Meditações de Fátima
Olhando a nova e a antiga igreja de Fátima ressalta a diferença dos perfis. Uma eleva-se para o céu, a outra agarra-se ao chão. Dei por mim a pensar como isto pode expressar a diferença entre a religião dos homens que construíram as catedrais e a religiosidade destes que dirigem estas construções modernas. Uns tudo faziam a pensar no céu, estes não têm lugar no seu espírito para nada que ultrapasse o plano das coisas da terra. Conta-se daqueles operários que se esmeravam nos cimos das grandes catedrais góticas a esculpir rendilhados de pedra, que ninguém poderia jamais observar da terra, que ao ser-lhes perguntada a razão respondiam muito simplesmente que lhes bastava que o seu trabalho pudesse ser visto do céu.
É perturbante a diferença da atitude religiosa que domina o Ocidente cristão dos tempos actuais e aquela que fez a cristandade gloriosa. Dantes os homens pensavam em Deus para se moldarem à vontade d'Ele; agora os que ainda se dirigem a Deus é frequentemente para lhe exigir que Ele faça a vontade deles; e zangam-se quando o Criador não lhes faz o jeito. Querem pouco mais do que um Deus prestador de serviços.
Entre as pessoas que iam saindo da nova igreja distingui duas impressões. Alguns pareciam-me confusos e desabafavam algo sobre aquilo não se parecer nada com uma igreja. A outros ouvi dizer que era muito bonito, muito moderno. Nestes últimos, por sinal jovens, não era difícil notar que a apreciação nada tinha de religioso, muito menos de católico. Tratava-se de um critério crítico que se aplica indistintamente naquela construção como no estádio da Luz, na estação de Metro do Terreiro do Paço, na Ponte Vasco da Gama ou no Centro Cultural de Belém. Grandes obras de arquitectura e de engenharia, na verdade notáveis a vários títulos. Nas outras pessoas, as que desabafavam que ali não encontravam uma igreja, nem viam um crucifixo na gigantesca cruz plantada ali ao lado (e que faz lembrar pelo material utilizado e pelo despojamento estético a grande árvore de ferro erguida por Jorge Vieira em frente ao Centro Comercial Vasco da Gama) subsiste, ainda que inconsciente ou pouco esclarecida, a ideia de que existe uma arquitectura sagrada, e que o espaço do culto segue regras que o tornam reconhecível (um arqueólogo, mesmo positivista, procurará em qualquer local que escave os significados que o identifiquem como um lugar religioso para aqueles que o construíram e usaram).
Neste sentimento difuso permanece um resquício do que foi uma religião. Mas neste ponto, do esvaziamento, lembro-me inevitavelmente de René Guénon, quando evoca a decadência e a queda do que chama de Ocidente. Sinto-lhe os acertos, mesmo quando não o posso acompanhar. Não acredito na oposição que ele estabeleceu entre Oriente e Ocidente, nem creio que as "sociedades tradicionais" resistam a Oriente ao contrário do que aconteceria a Ocidente. A meu ver, o impulso da modernidade implica no mundo a que Guénon se referia como Oriente as mesmas consequências que trouxe a Ocidente. Obviamente que de forma diferida, com atraso, por força do movimento histórico, e com mais ou menos convulsões, mas a maré homogeneizadora não deixa lugar a ilusões desse tipo (mesmo escrevendo há oitenta anos penso que Guénon não deveria ter-se deixado embalar nessas miragens). O Islão desfaz-se, o Hinduísmo desfaz-se, e o Budismo só vive no Ocidente carente de exotismo. E fiquemos por aqui, que a viagem já vai longa.
Espero ter alguns leitores que me leiam. As pessoas que julgam que uma missa é uma assembleia, e que uma grande sala de conferências substitui perfeitamente uma igreja, não podem certamente compreender do que falo. Restam os outros.
É perturbante a diferença da atitude religiosa que domina o Ocidente cristão dos tempos actuais e aquela que fez a cristandade gloriosa. Dantes os homens pensavam em Deus para se moldarem à vontade d'Ele; agora os que ainda se dirigem a Deus é frequentemente para lhe exigir que Ele faça a vontade deles; e zangam-se quando o Criador não lhes faz o jeito. Querem pouco mais do que um Deus prestador de serviços.
