Revista "Nova Águia" lançada no Porto
Um acontecimento histórico
Inspirando-se na visão de Portugal e do mundo de Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva, a revista Nova Águia pretende recuperar o espírito de uma das mais importantes publicações do início do séc. XX. A apresentação coube a Miguel Real, que considera tratar-se de um “acontecimento histórico”.
Foi a Fundação Escultor José Rodrigues, na íngreme Rua da Fábrica Social, que acolheu o lançamento da Nova Águia, a revista que pretende recriar o espírito d’A Águia, naturalmente adaptado ao nosso tempo. Renato Epifânio, Celeste Natário e Paulo Borges são os três elementos da direcção desta “Revista de Cultura para o Século XXI”, como o subtítulo adianta.
“A Ideia de Pátria, sua Actualidade” é o tema do primeiro número da publicação semestral vinculada a três entidades: Associação Marânus/ Teixeira de Pascoaes, Associação Agostinho da Silva e MIL: Movimento Internacional Lusófono. No entanto, de acordo com Renato Epifânio, esta edição não se esgota no tema central: “Procurando e valorizando a diversidade de perspectivas, a Nova Águia propõe uma visão de Portugal e do mundo radicada na cultura”. O Manifesto reproduzido nas primeiras páginas da revista conseguiu cerca de meio milhar de adesões em todo o espaço lusófono. “A Nova Águia pretende também reforçar os laços entre os países de língua portuguesa”, acrescentou.
Paulo Borges vai um pouco mais longe: “A nossa ideia não é apenas criar uma revista. O que queremos é tentar suscitar um movimento e instaurar a diferença”. O director da Associação Agostinho da Silva deixou algumas questões: “Queremos continuar a ser um povo adiado, uma nação onde nada se discute de importante? Queremos ou não repensar o sentido da nossa existência colectiva e assumir a pujança da nossa cultura?”. Para Paulo Borges, importante será tentarmos “estar minimamente à altura do legado cultural que nos deixaram”. “O que procuramos é uma pátria alternativa mundial, uma pátria que se especialize em fazer mediações, em trabalhar para o diálogo”, acrescentou, deixando o apelo a todos.
Portugal não morreu
Depois do testemunho de Alfredo Ribeiro dos Santos, aluno de Leonardo Coimbra e contemporâneo das figuras que colaboraram na revista A Águia (“Jaime Cortesão fazia a pedagogia; Pascoaes fazia a poesia”, sorriu), foi a vez do contributo de Miguel Real, que publicou recentemente o ensaio «A Morte de Portugal»: “Se fosse hoje, já não escreveria esse livro, porque a geração por trás desta revista permite-me saber que Portugal não morreu”. De acordo com o ensaísta, trata-se de uma geração “que está a pensar numa nova configuração de Portugal”.
“É excessivamente raro darmos conta de que estamos a viver um acontecimento histórico. Esta noite, está a acontecer”, defendeu o também romancista e professor universitário. De acordo com Miguel Real, estamos perante um acontecimento histórico porque, para além do espírito que a revista encerra, pela primeira vez, desde há 30 anos, há uma geração que não se envergonha de Portugal: “As nossas elites têm muita vergonha do nosso povo e querem que ele tenha rapidamente o 9º ano ou a Universidade. Em dois ou três anos, querem mostrar novas estatísticas. A geração que aqui está não tem vergonha de pensar a identidade portuguesa (nos aspectos melhores e nos piores)”. É também um momento histórico, reforçou, “porque os organizadores não aprofundaram a mania portuguesa de se centrarem em si próprios e nos seus amigos – basta ler o Conselho de Direcção”. Este Conselho integra 52 nomes, de Adriano Moreira a Baptista Bastos, de Eduardo Lourenço a Guilherme de Oliveira Martins, de Mário Cláudio a Pedro Agostinho da Silva, filho do nosso pensador.
Uma alternativa à Europa
Virada para o futuro, “a Nova Águia não tem medo de sujar as mãos” e “reflecte um espírito novo, já do novo século”, defendeu Miguel Real. “Nada de original nasceu em Portugal nos últimos 30 anos ao nível do pensamento, que se evidenciasse. Talvez seja este o passo mais importante para o pensamento no Portugal do séc. XXI.”
O autor de «O Último Minuto na Vida de S.» considera que demorámos 30 anos a perceber que o sonho da Europa não passa disso mesmo: um sonho que estava em nós e não na Europa. A culpa, porém, não é da Europa: “As culpadas são as elites portuguesas dos últimos 30 anos, que substituíram a solidariedade pela individualidade, a honestidade, a lealdade e a amizade pelo dinheiro, os valores espirituais pelos valores económicos”. A Nova Águia, defende, vem provar que o sonho ingénuo português acabou, e que só assim nos podemos reencontrar: perdendo a vergonha de alguns momentos da nossa História, procurando uma alternativa à Europa sem que da Europa tenhamos que sair.
A concluir, Miguel Real felicitou “esta geração sem complexos, com a vontade e o entusiasmo de transformar um passado comum num futuro comum, com uma língua comum, num espírito harmónico”.
Contando com um inédito de Agustina Bessa-Luís, a Nova Águia é uma revista que se pretende de âmbito nacional, em parceria com a editora Zéfiro. Depois desta sessão no Porto, tem já agendadas mais de duas dezenas de lançamentos em todo o País.
