PARABÉNS, SALAZAR!
Sob o título acima, o grande cineasta e homem de cultura que foi António Lopes Ribeiro fez questão de publicar no semanário "A Rua", a 28 de Abril de 1977, dia em que passavam 88 anos sobre o nascimento de Salazar, o artigo que se segue, e que aqui republico para assinalar o dia de hoje, em que se completam 120 anos sobre o mesmo acontecimento. Parabéns, Salazar!
Se fosses vivo, Salazar, completarias hoje – hoje precisamente - 88 anos. O que quer dizer que sem a queda desastrada e desastrosa que atirou contigo, semanas depois, para o Hospital da Cruz Vermelha, e dali a dois anos para o cemitério do Vimeiro, podias muito bem ainda estar vivo. E é de crer que com a tua fortaleza de alma, a força inquebrantável do teu espírito, a rijeza beirã que te fez resistir a todos os achaques que te afligiram desde a juventude, ainda hoje estivesses vivo e são, física e mentalmente. A prova é que mesmo durante os vinte e dois meses da tua longa e lenta agonia (já disse um poeta que morreste "devagar", como aquele rei de Portugal a quem chamaram Capitão de Deus) mantiveste quase intacta a lucidez que fez de ti, quer queiram quer não, uma das mais altas figuras da nossa história multissecular. E, sem sombra de dúvida, o maior Português do nosso século.
Mas, se hoje estás fisicamente morto, jazendo na tua campa modesta - que ainda ninguém se atreveu a profanar e onde todos os dias há quem vá depor flores - continuas vivo, bem vivo, cada vez mais vivo na memória de todos os Portugueses, mesmo na daqueles que se disseram teus inimigos e hoje tentam - em vão - apagar a lembrança do que foste, sumir a recordação do muito que fizeste pelo país onde nasceste, pelo povo a que pertences, povo e país que serão sempre os teus, pelos séculos dos séculos.
Que importa que umas dúzias, ou mesmo umas centenas de aventureiros da política, fardados ou à paisana, procurem negar a tua obra, que nem sequer tiveram o bom senso e a inteligência de aproveitar no que ela teve de melhor, em beneficio deles próprios? Que interessa que um caquético capitão, percursor falhado e exilado de outros capitães - alguns dos quais como ele se exilaram para não prestar contas dos seus malefícios - te chame, com a grosseria própria das casernas, "o fradalhão de Santa Comba"? Julgará ele, no seu anticlericalismo primário e imbecil, que comparar-te aos frades mais austeros e mais sábios pode diminuir, no mínimo que seja, a tua estatura gigantesca de mestre e de estadista, a tua auréola de pensador e homem de acção, a tua exemplar integridade moral, a tua honestidade incorruptível, o teu portuguesismo inabalável?... Pobre tonto!
Frade foi António Vieira, cujas cartas e sermões relias e meditavas com afinco, por serem tratado incomparável de governação, lição sem par de fé cristã e de amor pátrio. Frade se fez Manuel de Sousa Coutinho - Frei Luís de Sousa - que foi, tal como tu, exemplo de patriotismo e grande escritor. E outros, muitos outros, de que a História, tantas vezes ingrata ou distraída, não reteve os nomes, mas que devotaram a vida, como tu, ao serviço de Deus e da Pátria, lutando de armas na mão contra invasores cobiçosos, missionando nas terras de além-mar que descobrimos e cristianizámos, que arroteámos e civilizámos, na África, na Índia, no Brasil. Essas terras que muitos dos que hoje intentam renegar-te defenderam heroicamente enquanto foste vivo, para depois da tua morte - só depois! - as entregarem de mão beijada aos nossos inimigos mais cruéis. Essas terras que abandonámos e despovoámos nas mais trágicas e vergonhosas condições, com a cumplicidade traiçoeira ou o assentimento inexplicável daqueles que haviam jurado solenemente defendê-las, mesmo com o sacrifício da própria vida.
E alguns deles, como outros de igual jaez que não juraram nada, não tiveram pejo de ir morar na mesma casa onde moraste, de se sentarem à tua mesa de trabalho, à tua mesa de jantar, de dormirem na mesma cama onde dormiste! É até provável, na sua incomensurável vaidade e estólida inconsciência, que isso lhes parecesse merecido galardão, e que não sintam remorsos, nem lhes trema a caneta, nem os aflijam fastios, indigestões, insónias e pesadelos. Que desaforo!
Seria na ignara esperança de que a tua fantomática presença lhes guiasse o pensamento e inspirasse as grandes decisões?... Que estupidez!
