Passos passados
Quando eu tinha 19, 20 anos, morava na Barbosa du Bocage. O Saldanha, o Monumental, eram logo ali.Quando lembro o Berna lembro Peter Sellers em Mr. Chance, quando lembro o Monumental lembro Jack Nicholson em Shinning, quando lembro o Nimas lembro Chariots of Fire e a poderosa música de Vangelis... não sei porquê cada cinema traz associada uma recordação precisa. Ou talvez não, agora de repente estão a aparecer várias ao mesmo tempo. Fiquemos no Monumental.
2 Comments:
Aqui tirava eu fotografias nas sessões de carnaval logo por alturas do final da longa noite escura...! Mais logo vou ver se encontro alguma que seja publicável...
O Monumental... Olho para esta fotografia e vêem-me logo à memória os crimes arquitectónicos (e outros) perpetrados pelos 'grandes democratas' de primeiríssima água que ainda para aí rastejam, tudo feito com requintes de malvadez e perícia inigualáveis. Enquanto não destruíram este edifício não desistiram. Para, como sempre acontece, colocarem no mesmo lugar aquele mamarracho que se conhece e que os faz rebentar d'orgulho, pois claro. Porque, como todos sabemos, o que eles queriam mesmo era vingar-se de Vasco Morgado e de Laura Alves, empresário de inegável sucesso e actriz muito popular e querida, ambos ligados ao 'regime execrável' deposto. Não lhes importou mìnimamente que V.M. tivesse sido o maior empresário teatral português da sua época - gostasse-se ou não dele era uma verdade irrefutável. Ainda menos lhes importou que L.A. tivesse sido uma das maiores actrizes de comédia do nosso País - gostasse-se ou não dela, era uma verdade incontestável. Qual quê! Tudo quanto cheirasse a 'fascismo' era para ser varrido do mapa. Os grandes empresários que traziam riqueza ao país, que davam trabalho a imensos artistas, que traziam a Portugal artistas de renome internacional, que davam prestígio ao teatro e enchiam-nos de público; e as enormes actrizes que mantinham peças em cena meses e meses seguidos e quase sempre com lotação esgotada em todas as sessões, não tinham interesse algum para os novíssimos 'grandes democratas' e menos ainda para o povo embrutecido por anos e anos de obscurantismo. Eles é que mandavam agora no país, mas sobretudo no povo e no que este deveria ou não ver, nem que cada peça por eles levada à cena tivesse como audiência meia dúzia de espectadores. Assim é que era, mostrar ao povo nem que fosse à força, o que ele devia ver para assim melhor aprender o que era o 'verdadeiro teatro'. As "peças, a encenação e a distribuição de papéis" pertencer-lhes-iam na totalidade e literalmente a partir dessa altura, a eles e a mais ninguém. A maldade não tem limites. Porque não os quiseram destruir doutra maneira (ou não lhes deram a importância suficiente para o fazer), tanta a V.M. como a L.A., as notícias insidiosas, mentirosas, ofensivas, cruéis, desgastantes e quase diárias, que iriam aparecer em tudo quanto era jornal ou revista, propaladas pelos obedientes servidores da malta brava que tomou d'assalto o país, arruinaram-lhes a saúde provocando-lhes uma morte precoce. Laura Alves chegou a afirmar e sabe-se que é verdade porque morava próximo do Monumental, que de sua casa avistava o edifício e que via todos os dias "o que estão a fazer àquele querido edifício corta-me a alma porque foi ali que passei grande parte da minha vida como se de minha casa se tratasse e o facto de o irem deitando abaixo a pouco e pouco e não de uma só vez e já andam nisto há anos sem fim e sabem que eu de minha casa posso observá-lo, até as paredes semi-destruídas dos camarins incluíndo o meu, eu vejo da minha janela, é isto tudo que me pôs doente e me há-de levar à morte e é isso mesmo que eles desejam, para que o meu querido público me esqueça".
Os fazedores de democracias rápidas tinham que deitar abaixo preferecialmente tudo o que cheirasse (e principalmente lembrasse ao povo) a antigo regime, como se o anterior regime não tivesse existido ou se tivesse por magia eclipsado. É o que tentaram fazer por cá como igualmente noutros países, naqueles onde isso lhes foi possível. Pensando que os povos, todos os povos, são parvos e que vão esquecer tudo o que viveram de bom e de menos bom, para trás, sob regimes ditatoriais ou autoritários, só porque uns iluminados cobiçosos das enormes riquezas acumuladas à custa de sacrifícios imensos desses mesmos povos, que aliás eles desprezam e de seus dirigentes que eles sistemàticamente difamam e menorizam mas dos quais, invariàvelmente, eles sentem uns ciùmes e inveja incontroláveis, lhes vêem anunciar qual boa nova, que eles é que são os seus verdadeiros amigos deles, infelizes povos, que eles é que lhes vão trazer riqueza e bem-estar, paz e felicidade eternas, democratas de gema que se consideram e proclamam ser. Pobres dos povos que acreditam nestes maltêses.
O interior deste edifício era uma maravilha em espaço e com uma decoração elegante, ainda que um pouco austera na minha opinião. Os lustres eram enormes, impressionantes. E, segundo os actores que lá trabalharam, os cenários eram grandiosos e os camarins de um conforto imenso.
Não sendo exteriormente um edifício imponente, longe disso, era, não obstante e comparativamente às porcarias arquitectónicas com que temos sido presenteados nas últimas décadas, uma autêntica obra-prima.
Pela minha parte agradeço-lhe a bonita fotografia.
Maria
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