terça-feira, dezembro 27, 2005

NATAL

Natal frio. O vento sopra
Desordenado
E o nevoeiro gela nos poços
E o nevoeiro cerrado
Cega a vista e emperra os ossos.

O mar esfarrapa as ondas
Nas penedias.
As faias levam açoites:
Noites rudes como os dias,
Dias negros como as noites.

Pelas gargantas das serras
Encarquilhadas,
Tragando muros
gados, troncos e levadas
Despenham-se ameaçadoras.

Mês de Dezembro: horas brancas,
Horas de neve,
As plantas têm arrepios
E o orvalho muito ao de leve,
Chora nos ramos esguios.

Na igreja dá meia-noite.
Repica o sino…
Depois da missa do galo,
Beija-se o pé ao Menino
E o povo corre a beijá-lo.

O altar flameja entre flores;
Junto ao bercinho,
Sorrindo à gente que passa,
Lá está guardando o seu ninho
A Virgem cheia de graça.

Toca o órgão: que ternura
Nos olhos dela,
Vendo o filhinho deitado
Dentro da sua capela,
Gordinho, branco, rosado.

Pobres e ricos do mundo,
Todos lá vão
Levar-lhe velas e flores;
Caem, fazendo oração
De joelhos os pastores.

Na rua, meu Deus, que frio
E que negrume!
Mas nos casebres da aldeia,
Se há frio, que lindo lume,
Se há fome, que boa ceia.

Crianças, de porta em porta,
Sob goteiras,
Geladas que desatino –
Andam cantando às janeiras,
Em louvor do Deus Menino.

«Lá vai, lá vai, raparigas,
já mal podeis
Cantar, rouquinhas as vozes,
Repletos os saquitéis
De frutas, passas e nozes!»

Corre que Nossa Senhora
Desce do altar
E vai, em sonhos doirados,
Dar o Menino a beijar
Aos presos e encarcerados.

Leva nas dobras do manto,
Chegado ao peito,
Por causa do temporal,
Com todo o amor, todo o jeito
Dum coração maternal.

Mas, como a voz dum profeta,
O vento norte,
Por onde quer que ele passa,
Entoa pragas de morte
E lamentos de desgraça.

E a Virgem sente aflitivos
Pressentimentos,
E escuta vozes aziagas:
A dela nesses lamentos,
E as dos judeus nessas pragas.

Conde de Monsaraz

1 Comments:

At 10:52 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Boas Festas...
Um próspero Ano Novo 2006

 

Enviar um comentário

<< Home