Comparem-se com os teus, os seus despachos, comunicados, decretos, projectos de lei, entrevistas e discursos. Que abismo os separa! Que declínio abissal na linguagem e nos intuitos, na clareza e na eficácia! Seria de rir a perder, se por efeito deles não estivéssemos perdidos, por tudo quanto se perdeu. Em troca de quê? Da liberdade?... Qual?
Será que nem disso se dão conta?... Não o creio. Por mais inconscientes e vaidosos que sejam, ainda lhes sobrará um resíduo de inteligência que lhes permita avaliar a incapacidade de se equipararem, ou sequer se aproximarem do teu génio político, da tua competência jurídica, da tua habilidade diplomática. De tudo aquilo que nos deu quase meio século de moeda firme, de finanças sãs, de contas certas, de orçamentos equilibrados e superavitários, de obras públicas notáveis, de progresso económico constante, de ordem nas ruas, disciplina nos quartéis, nas fábricas, nas escolas.
Eras "autoritário"?... Que falta nos faz agora quem o seja, no sentido do teu "autoritarismo", oriundo da tua enorme "autoridade"! Autoridade fundada no "respeito geral" que soubeste ganhar, e merecer, em Portugal e no estrangeiro. Pasma-se de pensar que durante a tua vida inteira e nos longos meses da tua luta contra a morte foste mais respeitado pelos teus próprios inimigos do que eles hoje são pelos seus próprios partidários!
Que fizeram eles, os que usurparam inesperadamente o lugar que tão honrada e honrosamente ocupaste, e aqueles que eles chamaram para os acolitar formando em três anos sete governos, promovendo quatro eleições, promulgando uma Constituição inviável?...
Consentiram que se instaurasse a desordem arruaceira nas ruas; deixaram conspurcar as cidades, destroçar os campos, desbaratar o comércio e a indústria, desacreditar a polícia e o trabalho, indisciplinar as forças armadas, extinguir o turismo, desorganizar as artes, degradar o ensino, correr à rédea solta a pornografia e o crime.
Num tempo recorde, empandeiraram a "pesada herança" que deixaste em ouro e em divisas; viram-se forçados a desvalorizar o escudo, a restringir aos nacionais a livre saída para o estrangeiro - sem contudo se privarem de lá ir, vezes sem conta, com luzidas comitivas, para assinar "acordos culturais", mas sobretudo mendigar uns milhõezitos de dólares para "restaurarem" o país que arruinaram estupidamente, que reduziram à escassez geográfica dumas plagas atlânticas e ao zero absoluto da íntima consideração universal. Mas viajam, caramba, viajam muito! Ao passo que tu, Salazar, desde que assumiste o fardo - tão pesado! - do poder, consciente da responsabilidade que assumias, só passaste a fronteira duas vezes, e para ir bem perto daqui. Para fazer o quê? Para evitar - como evitaste - que a tremenda guerra que então assolava quase o Mundo inteiro não transpusesse os Pirinéus e nos tocasse pela porta. Durante esses seis anos pavorosos mantiveste-nos em paz, em paz total, acolhendo todos os refugiados que à nossa paz se vieram acolher, e que festejaram connosco, em 1940, oito séculos de história - história maravilhosa que hoje há quem procure denegrir, nos monumentos, nos livros, nas escolas, nos espectáculos, nos jornais, nos meios ditos de "comunicação social"...
No estrangeiro, a cuja conspiração aberta ou oculta cabe talvez a maior culpa da nossa presente decadência, deram-te a suprema honra de nunca imprimirem o teu retrato na capa das grandes revistas internacionais - a "Life", a "Times", a "Newsweek", "Paris Match", "L'Express" - não te emparceirando com outros que lá têm aparecido - Fidel Castro, Che Guevara, Yasser Arafat, Indira Gandhi, Idi Amin... (Dos portugueses, foram lá prantados, nos últimos três anos, Spínola, Costa Gomes, Vasco Gonçalves, Otelo, Álvaro Cunhal, Mário Soares.)
Hoje, 28 de Abril, três dias depois duma data que já só se celebra com especiais cautelas, completam-se 88 anos após o dia em que nasceste, naquela humilde casa do Vimeiro onde gostavas muito mais de estar do que no Palácio de São Bento. Por isso, em nome de milhões de Portugueses que te recordam com desesperada saudade; em nome dos que ainda sobrevivem permanecendo fiéis à tua memória, neste pobre recanto da Europa ou exilados no estrangeiro; em nome dos que morreram combatendo, a defender o que era nosso desde há cinco séculos - parabéns, Salazar! Muitos parabéns.
