Já chegámos à Madeira?
A notícia mais relevante destes dias é, a meu ver, a prisão preventiva do Presidente da Câmara de Ponta do Sol, arguido em crimes de corrupção.
O referido dirigente político pertence ao partido governamental, e está há muitos anos à frente daquele município.
Como se esperaria, o Presidente do Governo Regional, Alberto João Jardim, partiu já em campanha contra polícias e juízes.
Algumas vozes irão aproveitar para atacar Alberto João, mais uma vez glosando o mote da sua incontinência verbal, do sistema de poder que ele instalou na Madeira, da sua falta de respeito pelas instituições do Estado.
Eu impressiono-me pouco com Jardim. A questão tem importância mas não é por causa dele. Eu explico: o que ele diz é o que pensa toda a classe política. Ele diz em voz alta o que os outros murmuram em voz baixa. Este caso vai ter o seu impacto nas fileiras governamentalistas: é um dos seus que foi apanhado. Mas não se pense que só esses se doem: todos os autarcas, pelo menos eles, sentem-se logo ameaçados com anúncios destes.
Explico ainda melhor: em todos os contactos que alguma vez mantive com gente instalada na classe política com responsabilidades (deputados, dirigentes partidários, autarcas) constatei sempre que nestas situações o seu coração pende instintivamente para a "vítima". Era clamoroso o sentimento quando foi o escândalo Fátima Felgueiras, quando ocorreu o episódio Paulo Pedroso, quando das peripécias com Valentim Loureiro, ou com Cruz Silva.
Mas o sentimento é profundo, e arreigado, e generalizado bem antes desses casos pontuais. E é comum nos partidos principais. Quando surgem manifestações do contrário, declarações rituais de "confiança na Justiça" emitidas em tom fúnebre, não passam de exercício de conveniência imposto pelas circunstâncias.
Pelo que este acontecimento tem real importância no renovar desse estado de espírito. E vai ter consequências, reforçando as convicções sobre a necessidade de "reformas na Justiça". Que sentido terão elas, não custa adivinhar.
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