No dia seguinte
(por Nuno Rogeiro)
No dia seguinte ao Natal, cai-nos a realidade em cima. O país real definha, o país irreal prospera. Até amanhã, mas não depois. A Banca arruinada pede dinheiro ao povo. O povo arruinado pede dinheiro ao Estado. O Estado arruinado pede dinheiro à Banca arruinada que pede dinheiro ao povo. E aí por diante, até Bruxelas, onde a Europa em crise parece próspera, face ao resto do mundo, pendurado no cadafalso.
Encontro NB, numa fila de compras, que faz lembrar as intermináveis linhas humanas de Moscovo, mas agora com bens nas vitrinas. É a vantagem do não-comunismo. Apresento o meu A ao NB: aquele é guitarrista a sério, a começar, este fez de guitarrista no cinema, no intervalo de mais um admirável retrato de polícia reformado, mas com dedo para analisar a alma do homem.
Falamos de tudo. Do facto de Portugal não ter chama, apesar de ter muitos fogos. Das dívidas do Estado e das dívidas ao Estado. Da parede que nos parece separar do futuro.
Pelas frestas da conversa, vem o Pessoa e a Mensagem, e o nevoeiro nacional.
Tudo parece provisório e ilusório. Tudo é partido, nada é inteiro. E etc..
Claro que lá fora é tão mau, ou pior. Nas igrejas, lembra-se, com propriedade, que o espírito sobrevive à crise dos agiotas, e que será o espírito, a reflexão, a introspecção, o exame de consciência, e a invenção intelectual, que nos forçarão a retornar à humanidade.
Em Wall Street, o GM, que me convida para a posse de Barack Obama, diz que a América - dos automóveis aos filmes, dos bancos aos restaurantes de comida rápida - há-de produzir milhões de desempregados, que irão mudar de pele, mudar de vida, e recomeçar com outro nome.
Já vimos isto. Aquilo que existe nos EUA, seja social-democracia, seja capitalismo, seja república social, seja outra coisa, já morreu e já renasceu várias vezes: demasiadas para nos podermos lembrar.
DL fala de Bruxelas. Feliz Natal por lá, horas antes de o Menino ter olhado para as estrelas, percebendo pela primeira vez o mistério da carne finita, habitada pela inteligência eterna. Na Bélgica, compra-se em massa, e ninguém verdadeiramente pensa no que vai suceder em 2009. Pode ser o Dilúvio, pode ser a salvação.
Com o A, ladeados pelo J e pelo PC (que discorrem, parece, sobre o amor da África), falamos sobre a Hungria, e os outros grandes países da Europa, que vivem com milhões fora das suas fronteiras: Alemanha, Polónia, Alemanha.
O que seria, se o compromisso da EU se dissolvesse, e regressassem todos às querelas antigas? A Croácia e a Eslovénia pela Baía de Piran, a Hungria e a Eslováquia pelas minorias sem direito à língua, a Turquia e a Grécia pelo Chipre, Espanha e o Reino Unido por Gibraltar, a Alemanha e a Polónia pelo "espaço vital" de Hitler, feito espaço vital de outros, a Rússia e os restos do império por colinas, e rios e fronteiras, os reinos de todos contra todos e as legiões que chegam aos abismos.
Como seria? Povos refilando com povos, tribos lembradas de ofensas lendárias, mitos servidos quentes ao pequeno-almoço.
Passo em revista, com a B, o eterno Médio Oriente. Israel e Palestina sabem que, de Washington, não virá mais nem o Messias, nem um bode expiatório. O novo realismo americano terá consequências.
E a Guiné Conakry? Foi descolonizada a tempo e horas, com civilidade, segundo os ventos da história. Não tem tido conserto, e a culpa não é dos antigos patrões.
No dia seguinte, o mundo é o mesmo. E quanto mais muda, mais parecido fica.
No dia seguinte ao Natal, cai-nos a realidade em cima. O país real definha, o país irreal prospera. Até amanhã, mas não depois. A Banca arruinada pede dinheiro ao povo. O povo arruinado pede dinheiro ao Estado. O Estado arruinado pede dinheiro à Banca arruinada que pede dinheiro ao povo. E aí por diante, até Bruxelas, onde a Europa em crise parece próspera, face ao resto do mundo, pendurado no cadafalso.
Encontro NB, numa fila de compras, que faz lembrar as intermináveis linhas humanas de Moscovo, mas agora com bens nas vitrinas. É a vantagem do não-comunismo. Apresento o meu A ao NB: aquele é guitarrista a sério, a começar, este fez de guitarrista no cinema, no intervalo de mais um admirável retrato de polícia reformado, mas com dedo para analisar a alma do homem.
Falamos de tudo. Do facto de Portugal não ter chama, apesar de ter muitos fogos. Das dívidas do Estado e das dívidas ao Estado. Da parede que nos parece separar do futuro.
Pelas frestas da conversa, vem o Pessoa e a Mensagem, e o nevoeiro nacional.
Tudo parece provisório e ilusório. Tudo é partido, nada é inteiro. E etc..
Claro que lá fora é tão mau, ou pior. Nas igrejas, lembra-se, com propriedade, que o espírito sobrevive à crise dos agiotas, e que será o espírito, a reflexão, a introspecção, o exame de consciência, e a invenção intelectual, que nos forçarão a retornar à humanidade.
Em Wall Street, o GM, que me convida para a posse de Barack Obama, diz que a América - dos automóveis aos filmes, dos bancos aos restaurantes de comida rápida - há-de produzir milhões de desempregados, que irão mudar de pele, mudar de vida, e recomeçar com outro nome.
Já vimos isto. Aquilo que existe nos EUA, seja social-democracia, seja capitalismo, seja república social, seja outra coisa, já morreu e já renasceu várias vezes: demasiadas para nos podermos lembrar.
DL fala de Bruxelas. Feliz Natal por lá, horas antes de o Menino ter olhado para as estrelas, percebendo pela primeira vez o mistério da carne finita, habitada pela inteligência eterna. Na Bélgica, compra-se em massa, e ninguém verdadeiramente pensa no que vai suceder em 2009. Pode ser o Dilúvio, pode ser a salvação.
Com o A, ladeados pelo J e pelo PC (que discorrem, parece, sobre o amor da África), falamos sobre a Hungria, e os outros grandes países da Europa, que vivem com milhões fora das suas fronteiras: Alemanha, Polónia, Alemanha.
O que seria, se o compromisso da EU se dissolvesse, e regressassem todos às querelas antigas? A Croácia e a Eslovénia pela Baía de Piran, a Hungria e a Eslováquia pelas minorias sem direito à língua, a Turquia e a Grécia pelo Chipre, Espanha e o Reino Unido por Gibraltar, a Alemanha e a Polónia pelo "espaço vital" de Hitler, feito espaço vital de outros, a Rússia e os restos do império por colinas, e rios e fronteiras, os reinos de todos contra todos e as legiões que chegam aos abismos.
Como seria? Povos refilando com povos, tribos lembradas de ofensas lendárias, mitos servidos quentes ao pequeno-almoço.
Passo em revista, com a B, o eterno Médio Oriente. Israel e Palestina sabem que, de Washington, não virá mais nem o Messias, nem um bode expiatório. O novo realismo americano terá consequências.
E a Guiné Conakry? Foi descolonizada a tempo e horas, com civilidade, segundo os ventos da história. Não tem tido conserto, e a culpa não é dos antigos patrões.
No dia seguinte, o mundo é o mesmo. E quanto mais muda, mais parecido fica.
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