(In O Primeiro de Janeiro, 21 de Maio de 2008)
Inspirando-se na visão de Portugal e do mundo de Teixeira de Pascoaes, Fernando Pessoa e Agostinho da Silva, a revista Nova Águia pretende recuperar o espírito de uma das mais importantes publicações do início do séc. XX. A apresentação coube a Miguel Real, que considera tratar-se de um “acontecimento histórico”.
Foi a Fundação Escultor José Rodrigues, na íngreme Rua da Fábrica Social, que acolheu o lançamento da Nova Águia, a revista que pretende recriar o espírito d’A Águia, naturalmente adaptado ao nosso tempo. Renato Epifânio, Celeste Natário e Paulo Borges são os três elementos da direcção desta “Revista de Cultura para o Século XXI”, como o subtítulo adianta.
“A Ideia de Pátria, sua Actualidade” é o tema do primeiro número da publicação semestral vinculada a três entidades: Associação Marânus/ Teixeira de Pascoaes, Associação Agostinho da Silva e MIL: Movimento Internacional Lusófono. No entanto, de acordo com Renato Epifânio, esta edição não se esgota no tema central: “Procurando e valorizando a diversidade de perspectivas, a Nova Águia propõe uma visão de Portugal e do mundo radicada na cultura”. O Manifesto reproduzido nas primeiras páginas da revista conseguiu cerca de meio milhar de adesões em todo o espaço lusófono. “A Nova Águia pretende também reforçar os laços entre os países de língua portuguesa”, acrescentou.
Paulo Borges vai um pouco mais longe: “A nossa ideia não é apenas criar uma revista. O que queremos é tentar suscitar um movimento e instaurar a diferença”. O director da Associação Agostinho da Silva deixou algumas questões: “Queremos continuar a ser um povo adiado, uma nação onde nada se discute de importante? Queremos ou não repensar o sentido da nossa existência colectiva e assumir a pujança da nossa cultura?”. Para Paulo Borges, importante será tentarmos “estar minimamente à altura do legado cultural que nos deixaram”. “O que procuramos é uma pátria alternativa mundial, uma pátria que se especialize em fazer mediações, em trabalhar para o diálogo”, acrescentou, deixando o apelo a todos.
Portugal não morreu
Depois do testemunho de Alfredo Ribeiro dos Santos, aluno de Leonardo Coimbra e contemporâneo das figuras que colaboraram na revista A Águia (“Jaime Cortesão fazia a pedagogia; Pascoaes fazia a poesia”, sorriu), foi a vez do contributo de Miguel Real, que publicou recentemente o ensaio «A Morte de Portugal»: “Se fosse hoje, já não escreveria esse livro, porque a geração por trás desta revista permite-me saber que Portugal não morreu”. De acordo com o ensaísta, trata-se de uma geração “que está a pensar numa nova configuração de Portugal”.
“É excessivamente raro darmos conta de que estamos a viver um acontecimento histórico. Esta noite, está a acontecer”, defendeu o também romancista e professor universitário. De acordo com Miguel Real, estamos perante um acontecimento histórico porque, para além do espírito que a revista encerra, pela primeira vez, desde há 30 anos, há uma geração que não se envergonha de Portugal: “As nossas elites têm muita vergonha do nosso povo e querem que ele tenha rapidamente o 9º ano ou a Universidade. Em dois ou três anos, querem mostrar novas estatísticas. A geração que aqui está não tem vergonha de pensar a identidade portuguesa (nos aspectos melhores e nos piores)”. É também um momento histórico, reforçou, “porque os organizadores não aprofundaram a mania portuguesa de se centrarem em si próprios e nos seus amigos – basta ler o Conselho de Direcção”. Este Conselho integra 52 nomes, de Adriano Moreira a Baptista Bastos, de Eduardo Lourenço a Guilherme de Oliveira Martins, de Mário Cláudio a Pedro Agostinho da Silva, filho do nosso pensador.
Uma alternativa à Europa
Virada para o futuro, “a Nova Águia não tem medo de sujar as mãos” e “reflecte um espírito novo, já do novo século”, defendeu Miguel Real. “Nada de original nasceu em Portugal nos últimos 30 anos ao nível do pensamento, que se evidenciasse. Talvez seja este o passo mais importante para o pensamento no Portugal do séc. XXI.”
O autor de «O Último Minuto na Vida de S.» considera que demorámos 30 anos a perceber que o sonho da Europa não passa disso mesmo: um sonho que estava em nós e não na Europa. A culpa, porém, não é da Europa: “As culpadas são as elites portuguesas dos últimos 30 anos, que substituíram a solidariedade pela individualidade, a honestidade, a lealdade e a amizade pelo dinheiro, os valores espirituais pelos valores económicos”. A Nova Águia, defende, vem provar que o sonho ingénuo português acabou, e que só assim nos podemos reencontrar: perdendo a vergonha de alguns momentos da nossa História, procurando uma alternativa à Europa sem que da Europa tenhamos que sair.
A concluir, Miguel Real felicitou “esta geração sem complexos, com a vontade e o entusiasmo de transformar um passado comum num futuro comum, com uma língua comum, num espírito harmónico”.
Contando com um inédito de Agustina Bessa-Luís, a Nova Águia é uma revista que se pretende de âmbito nacional, em parceria com a editora Zéfiro. Depois desta sessão no Porto, tem já agendadas mais de duas dezenas de lançamentos em todo o País.
(In O Primeiro de Janeiro, 21 de Maio de 2008)
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