Entre as pessoas que iam saindo da nova igreja distingui duas impressões. Alguns pareciam-me confusos e desabafavam algo sobre aquilo não se parecer nada com uma igreja. A outros ouvi dizer que era muito bonito, muito moderno. Nestes últimos, por sinal jovens, não era difícil notar que a apreciação nada tinha de religioso, muito menos de católico. Tratava-se de um critério crítico que se aplica indistintamente naquela construção como no estádio da Luz, na estação de Metro do Terreiro do Paço, na Ponte Vasco da Gama ou no Centro Cultural de Belém. Grandes obras de arquitectura e de engenharia, na verdade notáveis a vários títulos. Nas outras pessoas, as que desabafavam que ali não encontravam uma igreja, nem viam um crucifixo na gigantesca cruz plantada ali ao lado (e que faz lembrar pelo material utilizado e pelo despojamento estético a grande árvore de ferro erguida por Jorge Vieira em frente ao Centro Comercial Vasco da Gama) subsiste, ainda que inconsciente ou pouco esclarecida, a ideia de que existe uma arquitectura sagrada, e que o espaço do culto segue regras que o tornam reconhecível (um arqueólogo, mesmo positivista, procurará em qualquer local que escave os significados que o identifiquem como um lugar religioso para aqueles que o construíram e usaram).
Neste sentimento difuso permanece um resquício do que foi uma religião. Mas neste ponto, do esvaziamento, lembro-me inevitavelmente de René Guénon, quando evoca a decadência e a queda do que chama de Ocidente. Sinto-lhe os acertos, mesmo quando não o posso acompanhar. Não acredito na oposição que ele estabeleceu entre Oriente e Ocidente, nem creio que as "sociedades tradicionais" resistam a Oriente ao contrário do que aconteceria a Ocidente. A meu ver, o impulso da modernidade implica no mundo a que Guénon se referia como Oriente as mesmas consequências que trouxe a Ocidente. Obviamente que de forma diferida, com atraso, por força do movimento histórico, e com mais ou menos convulsões, mas a maré homogeneizadora não deixa lugar a ilusões desse tipo (mesmo escrevendo há oitenta anos penso que Guénon não deveria ter-se deixado embalar nessas miragens). O Islão desfaz-se, o Hinduísmo desfaz-se, e o Budismo só vive no Ocidente carente de exotismo. E fiquemos por aqui, que a viagem já vai longa.
Espero ter alguns leitores que me leiam. As pessoas que julgam que uma missa é uma assembleia, e que uma grande sala de conferências substitui perfeitamente uma igreja, não podem certamente compreender do que falo. Restam os outros.
7 Comments:
Amen.
Bom Ano com saúde e a alegria possível, para si e todos os seus.
Maria
Quero só deixar aqui um apontamento de profunda admiração pelo Manuel Azinhal e pelo serviço que tem desempenhado nestes anos.
Parabéns por mais um brilhante artigo. Brilhante porque sério.
Bom Ano.
p.s. Guarde uma oração por mim a N.a Sra de Fátima.
Eu leio-te sempre com agrado Manel.
Mais uma brilhante peça (que aliás teria ficado muito bem na última AlamedaDigital). A construção de um bunker cesarista num Santuário é bem significativa do olvido em que as sábias palavras de Cerejeira estão hoje (cito de memória, seguro de que transmito o sentido, porventura não as palavras correctas) : A hierarquia da Igreja manda construir os templos mas são os fiéis que fazem os Santuários...
Excelente texto.
Mais uma vez pôs a mão na ferida e acertou no alvo.
A doença infantil da direita: a religião católica.
Caro Manuel:
Parabéns pelo texto. Já de miúdo ficava impressionado com a altura das catedrais góticas - altíssimas em busca do Altíssimo. Hoje o que vale é muita democratice, muita igualdade, muito rés-do-chão. E por aí fica-se.
Um abraço.
gOSTARIA QUE ME DISSESSEM DA RAZÃO PELA QUAL RETIRARAM MEU COMMENT AQUI POSTADO.
fIZERA INCLUSIVE UM LINK PARA VOSSO BLOG EM WWW.ANGELOOCHOA.NET QUE A NÃO ME DAREM A RAZÃO E A NÃO POSTAREM ESTE MEU PROTESTO RETIRAREI COMO ME RETIRARAM MINHA PALAVRA ... JULGAM-ME POR MENOS CONVENIENTE COM MINHA LIBERDADE DE FILHO DE DEUS LIBERTADO PELA ÁGUA E PELO ESPÍRITO.
A VOSSO SILÊNCIO SÓ RESPONDEREI COM O MEU SILÊNCIO. É a DO TALIÃO LEI QUE QUEREM «IRMÃOS EM CRISTRO»?
Enviar um comentário
<< Home