O fim de "O Dia"
Na verdade tratou-se só de desligar a máquina; há muito que os sinais de vida eram meras ilusões de alguns, que se esforçavam para as manter.
Segundo se anunciou agora, a edição da passada sexta-feira foi a última para o jornal "O Dia".
A "suspensão" (?) do título, conforme foi explicada, ficou a dever-se a "questões de natureza económico-financeira".
O diário era nesta última fase propriedade da "Fólio – Edições e Comunicação Social" e tinha como director Antero Silva Resende.
Tinha sido fundado em Dezembro de 1975. Quantas vicissitudes nestes vinte e nove anos de existência agitada!
O acontecimento podia ser apontado como mais um episódio da crise da imprensa escrita, e da impossibilidade prática de manter tais órgãos de informação fora da lógica de funcionamento dos grandes grupos económicos.
Porém, nesta hora do fim gostava sobretudo de recordar com saudade o grupo fundador de "O Dia", constituído essencialmente de entre os vinte e tal redactores que haviam sido expulsos meses antes do "Diário de Notícias", quando ali exercia funções de controleiro zeloso e odiento aquela criatura entretanto nobelizada, protagonista do que continua a ser o episódio mais vergonhoso da história do jornalismo em Portugal.
Ninguém imagina hoje esses tempos em que a imprensa matutina de Lisboa era representada pelo "Diário de Notícias" e por "O Século", reduzidos a meras edições diárias do "Ávante" em versão mais panfletária e radical.
O aparecimento de "O Dia", com as figuras prestigiosas de Vitorino Nemésio e David Mourão-Ferreira à cabeça, rompeu definitivamente com o universo monocolor, em violentos tons de vermelho, que dominava a imprensa escrita de então. Teve uma adesão popular que o transformou de imediato num sucesso de vendas espantoso, com tiragens hoje inimagináveis.
O êxito foi temporário, por muitas razões e desde logo porque as causas do mesmo eram em grande medida conjunturais. Sucederam-se inúmeras peripécias, num longo processo de definhamento que incluiu falência, encerramentos, reaberturas, mudanças de titulares, de instalações, de tudo... arrastando-se penosamente até ao final que se anunciava. Requiescat in pacem.
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