segunda-feira, junho 18, 2007

Onde falha a Direita?

Seguem-se algumas passagens de Thomas Molnar, que me parecem especialmente estimulantes e a merecer debate e análise nos dias que correm.
A expressão "contra-revolução", adoptada por Molnar, coincide largamente com o que na nossa terminologia temos designado por "direita".
Espero ao menos suscitar reflexão, e vir a contar com as opiniões dos interessados.

"A restauração contra-revolucionária tem falhado regularmente, não por qualquer fraqueza intrínseca da posição ou da filosofia contra-revolucionárias, mas por os contra-revolucionários se revelarem largamente incapazes de utilizar a fundo os métodos modernos: organização, slogans, partidos políticos e imprensa. O processo publicitário foi abandonado aos media revolucionários, de tal modo que os contra-revolucionários regularmente surgem a uma luz desfavorável, quando ao menos conseguem fazer-se conhecer. Nessa conformidade, o homem da rua, mesmo não comprometido, traz em si um pequeno mecanismo que lhe dita reacções simpáticas aos heróis e às causas revolucionárias e um sentimento de estranheza ou relutância perante as causas contra-revolucionárias. Os meios de comunicação contra-revolucionários pouco ou nada fazem para corrigir essa atitude inicial, entretanto permanentemente reforçada pela influência contínua da propaganda de esquerda. Os contra-revolucionários dirigem-se essencialmente aos já convertidos, cujo número pode ser muito importante, e até representar a maioria, mas não aumenta após esse primeiro contacto. Por outro lado, o público contra-revolucionário é, em geral, "estático", não sentindo necessidade ou possibilidade de maior expansão, seja pelo conhecimento, pela mobilidade ou pela conquista das instituições: basta-lhe ser assegurado que as suas opiniões são justas. Os contra-revolucionários lêem os seus próprios jornais e livros para aí verem reflectidas as suas próprias convicções e também para confirmarem a existência de outras pessoas que as partilham.
Esta atitude não prevalece apenas entre os contra-revolucionários de uma Europa activíssima no plano ideológico, mas também nos Estados Unidos, embora aí os costumes políticos encorajem todos os partidos e as opiniões marginais a divulgar as suas ideias; mesmo assim, observa Willmore Kendall a propósito dos legisladores americanos, "é geralmente verdade que os resistentes (os conservadores expostos aos ataques dos liberais no Congresso) não mostraram até agora (1963) grande actividade no sentido de articular princípios. Toda a sua agitação raramente corresponde a uma filosofia conservadora autêntica e combativa, capaz de resistir ao moralismo militante dos liberais".
Na arena política, a contra-revolução deve habitualmente esperar que os acontecimentos persuadam a população e os eleitores a aderir à sua causa; parece incapaz de os persuadir em períodos de calma e normalidade, em grande parte devido ao facto de os contra-revolucionários não fazerem sérios esforços nesse sentido e deixarem campo livre aos meios de propaganda revolucionários. Assim, sobrevinda uma crise, não dispõem de qualquer grupo organizado e experimentado, mas apenas de massas unidas pelas circunstâncias, invertebradas, clamando ansiosamente por imediata protecção - contra a agressão ideológica, o desastre financeiro, a anarquia. Disso duplamente sofre a reputação dos porta vozes contra-revolucionários: primeiro, porque, no período anterior à crise, são apontados como "profetas da desgraça"; depois, porque, eclodida esta, são acusados de incapacidade para restabelecer a situação. De qualquer maneira, fazem-se conhecer, antes e depois, como "homens de crise", emergindo apenas em circunstâncias excepcionais, assumindo os interregnos sob a forma de "homens providenciais" ou "ditadores".
O curioso é haver boa dose de verdade nestes rótulos. O contra-revolucionário deixa, por omissão, os revolucionários encarregarem-se de lhe pintar o retrato, por tal forma que a descrição da sua passagem pelo poder e a reputação que lega à posteridade são igualmente feitas (ou refeitas) pelos adversários. Poderia dizer-se que a filosofia contra-revolucionária, bem como os programas e os actos, são vistos pela opinião pública - e pela história - através das descrições e dos critérios de julgamento, essencialmente hostis, dos revolucionários.
O contra-revolucionário tem consciência deste estado de coisas, mas na generalidade não é capaz de o remediar. A sua análise é normalmente lúcida, mais até que a dos seus adversários. Os contra-revolucionários mediram perfeitamente, após 1789, os perigos da democracia, mas encontraram pouca audiência na imprensa ou nas massas. Pobedonostsev, reputado um ultra-reaccionário, diagnosticou a doença democrática de modo pouco diverso do de Platão. Nas Reflections of a Russian Statesman (p. 45), escreve: "A democracia é o sistema de governo mais complicado e mais difícil de manejar de toda a história da humanidade. Por isso, jamais apareceu salvo como manifestação transitória, as poucas excepções cedendo rapidamente lugar a outros sistemas." Claro está, o período de "transição" pode durar muito tempo, pois a degenerescência da democracia é por vezes muito lenta, por fases dificilmente perceptíveis. Cada uma delas é saudada pelos media revolucionários como um novo avanço, um novo progresso, uma conquista da liberdade, e a opinião pública aceita-a como tal. Em consequência, de cada vez que os contra- revolucionários tentam chamar a atenção para novo aprofundamento na degeneração, as suas exortações afiguram-se à opinião pública ainda mais extremistas que antes. Após 1918, os contra-revolucionários estavam na razão apontando o marxismo como a nova e grande ameaça para a civilização, maior que a democracia, embora emanado da doutrina democrática e encorajado pela tolerância democrática. Quando a chamada experiência russa do comunismo suscitava fortes aplausos dos ideólogos revolucionários ocidentais, foram dos contra-revolucionários as vozes que, não só a condenaram, mas também lhe assinalaram as raízes e a lógica de destruição. Precederam assim, pelo menos de uma geração, os fabricantes de opinião do Ocidente: o comunismo teve de calçar as botas e ocupar a pátria de cem milhões de europeus antes que o Ocidente mostrasse os primeiros sinais de inquietação.
Os contra-revolucionários encontraram-se desempenhando com inquietante regularidade o papel de Cassandra, enquanto a ameaça contra a qual advertiam a sociedade crescia em intensidade e alastrava geograficamente
."

