Cavaleiro de Ferreira
Talvez pelo melancólico apelo deste tempo em que entre muitas outras crises vivemos iniludivelmente a crise do Direito, lembrei-me de um Grande Senhor: Cavaleiro de Ferreira. A foto e as palavras datam do dia da inauguração do Tribunal de Beja, em 1951. Nesta época de costas, recordemos um Homem para quem "o homem, como um povo, tanto mais se eleva e se realiza, quanto mais se dá."
Dedico o postal ao Je Maintiendrai, a ver se encontro apoio em mais alguém que ainda tem presentes estas preocupações démodées.
"O Estado não vive por si. Não se organiza, desenvolve ou aperfeiçoa, segundo leis de crescimento natural, ou pela virtude mágica de qualquer regulamentação. Resulta da acção e comportamento livre de todos nós, como nossa criação. Será o que dele fizermos.
Não é uma simples organização de repartições, uma relação entre governantes e governados, de mando e obediência. Antes de se exteriorizar assim, deve estar em nós mesmos, na consciência de todos e de cada um. O Estado polariza e conduz, coordenando-a, a acção da História na História da Nação. É esta a acção mais alta de política, enquanto actuação que nos solidariza e une no mérito e na responsabilidade da defesa do Bem Comum."
(...)
"O avanço da ciência, as realizações da técnica, habituaram-nos no último século a um progresso material, a um desenvolvimento da economia, do bem estar, do nível de vida, que criaram no homem moderno a ideia eufórica dum domínio quase absoluto sobre as forças naturais, reduzidas a seu complacente instrumento. Esse domínio objectivou-se, desprendeu-se dos seus limites morais, ou jurídicos, tornou-se fim de si mesmo como se devesse determinar os homens a agir automaticamente, pela simples lógica das questões científicas, dos problemas técnicos ou dos desígnios políticos.
Esta tendência, fruto dum optimismo enganador, originou a angústia da época presente. Toda a força, todo o progresso como fim de si mesmo tem duplo significado: pode construir ou destruir, criar o bem ou o mal. Importa encontrar para as novas possibilidades postas à disposição do homem a disciplina correspondente. E é essa a tarefa mais permente e mais difícil. O homem tem de aprender a ser senhor de si mesmo. E nas sociedades, e nos Estados como nos indivíduos.
O Estado é o modo de agir da Nação. Esse modo de agir concretiza-se numa ordem, numa estrutura jurídica, que fundamenta e justifica a sua actuação. Quanto mais se abre em possibilidades o campo de acção do Estado, quanto maior é a extensão dos benefícios que concede, dos melhoramentos que cria, das utilidades que produz, tanto mais dificultoso o esforço para enquadrar todas as novas actividades numa Ordem, todas as novas possibilidades num “etos” que as domine e limite. A moral, o direito, as instituições jurídicas, não são uma técnica ao lado de outras técnicas. Não há um direito puramente jurídico, como se preconiza uma ciência puramente científica. Não é um instrumento da administração, ou uma manifestação natural de domínio sobre as coisas ou os homens. Neste aspecto o acréscimo de poder e de força resultará normalmente do progresso; o problema dos seus limites e da sua utilização conformemente com o destino do homem, individual e colectivo, esse constitui a grande tarefa do Espírito, e a grande função da Moral e do Direito."
(Manuel Cavaleiro de Ferreira, no discurso proferido na inauguração do edifício do Tribunal de Beja, a 16 de Junho de 1951)
Não é uma simples organização de repartições, uma relação entre governantes e governados, de mando e obediência. Antes de se exteriorizar assim, deve estar em nós mesmos, na consciência de todos e de cada um. O Estado polariza e conduz, coordenando-a, a acção da História na História da Nação. É esta a acção mais alta de política, enquanto actuação que nos solidariza e une no mérito e na responsabilidade da defesa do Bem Comum."
(...)
"O avanço da ciência, as realizações da técnica, habituaram-nos no último século a um progresso material, a um desenvolvimento da economia, do bem estar, do nível de vida, que criaram no homem moderno a ideia eufórica dum domínio quase absoluto sobre as forças naturais, reduzidas a seu complacente instrumento. Esse domínio objectivou-se, desprendeu-se dos seus limites morais, ou jurídicos, tornou-se fim de si mesmo como se devesse determinar os homens a agir automaticamente, pela simples lógica das questões científicas, dos problemas técnicos ou dos desígnios políticos.
Esta tendência, fruto dum optimismo enganador, originou a angústia da época presente. Toda a força, todo o progresso como fim de si mesmo tem duplo significado: pode construir ou destruir, criar o bem ou o mal. Importa encontrar para as novas possibilidades postas à disposição do homem a disciplina correspondente. E é essa a tarefa mais permente e mais difícil. O homem tem de aprender a ser senhor de si mesmo. E nas sociedades, e nos Estados como nos indivíduos.
O Estado é o modo de agir da Nação. Esse modo de agir concretiza-se numa ordem, numa estrutura jurídica, que fundamenta e justifica a sua actuação. Quanto mais se abre em possibilidades o campo de acção do Estado, quanto maior é a extensão dos benefícios que concede, dos melhoramentos que cria, das utilidades que produz, tanto mais dificultoso o esforço para enquadrar todas as novas actividades numa Ordem, todas as novas possibilidades num “etos” que as domine e limite. A moral, o direito, as instituições jurídicas, não são uma técnica ao lado de outras técnicas. Não há um direito puramente jurídico, como se preconiza uma ciência puramente científica. Não é um instrumento da administração, ou uma manifestação natural de domínio sobre as coisas ou os homens. Neste aspecto o acréscimo de poder e de força resultará normalmente do progresso; o problema dos seus limites e da sua utilização conformemente com o destino do homem, individual e colectivo, esse constitui a grande tarefa do Espírito, e a grande função da Moral e do Direito."
(Manuel Cavaleiro de Ferreira, no discurso proferido na inauguração do edifício do Tribunal de Beja, a 16 de Junho de 1951)
1 Comments:
Fico muito honrado com a dedicatoria. Nunca foi demais lembrar os Mestres desaparecidos, ainda que se tenha tornado efectivamente demodee e politicamente incorrecto. Ja ha tempos numa troca de chistes com o Jansenista e com o Misantropo veio a baila o nome de Sebastiao Cruz, outro "deleted"... Mas ai haveria pano para mangas, desta feita a proposito das facanhas dos "discipulos apagadores"...
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