Insegurança? Qual insegurança?
Segundo informa hoje o Diário de Notícias, citando dados do Ministério da Justiça, entre 16 de Setembro de 2007 e Março de 2008 foram libertados um total de 315 presos preventivos, o que significa que desde a entrada em vigor do novo Código de Processo Penal (CPP) foram contabilizadas mais 83 libertações que nos seis meses anteriores, de Março a Setembro de 2007.
Como não foi a realidade que melhorou, as referidas libertações só podem ser imputadas à mudança efectuada na lei.
Os números falam por si, mas atrevo-me a observar que por eles só se vislumbra uma parte pequena da situação gerada pelas alterações legislativas em matéria de prisão preventiva.
Com efeito, não são só as libertações, assim quantificadas, a justificar preocupações: muito mais do que as libertações, de gente que em liberdade demonstra rapidamente o bom fundamento da sua detenção, são os casos daqueles que não chegam a ser presos, e tudo impunha que fossem.
Com a entrada em vigor do novo CPP, dificultando extraordinariamente a detenção fora de flagrante delito e a aplicação da prisão preventiva, gerou-se de imediato uma reacção de retraimento nos meios policiais, óbvia e natural (até para defesa própria). Agora só se detém alguém quando não possa mesmo deixar de ser. De facto, para quê andar a fazer detenções que se antevêem como inúteis e que podem resultar em sarilhos para o agente policial mais zeloso? Consequentemente, somando os libertados com os que não chegaram a entrar, aumenta perigosamente o número e a actividade dos marginais à solta, sem outro modo de vida que não seja a criminalidade recorrente. Esta observação tem especial acuidade no que se refere aos crimes contra o património, que são precisamente a área que pela sua expressão quantitativa justifica especiais cuidados de prevenção e combate e que por razões evidentes atinge essencialmente as camadas mais desprotegidas da população.
Ora exactamente nesta área, pela força conjugada das alterações em sede de pressupostos de prisão preventiva e das molduras penais previstas em sede substantiva, tornou-se praticamente impossível fundamentar a prisão preventiva.
Como combater então o pequeno ladrão, o ratoneiro que todas as noites faz seus uns veículos estacionados ou gama umas carteiras? Grande parte deles nunca consuma um furto qualificado, ficando pelo furto simples onde nem em abstracto terá lugar a prisão preventiva; aqueles que tiverem azar e forem apanhados num furto qualificado ou por um roubo também poucas vezes reunirão os restantes presupostos para imposição da prisão preventiva.
Sujeitam-se então todos eles a medidas de apresentação periódica, a cauções, a proibições de contactos, a proibições de frequentar certos meios ou locais....
Por amor de Deus! Quando a comunidade delinquente, que demora algum tempo a absorver e processar a sabedoria que a experiência lhe vai dando, se der conta que toda a malta vai ao juiz para primeiro interrogatório de arguido detido e sai de lá com apresentações, vai ser o bom e o bonito.
Mas disto não cuida a nomenklatura; compreensivelmente, pois quem sofre os desmandos será sempre o povinho.
Entretanto, como ironia suprema, já temos o observatório do Prof. Boaventura a estudar as consequências da aplicação da reforma penal. Uma maravilha, pois claro, a cantar em prosa e em verso.
Como não foi a realidade que melhorou, as referidas libertações só podem ser imputadas à mudança efectuada na lei.
Os números falam por si, mas atrevo-me a observar que por eles só se vislumbra uma parte pequena da situação gerada pelas alterações legislativas em matéria de prisão preventiva.
Com efeito, não são só as libertações, assim quantificadas, a justificar preocupações: muito mais do que as libertações, de gente que em liberdade demonstra rapidamente o bom fundamento da sua detenção, são os casos daqueles que não chegam a ser presos, e tudo impunha que fossem.
Com a entrada em vigor do novo CPP, dificultando extraordinariamente a detenção fora de flagrante delito e a aplicação da prisão preventiva, gerou-se de imediato uma reacção de retraimento nos meios policiais, óbvia e natural (até para defesa própria). Agora só se detém alguém quando não possa mesmo deixar de ser. De facto, para quê andar a fazer detenções que se antevêem como inúteis e que podem resultar em sarilhos para o agente policial mais zeloso? Consequentemente, somando os libertados com os que não chegaram a entrar, aumenta perigosamente o número e a actividade dos marginais à solta, sem outro modo de vida que não seja a criminalidade recorrente. Esta observação tem especial acuidade no que se refere aos crimes contra o património, que são precisamente a área que pela sua expressão quantitativa justifica especiais cuidados de prevenção e combate e que por razões evidentes atinge essencialmente as camadas mais desprotegidas da população.
