domingo, julho 24, 2005

QUE FAZER?

Porque importa ir além das fórmulas rituais e das banalidades vazias da circunstância, transcrevo a última crónica de Nuno Rogeiro na revista "Sábado", sobre a questão do terrorismo, a qual, não sendo certamente a que eu escreveria, contém já algumas orientações (a meu ver) na boa direcção.

Quando Lenine escreveu "0 Que Fazer?", no confortável exílio de Munique, em 1901, tratava-se de encontrar a via concreta para a revolução, ou aquilo que se pretendia fazer passar por ela. A linha geral fora traçada pelos autores de "0 Capital", mas o diabo estava nos detalhes.
Com a questão do terrorismo "Jihadista", está também (quase) tudo sabido, em teoria, mas a prática "revolucionária", destinada a desarticulá-lo, precisa de ser combinada. Outra vez.
Da consulta com líderes, letrados, militantes ou simples crentes do Islão, que vivem na Europa há décadas, tentei colher um pequeno manual de instruções.
Por onde começar?
Pelas palavras e pelos motivos, pelo dogmatismo e pela crítica. O Ocidente precisa de ser claro: não quer explorar o Iraque, não quer perpetuar um statu quo injusto na Palestina. Se a retirada total de tropas e pressão adicional sobre Israel forem úteis, que se usem.
Por outro lado, convém não insistir no "islamismo" dos terroristas. A qualificação não nos conduz a sítio algum, e dificulta a discussão. 0 que é preciso é salientar que há uma linha de humanidade a separar quem está a favor e contra o terrorismo internacional, como forma de resolução dos problemas. Todos os países e regimes do mundo devem ser obrigados a definir-se sobre isto.
A seguir, sobre massas e consciência. Se os radicais são recrutados como ovelhas, fascinados e hipnotizados, é preciso que chefes religiosos locais, dirigentes comunais, famílias e escolas se envolvam na detecção, denúncia, desarticulação e combate a essas redes informais de atracção.
Tal "confronto activo" tem de continuar em sindicatos, círculos negociais e culturais, e em todas as estruturas do moderno estado "social democrata", que ambiciona à integração harmoniosa das minorias.
Os meios de comunicação precisam de ser chamados à luta, e toma-se necessário rever (fortemente) a legislação que condene os apelos, apoios e incentivos à violência: não pode haver liberdade de gritar "fogo" num teatro apinhado.
Sabemos que é potente e decisiva, em fatwas ou interpretações "cultas", a descrição pseudoteológica dos "prémios" que esperam o suicida, passada a porta do Além. Então que cada prelado, cada voz autorizada, cada pregador, cada mestre se mobilize na criação de documentos condenatórios - de forma igualmente forte e "visual" - dos mecanismos do terror. Porque é que a ameaça com os fogos do inferno é mais "primária" do que a promessa do Éden?
Pode também melhorar-se a cooperação entre serviços de informações, de segurança e polícia, da Europa e dos países islâmicos (em particular, árabes)?
Sim, se bem que muito se esteja a fazer, desde 2001, sem grandes alardes, da Jordânia ao Marrocos, da Argélia à Indonésia.
0 importante é mostrar, "do lado de cá", que ninguém é perseguido, ou investigado, pela sua crença, e, do lado "de lá", que ninguém é desculpado pela sua presumível fé.