terça-feira, junho 13, 2006

Um novo herói para a esquerda BA/BE

Um entusiástico trabalho da agência Lusa, do tipo literário que antes se chamava de hagiográfico, está a levar ao rubro as redacções.
Anuncia-se que o recluso mais antigo de Portugal, Belmiro Vieira Martins, preso há 30 anos, espera ser libertado no final do Verão.
A prosa tem os ingredientes todos para ter mais saída que o "Código Da Vinci".
Apresenta-nos "o ladrão mais honesto do mundo, que fez carreira nos assaltos a ourivesarias, pretende procurar trabalho e levar uma vida sossegada".
Dá a palavra ao protagonista: "Quando sair daqui quero ingressar no mercado de trabalho. Se possível dedicar-me ao artesanato e fazer peças em chapa de ouro, actividade a que me dediquei aqui na prisão".
Compõe a figura: trata-se do recluso número 13 do Estabelecimento Prisional de Pinheiro da Cruz, em Grândola, actualmente com 69 anos, e foi preso em 1976 por furto a ourivesarias. Durante os 30 anos de reclusão evadiu-se quatro vezes (aqui houve falta de rigor, mas já foi rectificado: o homem evadiu-se seis vezes, duas delas no estrangeiro).
Doura-se a lenda: era "incapaz de resistir, aproveitava sempre as fugas para mais uns assaltos a ourivesarias".
Trabalha-se a personagem: "só fiz assaltos a ourivesarias e já assaltei mais de 100 em todo o país", conta orgulhoso o "maior assaltante de ourivesarias de todos os tempos".
Tempera-se de poesia: "orgulha-se também de nunca ter usado uma arma branca nem ferido ninguém, já que os assaltos eram todos executados durante a noite através de buracos que fazia nas paredes".
Enriquece-se o enredo, romantiza-se o retrato: "artesão, fadista, poeta e sacristão", define-se como o ladrão mais honesto do mundo, pois não é capaz de trair e de fazer mal a ninguém. "Não roubo os pobres, apenas roubo quem tem dinheiro e antes dos assaltos informava-me se as vítimas tinham o seguro em dia".
Adiciona-se anti-fascismo quanto baste:
Onze anos antes do 25 de Abril de 1974, aderiu à LUAR (Liga da União e de Acção Revolucionária), uma organização política anti-fascista. "Até ao 25 de Abril roubava ourivesarias e o dinheiro revertia a favor da organização», explicando que depois da «Revolução dos Cravos» sentiu-se «traído» pela LUAR. "No dia 28 de Abril de 1974 os membros da LUAR tiveram uma reunião e descobri que o dinheiro não tinha sido investido em armas, mas sim em benefício próprio de alguns". Tomou então a decisão de «privatizar o crime». "Quando saí da organização não tinha trabalho, não tinha nada, por isso decidi roubar para benefício próprio".
Dá-se o toque pessoal e intimista: pai de seis filhos, com 14 netos e quatro bisnetos, Belmiro costuma visitar a família nas saídas precárias, altura que aproveita também para cantar o fado no Bairro Alto, em Lisboa.
E o desenlace da fita, o herói cansado: na expectativa de atingir a liberdade definitiva, confessa que apenas quer passar o resto da vida «sossegado, junto da mulher».
E a nota irónica: conta agora sair em liberdade e manter-se afastado da sua grande tentação, as ourivesarias.
Estão a ver o magnífico cozinhado? Está feito o filme! Temos obra!
A realização parece que terá a mão do inestimável Forum Prisões, de que o novo herói é sócio-fundador. Esperem para ver. Estão já a ser feitas todas as diligências pelo mentor do projecto, o famoso "jornalista" e habitual utente dos serviços prisionais Sr. Guilherme da Silva Pereira.
Acredito que vai haver financiamentos que cheguem - para o filme e para o Guilherme.
Nuvens de glória e ventos de epopeia pairam no mundinho BA/BE (Bairro Alto/Bloco de Esquerda). Mais do que Robin dos Bosques ou Che Guevara, este é que é!
É nosso, é português, é o Belmiro, o único... (calem-se já com bocas foleiras!).
Nem calculam o frenesim em que andam o Xico Louçã, o Daniel Oliveira e o Miguel Portas. O Vitorino e o Abrunhosa estão a compor umas cantigas alusivas.

1 Comments:

At 9:14 da manhã, Blogger Mendo Ramires said...

Genial! Antológico.

 

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