Aprendizagem da serenidade
Do falecido escritor francês Louis Pauwels quase todos, pelo menos os da minha geração, conhecem "O Despertar dos Mágicos", escrito em co-autoria com Jacques Bergier. Não é exagero afirmar que mudou a vida a muita gente; pelo menos significou para uma imensidão de leitores a descoberta de um outro universo mental, esse mundo paralelo explorado pelo pensamento a que Pauwels denominou de realismo fantástico e que rompia decididamente com o positivismo instalado, entrando sem preconceitos pelas fronteiras do insólito, do desconhecido, da aventura do conhecimento sem fronteiras nem limites. Sei bem que muitos com o tempo acabaram por perder o fascínio por essa atmosfera de fantasia, que lhes tinha enchido a adolescência e a juventude. É a vida, com os seus ditames e exigências. Mas a obra mantém-se entre as mais divulgadas e conhecidas a nível mundial.
Em Portugal, e na mesma linha de "O Despertar dos Mágicos", veio ainda a ser publicado "O Homem Eterno", da mesma parceria Pauwels-Bergier.
Porém, no mesmo processo de crescimento, a mim vieram depois a tocar-me particularmente duas obrinhas bem mais obscuras de Louis Pauwels, também editadas em Portugal. Uma é a "Carta Aberta às Pessoas Felizes", em que o autor apresenta aos leitores a sua tese, simples mas original, de que as pessoas felizes são a maioria, estão em maioria, apenas desconhecem tal facto, submersas que estão pelo domínio absoluto das ideologias que têm como pressuposto a infelicidade dos homens. Descobrissem os felizes essa sua condição maioritária e sacudissem o jugo da má consciência e angústia semeadas permanentemente pelos que vivem da exploração do tema das desgraças do mundo e o conjunto da humanidade poderia ser bem mais feliz.
Este livro de Pauwels mereceu uma resposta de Paul Sérant, escritor da mesma geração e pelo menos em parte dos respectivos percursos seu companheiro de convívios e tertúlias, o qual escreveu de imediato uma "Lettre Ouverte a Louis Pauwels sur les gents inquiets et qui ont bien raison de l'être". Neste escrito, como o comprido nome indica, o autor replicava a Pauwels que podia ele ter muitas razões, mas a verdade é que também não faltam motivos neste mundo para permanecer inquieto, por mais tranquilizante que fosse o quadro visto pelos olhos de Pauwels. Entre a inquietação pessimista de Paul Sérant e o optimismo tranquilizante de Louis Pauwels trava-se interessante diálogo, de agradável e proveitosa leitura.
Também foi publicado em Portugal o ensaio de Pauwels chamado "Aprendizagem da serenidade". Neste, em consonância com a apologia do optimismo e da felicidade apresentada no outro, Pauwels procura desenvolver a receita, expondo-nos a sua visão da necessária serenidade que é estádio indispensável para alcançar a desejável situação de pacífica harmonia e confiança que seria a chave do equilíbrio, próprio e colectivo, propugnado na outra obra. É uma espécie de teoria da indiferença, trabalhada como método de vida. As derrotas não vergam nem afectam a quem a elas permaneça insensível e distante, calmo e seguro no caminho.
Eu confesso que permanecei sempre desconfiado e contrafeito perante as divagações intelectuais de Pauwels nesta sua fase; parecia-me sempre uma curiosa mistura de ocidentalismo entusiasta servido por demasiadas leituras orientalizantes. E, certamente por incapacidade pessoal para aderir aos ensinamentos do mestre, lá continuei de espírito inquieto e agitado, como me vem de nascença. Mas não querendo deixar de reconhecer os méritos da ideia nunca deixei de recomendar aos outros: " - Vejam lá, o que é preciso é a aprendizagem da serenidade... os serenos duram mais..."
E para meu uso particular cunhei também uma filosofia própria: o que é preciso é bossa de camelo. Criar em nós as reservas de energia para continuar, seja o que for que vier de fora. Derrotas, adversidades, desgraças várias nunca faltaram. Pode-se sobreviver no deserto, se soubermos que é uma prova de resistência. Quem encara cada etapa como o fim da estrada é que já não tem forças para alinhar na etapa seguinte.
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"Quem encara cada etapa como o fim da estrada é que já não tem forças para alinhar na etapa seguinte"
Fez-me lembrar um provérbio que, dizem, ser da Gronelândia:
Se foste tão longe
que não consegues dar
nem mais um passo,
então fizeste metade do caminho
que és capaz de andar
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