Ora exactamente nesta área, pela força conjugada das alterações em sede de pressupostos de prisão preventiva e das molduras penais previstas em sede substantiva, tornou-se praticamente impossível fundamentar a prisão preventiva.
Como combater então o pequeno ladrão, o ratoneiro que todas as noites faz seus uns veículos estacionados ou gama umas carteiras? Grande parte deles nunca consuma um furto qualificado, ficando pelo furto simples onde nem em abstracto terá lugar a prisão preventiva; aqueles que tiverem azar e forem apanhados num furto qualificado ou por um roubo também poucas vezes reunirão os restantes presupostos para imposição da prisão preventiva.
Sujeitam-se então todos eles a medidas de apresentação periódica, a cauções, a proibições de contactos, a proibições de frequentar certos meios ou locais....
Por amor de Deus! Quando a comunidade delinquente, que demora algum tempo a absorver e processar a sabedoria que a experiência lhe vai dando, se der conta que toda a malta vai ao juiz para primeiro interrogatório de arguido detido e sai de lá com apresentações, vai ser o bom e o bonito.
Mas disto não cuida a nomenklatura; compreensivelmente, pois quem sofre os desmandos será sempre o povinho.
Entretanto, como ironia suprema, já temos o observatório do Prof. Boaventura a estudar as consequências da aplicação da reforma penal. Uma maravilha, pois claro, a cantar em prosa e em verso.
1 Comments:
Nem de propósito, encontro hoje no Jornal de Notícias, sob o título "Código de Processo Penal comparado a novo "imposto", uma peça que ajuda a explicar o que tentei dizer.
O comandante da PSP de Coimbra comparou, ontem, o novo Código do Processo Penal (CCP) a "um grave imposto, que as pessoas estão a pagar, como vítimas de determinado tipo de crimes". Bastos Leitão aludia ao "recrudescimento" da prática de crimes cuja moldura penal, por ser inferior a cinco anos de cadeia, não coloca os presumíveis autores em prisão preventiva.
"Se o suspeito não é sujeito a medidas de privação da liberdade nem a um processo de ressocialização, qual é a última razão que lhe assiste? É ir perpetrando este tipo de pequeno crime, para matar o vício [em estupefacientes]", declarou Bastos Leitão.
Neste contexto, o comandante contou que a PSP de Coimbra acaba de deter um jovem toxicodependente que levou, ontem mesmo, a primeiro interrogatório judicial. Apesar de a PSP ter "provas" de que ele é autor de "dois assaltos por esticão, mais um furto qualificado e três simples", o juiz colocou-o em liberdade e só o obrigou, como medidas de coacção, a prestar termo de identidade e residência e a apresentar-se, periodicamente, num posto policial, relatou Bastos Leitão.
O responsável fez questão de sublinhar que não tencionava atingir procuradores ou juízes de instrução "Eles estão limitados pelo princípio da legalidade".
Bastos Leitão marcara a conferência de imprensa de ontem para falar da diminuição de 9,5% da criminalidade, em 2007, na área do comando da PSP de Coimbra. Porém, o diálogo com os jornalistas acabou por centrar-se no "recrudescimento" da criminalidade, que não quantificou, no primeiro trimestre deste ano.
Foi justamente a partir de Janeiro, três meses após a entrada em vigor do novo CPP, que se avolumou a libertação de presos preventivos,"que estão novamente activos", apontou o comandante da PSP. Que disse, por outro lado, não ter "dúvidas nenhumas" de que a generalidade dos delinquentes já interiorizou as vantagens do novo Código "Temos relatos de alguns que indicam que sabem o que fazem...", disse.
Bastos Leitão assegurou ainda que a sistemática libertação de suspeitos da prática de pequenos crimes, como furtos em estabelecimentos, residências e viaturas, não levará a PSP a "baixar os braços". Todavia, admitiu que haja uma "reorientação" das suas práticas, virando-as mais para o aconselhamento e a prevenção de crimes. "É preciso que os cidadãos tenham outro tipo de cuidados de autoprotecção", sustentou.
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