facilidade organizar, auto-organizar, as centenas de milhões de indivíduos que falam português e reivindicam a portugalidade no mundo.
Esperemos que este potencial irrefutável possa ser compreendido pelos nossos responsáveis políticos.
António Sustelo
Presidente do Centro Português de Arte e Cultura de Bruxelas
(Artigo no CIARI- Centro de Investigação e Análise em Relações Internacionais)
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