A Estrada de Damasco
O noticiário de hoje atirou a Síria para o centro das atenções.
Ao que parece as forças de segurança sírias frustraram um violento atentado contra a Embaixada Americana em Damasco, com vários mortos de ambos os lados.
A senhora Rice já agradeceu “very much” aos sírios.
Como se calcula, a notícia em questão provocou algum aborrecimento e contrariedade entre os frenéticos da propaganda neocon mais primária.
Então andaram eles a desunhar-se, pintando em todas as paredes o negro retrato do Eixo do Mal, e agora os sírios surgem a estragar a pintura? Vejam só, os sponsors do terrorismo a salvar vidas americanas, a morrer em defesa da propriedade americana…
Deve haver aqui fumos de Satanás! Próprio do Mal é querer confundir…
Porém, quem acompanhe com mais frieza os acontecimentos não ficará muito surpreendido. Sabe-se que a realidade é muito mais complexa do que os pobres esquemas mentais do fanatismo. O regime sírio confronta-se desde há muitos anos com um sério problema interno devido ao fundamentalismo islâmico. Com efeito, trata-se de um regime essencialmente laico, o último dos que nasceram sob o impulso modernizante do baasismo. Obviamente que se trata de uma ditadura, segundo os padrões em uso, mas certamente que não é uma ditadura islâmica. Tem por isso uma história de confrontações sangrentas com os grupos de inspiração islamista. Ficou registada a repressão impiedosa exercida pelo pai Assad sobre a Irmandade Muçulmana.
Consequentemente, para os seguidores da Al Qaeda e afins trata-se de um regime infiel, a abater por todos os meios. Como aliás acontecia com o de Saddam Hussein no Iraque…
Já no consulado de Assad filho o problema deu sinais de estar a agudizar-se. Como exemplos conhecidos dessa persistência de uma guerrilha larvar, recordamos que em Abril de 2004 tinha havido situação semelhante à de agora, também no bairro das embaixadas, quando a polícia se confrontou com um ataque que teria por alvo a Embaixada do Canadá. E em Junho último houve fortes combates quando de uma tentativa de ataque à televisão estatal.
O que se passou agora relaciona-se com tudo isso, e pode vir a despoletar uma sequência de acontecimentos que por agora só é possível imaginar.
Como se disse, a senhora Rice já exprimiu a sua gratidão aos sírios. Foi simpática. Outras vozes surgem a recordar os tempos não muito remotos em que os serviços de inteligência sírios eram as melhores fontes da CIA no combate a esses inimigos comuns que eram os loucos de Alá. E não poucos analistas americanos insistem em lembrar que o inimigo afinal é o Irão, teimando que é preciso falar com os sírios.
Não seria grande a surpresa para o autor destas linhas se o namoro fosse declarado.
Muitos estrategas americanos defendem que a jogada é de mestre: deixava isolado o Irão, rodeado de aliados americanos por todos os lados, e anulava o Hezbolá, perdido no seu feudo libanês.
O jovem Assad filho e seus fiéis provavelmente também encontrarão vantagens na transacção. Por um lado não parece provável que se sintam muito entusiasmados numa guerra em que seriam as primeiras vítimas, apanhados no meio do eventual confronto entre americanos/israelitas e iranianos. Por outro lado, o instinto de sobrevivência, como aconteceu com Kadhafi, aconselha a cartada americana; com estes as hipóteses de bom sucesso parecem francamente melhores do que com os islamistas.
Claro que estamos a especular. Nem se sabe muito bem de quem é a responsabilidade pelos atentados. E é de crer que nunca se saberá com rigor, como acontece com muitos outros acontecimentos que se passam naquela região.
Ademais o entendimento referido seria complicado pelas questões pendentes. Israel o que diria? E que seria feito dos Golan? Assim é, mas por isso mesmo é que seria necessário negociar.
Mas nada é impossível. Todo o mundo é composto de mudanças, e este é muito mais.
Ao que parece as forças de segurança sírias frustraram um violento atentado contra a Embaixada Americana em Damasco, com vários mortos de ambos os lados.
