Os suspeitos
«Quem descobrir alguém
suspeito de ser cristão
informe a autoridade»
(O Massacre de Shimabara em 1638)
Quem suspeitar do amor
Com filiformes sedas
E veias incorruptas
E prolongadas fontes,
Quem suspeitar da luz
Na doce obscuridade
Informe a autoridade.
Quem suspeitar da fome
À mesa reluzente.
Quem suspeitar da Cruz
Entre a família ausente.
Quem suspeitar da sede
Por dentro da amizade
Informe a autoridade.
Quem suspeitar que há laços
De bíblicas imagens.
Lázaro ao nosso lado.
Novas ressurreições.
E Cristo no pecado
E romanas miragens
Nos circos, nos algozes,
Coroados de louros.
Quem suspeitar da esperança,
No átrio da memória
Da imensa liberdade
Que o suicídio evade,
Informe a autoridade.
E o mais suspeito vem
Bater à noite morta.
Traz nos dedos de garras
Sangrando, um coração.
Gota a gota, nos lábios
O futuro da Vida,
Canta no espaço humano
A enorme transfusão.
Na eterna leucemia
Do renovado dia
Apavora o suspeito
A paz do hospital.
Branco, branco o elemento
Que embala o pensamento.
- Mas sonho sonolento.
Mas subtil caridade -
Ao vampiro do Tempo
Impõe a edilidade
Que o conselho dos velhos
Informe a autoridade...
A multidão das sombras
As hostes das visões
Computadores cruéis
Mais os homens robots
Instalaram nos lares
Ouvidos e espiões.
Em corações de corda
Em frios corações
Deitaram a paixão.
- Trituram as paixões.
Mas o massacre aguarda
As ordens implacáveis.
Quem suspeitar do amor
Em filiformes sedas.
Quem suspeitar da sede
Por dentro da amizade.
Quem suspeitar da esperança
No átrio da memória,
Da imensa liberdade
Que o suicídio evade,
Quem suspeitar de Cristo
Em sóis quotidianos
No peito lacerado
Aberto ao companheiro,
E quem quiser dizer
O que dizer não há-de,
Avise a autoridade.
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