3 Comments:

At 4:53 da tarde, Anonymous Anónimo said...

Já tinha lido esse texto algures. É uma brilhante analise e o autor também se refere, por outras palavras, da incapacidade "Nossa" de saber usar as armas do inimigo!

 
At 2:19 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Uma análise bem interessante.
Ontem perdi um comentário àcerca do que este texto me sugere. De memória, porque não o guardei ou tê-lo-ia reposto, vou tentar hoje deixar algo parecido com o que escrevi.
A esquerda revolucionária (ou os revolucionários), em todos os tempos e em qualquer lugar do mundo, tem um só fito em mente, como se sabe: fazer a revolução a qualquer preço. Trá-la em permanência no subconsciente, ela está subjacente a todos os seus discursos políticos e encontra-se plasmada no seu modo d'agir no dia a dia. Por outras palavras, a revolução está inscrita no seu código genético.
A esquerda revolucionária só existe tal como a conhecemos, porque os regimes ditos democráticos não autorizam a legalização de partidos da direita conservadora (aqueles que são efectivamente de direita, os que aceitam as regras do jogo democrático mas que não estão enfeudados aos partidos de esquerda - ou não esquerda mas com os quais se alternam no poder, o que vem a dar no mesmo - que governam os países e que muito menos se sujeitam aos seus ditames) e não o permitem porque sabem que os povos são conservadores por natureza, intuição e génese e votá-la-iam sempre maioritàriamente em detrimento da esquerda, em quaisquer eleições "efectivamente livres" que se realizassem nos países. Os povos sempre desconfiaram da esquerda e acreditaram pouco nela e cada vez desconfiam mais e acreditam menos. Evidentemente, a propaganda da esquerda revolucionária, sempre igual a ela própria e utilizando sempre os mesmos métodos e slogans ao longo dos tempos, em campanhas sucessivas de marketing agressivo e proclamado à exaustão, faz crer arificialmente o contrário às populações distraídas e porque essa propaganda é incisiva, persistente e continuada e até certo ponto atractiva para certas camadas d'eleitores incautos, tem conseguido ao longo dos anos passar com relativo êxito a sua mensagem revolucionária, mormente nos países onde tem tido a liberdade suficiente para o fazer. Esta oportunidade é-lhe concedida altruìsticamente pela direita conservadora (ou contra-revolucionária) que, curiosamente, sabendo jamais alcançar o poder ou sequer espaço político significativo nos países onde a esquerda revolucionária impera, porque simplesmente por leis abstrusas e outros métodos menos sofisticados o impede, esta mesma direita nada faz para alterar este estado de coisas, na certeza porém de que teria força política suficiente para o conseguir através do voto explícito das populações caso lho solicitasse. Nos diversos países onde ela tem acesso ao poder - e é de facto ela quem governa e não os partidos moderados, que a ela se submetem, nos países onde está vigente este regime - a esquerda revolucionária, apelidada por conveniência de democrática, não concede o mínimo espaço de manobra à direita conservadora e os métodos usados para a intimidar são sempre os mesmos, difamando-a, catalogando-a depreciativamente das mais diversas maneiras, marginalizando-a do debate político e do espaço que por direito próprio lhe deveria estar reservado na comunicação social etc., consciente que está de que a receptividade ao discurso da direita conservadora, ao qual as populações dos países são mais sensíveis, reverteria a seu desfavor relegando-a para um modestíssimo lugar nas preferências das camadas votantes, qualquer que fosse o sufrágio digno desse nome a que ela se submetesse. Mas apesar destas evidências, a direita conservadora deixa-se arrastar indefinidamente nesta terra de ninguém porque é preguiçosa por natureza, cansa-se depressa da luta política e é pouco aguerrida por temperamento (contràriamente à esquerda que é lesta, combativa e