A senhora Rice já agradeceu “very much” aos sírios.
Como se calcula, a notícia em questão provocou algum aborrecimento e contrariedade entre os frenéticos da propaganda neocon mais primária.
Então andaram eles a desunhar-se, pintando em todas as paredes o negro retrato do Eixo do Mal, e agora os sírios surgem a estragar a pintura? Vejam só, os sponsors do terrorismo a salvar vidas americanas, a morrer em defesa da propriedade americana…
Deve haver aqui fumos de Satanás! Próprio do Mal é querer confundir…
Porém, quem acompanhe com mais frieza os acontecimentos não ficará muito surpreendido. Sabe-se que a realidade é muito mais complexa do que os pobres esquemas mentais do fanatismo. O regime sírio confronta-se desde há muitos anos com um sério problema interno devido ao fundamentalismo islâmico. Com efeito, trata-se de um regime essencialmente laico, o último dos que nasceram sob o impulso modernizante do baasismo. Obviamente que se trata de uma ditadura, segundo os padrões em uso, mas certamente que não é uma ditadura islâmica. Tem por isso uma história de confrontações sangrentas com os grupos de inspiração islamista. Ficou registada a repressão impiedosa exercida pelo pai Assad sobre a Irmandade Muçulmana.
Consequentemente, para os seguidores da Al Qaeda e afins trata-se de um regime infiel, a abater por todos os meios. Como aliás acontecia com o de Saddam Hussein no Iraque…
Já no consulado de Assad filho o problema deu sinais de estar a agudizar-se. Como exemplos conhecidos dessa persistência de uma guerrilha larvar, recordamos que em Abril de 2004 tinha havido situação semelhante à de agora, também no bairro das embaixadas, quando a polícia se confrontou com um ataque que teria por alvo a Embaixada do Canadá. E em Junho último houve fortes combates quando de uma tentativa de ataque à televisão estatal.
O que se passou agora relaciona-se com tudo isso, e pode vir a despoletar uma sequência de acontecimentos que por agora só é possível imaginar.
Como se disse, a senhora Rice já exprimiu a sua gratidão aos sírios. Foi simpática. Outras vozes surgem a recordar os tempos não muito remotos em que os serviços de inteligência sírios eram as melhores fontes da CIA no combate a esses inimigos comuns que eram os loucos de Alá. E não poucos analistas americanos insistem em lembrar que o inimigo afinal é o Irão, teimando que é preciso falar com os sírios.
Não seria grande a surpresa para o autor destas linhas se o namoro fosse declarado.
Muitos estrategas americanos defendem que a jogada é de mestre: deixava isolado o Irão, rodeado de aliados americanos por todos os lados, e anulava o Hezbolá, perdido no seu feudo libanês.
O jovem Assad filho e seus fiéis provavelmente também encontrarão vantagens na transacção. Por um lado não parece provável que se sintam muito entusiasmados numa guerra em que seriam as primeiras vítimas, apanhados no meio do eventual confronto entre americanos/israelitas e iranianos. Por outro lado, o instinto de sobrevivência, como aconteceu com Kadhafi, aconselha a cartada americana; com estes as hipóteses de bom sucesso parecem francamente melhores do que com os islamistas.
Claro que estamos a especular. Nem se sabe muito bem de quem é a responsabilidade pelos atentados. E é de crer que nunca se saberá com rigor, como acontece com muitos outros acontecimentos que se passam naquela região.
Ademais o entendimento referido seria complicado pelas questões pendentes. Israel o que diria? E que seria feito dos Golan? Assim é, mas por isso mesmo é que seria necessário negociar.
Mas nada é impossível. Todo o mundo é composto de mudanças, e este é muito mais.
3 Comments:
Boa análise. Não esquecer que o pai Assad, de um frieza analítica, apoiou a 1ª guerra do Iraque. O filho não deixará de ter bebido na realpolitik paterna.
Muitos baixas deve ter ontem sofrido a Mossad entre as suas fileiras de Damasco...
Gostei.
Abração.
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