incansável) e os seus oponentes sabem-no perfeitìssimamente bem e disso tiram claramente todo o partido e proveito que o regime democrático lhes proporciona e consente. Os povos, qualquer povo em qualquer lugar do mundo, desejam viver em sossêgo e paz social acima de tudo e para obterem ambos e os conservarem, não se importam d'abdicar de bom grado d'algumas regalias sociais que os regimes ditos democráticos 'generosamente' lhes concedem, incluíndo a preclara liberdade, em troca de uma ditadura mais ou menos autoritária que a proporcione. A esquerda revolucionária está consciente embora nunca o admita, de que a direita conservadora tem razão em tudo quanto afirma relativamente à preservação dos valores da Pátria e da família. Mas porque estes valores supremos dos povos e das Nações lhe dizem nada, antes os ridiculariza, e porque está contìnuamente a exigir que a direita conservadora seja ilegalizada (porque só assim se poderia ver livre de um movimento político que sobreleva qualquer outro existente e muito mais o dela) ou, à falta disso e porque não o consegue, impõe que seja neutralizada ou minimizada ao máximo junto das populações, sobretudo por altura das eleições, recorre cìclicamente à sua propaganda insidiosa e agressiva, quando não caluniosa, que a direita conservadora teme mas consente ao mesmo tempo que lhe causa repulsa e uma terrível angústia por essa ser uma prática que lhe é exógena e a esquerda, sabendo perfeitamente que a direita cala e engole, usa e abusa dela ao máximo. E depois ainda há o lema ingénuo e que lhe é fatal, a que a direita conservadora lançando mão dos seus princípios de civilidade, recorre uma e outra vez, para restabelecimento da sua paz interior e apaziguamento das almas em seu redor, no qual (lema) aliás acredita piamente, que é o cediço estribilho do 'vamos deixar passar o tempo, que eles acabarão por mudar de discurso e de atitude, no fundo eles até são boas pessoas'. Todas as boas vontades, empenhamento político sério e modos civilizados de dialogar, que a direita conservadora queira dispensar às propostas e teses, quase todas estrambólicas, que a esquerda revolucionária decida apresentar ou trazer para o debate político ou impor como leis a aprovar para país, estando inclusivamente disposta a estender-lhe a passadeira vermelha se for esse o caso - para já não falar do repúdio e ostracização a que é votada toda e qualquer proposta política vinda em sentido contrário por mais importante que ela seja, que a direita conservadora resolva ter a 'ousadia' de apresentar pùblicamente, dando o contributo que legitimamente lhe assiste para a melhoria da coisa pública - aquela, fazendo tábua raza de civilidades desusadas (porque não foi para isso que ela viu à luz do dia) e jus à sua matriz, dá-se ao luxo de todas elas ignorar olìmpicamente. E sendo ela quem, embora encapotadamente, está por detrás de todas as decisões tomadas pelos governantes nos países democráticos, é óbvio que tem poder bastante para tudo isso se permitir.
Nas democracias existentes no mundo, há mil e uma maneiras de ela influenciar os governos sem que seja minimamente detectada pelas populações; há até casos de grandes democracias em que as populações julgam que a esquerda revolucionária já há muito passou à história, o que, claramente, não é verdade. E porque realmente a direita conservadora nada deseja ou quer alterar neste estado de coisas, temos que todas elas juntas, a esquerda
revolucionária, a esquerda moderada e a direita consentida, que não o sendo de facto toma essa designação para compôr o ramalhete dos regimes democráticos e dar um certo ar de respeitabilidade às democracias, continuam a viver na mais absoluta paz dos anjos até que Deus o queira. Menos os povos, claro, estes vivem em permanente estado de inquietação, quanto muito conseguem intermitências de paz social. Mas, vendo bem, o que é que o bem estar geral dos povos interessa aos governantes das democracias? Nada.

Os regimes democráticos protegem a esquerda revolucionária porque, como se sabe, os seus dirigentes precisam dela para se perpetuarem no poder e ela existe porque é a fautora das revoluções. Revoluções estas que têm dizimado milhões de inocentes, provocado miséria extrêma e o caos social que chegam a perdurar décadas. A esquerda revolucionária desencadeia as revoluções, a direita conservadora trava-as ou evita-as.
A esquerda revolucionária tenderá a modificar-se com o decorrer dos tempos. No quê, ainda é cedo para vaticinar.

Enquanto isto, temos cada vez maior número de países em permanente estado de agitação social, em constante estado de pré-revolução, ou mesmo em guerra aberta.
Imperioso se tornaria que nestes períodos periclitantes das Nações - cuja instabilidade política é as mais das vezes artificialmente provocada por uma esquerda revolucionária que justamente aí encontra terreno fértil para exercer a vocação para a qual foi doutrinada, que é afinal a sua verdadeira razão d'existir - a direita conservadora acorresse de imediato às populações em perigo, que é a quem lhes pode valer em última instância nestes casos extrêmos, sendo de facto a sua única e derradeira salvação, mas, estranhamente, chega-se ao cúmulo de se ver a direita conservadora, contra-revolucionária se se quiser, "estàticamente estática", à espera do devir.

Maria

 
At 7:59 da manhã, Anonymous Anónimo said...

Eu vinha deixar um curto comentário e parei.
Está incluído na excelente exposição de Maria.

Mesmo assim, atrevo-me a escrever: a Direita repudia, intrinsecamente, os métodos revolucionários usados pela esquerda por não fazerem sentido. A Direita não se revê no non sense.

Muito obrigado, Maria.

Nuno
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