ANTONIO LOPES RIBEIRO
Se fosses vivo, Salazar, completarias hoje – hoje precisamente - 88 anos. O que quer dizer que sem a queda desastrada e desastrosa que atirou contigo, semanas depois, para o Hospital da Cruz Vermelha, e dali a dois anos para o cemitério do Vimeiro, podias muito bem ainda estar vivo. E é de crer que com a tua fortaleza de alma, a força inquebrantável do teu espírito, a rijeza beirã que te fez resistir a todos os achaques que te afligiram desde a juventude, ainda hoje estivesses vivo e são, física e mentalmente. A prova é que mesmo durante os vinte e dois meses da tua longa e lenta agonia (já disse um poeta que morreste "devagar", como aquele rei de Portugal a quem chamaram Capitão de Deus) mantiveste quase intacta a lucidez que fez de ti, quer queiram quer não, uma das mais altas figuras da nossa história multissecular. E, sem sombra de dúvida, o maior Português do nosso século.
Mas, se hoje estás fisicamente morto, jazendo na tua campa modesta - que ainda ninguém se atreveu a profanar e onde todos os dias há quem vá depor flores - continuas vivo, bem vivo, cada vez mais vivo na memória de todos os Portugueses, mesmo na daqueles que se disseram teus inimigos e hoje tentam - em vão - apagar a lembrança do que foste, sumir a recordação do muito que fizeste pelo país onde nasceste, pelo povo a que pertences, povo e país que serão sempre os teus, pelos séculos dos séculos.
Que importa que umas dúzias, ou mesmo umas centenas de aventureiros da política, fardados ou à paisana, procurem negar a tua obra, que nem sequer tiveram o bom senso e a inteligência de aproveitar no que ela teve de melhor, em beneficio deles próprios? Que interessa que um caquético capitão, percursor falhado e exilado de outros capitães - alguns dos quais como ele se exilaram para não prestar contas dos seus malefícios - te chame, com a grosseria própria das casernas, "o fradalhão de Santa Comba"? Julgará ele, no seu anticlericalismo primário e imbecil, que comparar-te aos frades mais austeros e mais sábios pode diminuir, no mínimo que seja, a tua estatura gigantesca de mestre e de estadista, a tua auréola de pensador e homem de acção, a tua exemplar integridade moral, a tua honestidade incorruptível, o teu portuguesismo inabalável?... Pobre tonto!
Frade foi António Vieira, cujas cartas e sermões relias e meditavas com afinco, por serem tratado incomparável de governação, lição sem par de fé cristã e de amor pátrio. Frade se fez Manuel de Sousa Coutinho - Frei Luís de Sousa - que foi, tal como tu, exemplo de patriotismo e grande escritor. E outros, muitos outros, de que a História, tantas vezes ingrata ou distraída, não reteve os nomes, mas que devotaram a vida, como tu, ao serviço de Deus e da Pátria, lutando de armas na mão contra invasores cobiçosos, missionando nas terras de além-mar que descobrimos e cristianizámos, que arroteámos e civilizámos, na África, na Índia, no Brasil. Essas terras que muitos dos que hoje intentam renegar-te defenderam heroicamente enquanto foste vivo, para depois da tua morte - só depois! - as entregarem de mão beijada aos nossos inimigos mais cruéis. Essas terras que abandonámos e despovoámos nas mais trágicas e vergonhosas condições, com a cumplicidade traiçoeira ou o assentimento inexplicável daqueles que haviam jurado solenemente defendê-las, mesmo com o sacrifício da própria vida.
E alguns deles, como outros de igual jaez que não juraram nada, não tiveram pejo de ir morar na mesma casa onde moraste, de se sentarem à tua mesa de trabalho, à tua mesa de jantar, de dormirem na mesma cama onde dormiste! É até provável, na sua incomensurável vaidade e estólida inconsciência, que isso lhes parecesse merecido galardão, e que não sintam remorsos, nem lhes trema a caneta, nem os aflijam fastios, indigestões, insónias e pesadelos. Que desaforo!
Seria na ignara esperança de que a tua fantomática presença lhes guiasse o pensamento e inspirasse as grandes decisões?... Que estupidez!
Comparem-se com os teus, os seus despachos, comunicados, decretos, projectos de lei, entrevistas e discursos. Que abismo os separa! Que declínio abissal na linguagem e nos intuitos, na clareza e na eficácia! Seria de rir a perder, se por efeito deles não estivéssemos perdidos, por tudo quanto se perdeu. Em troca de quê? Da liberdade?... Qual?
Será que nem disso se dão conta?... Não o creio. Por mais inconscientes e vaidosos que sejam, ainda lhes sobrará um resíduo de inteligência que lhes permita avaliar a incapacidade de se equipararem, ou sequer se aproximarem do teu génio político, da tua competência jurídica, da tua habilidade diplomática. De tudo aquilo que nos deu quase meio século de moeda firme, de finanças sãs, de contas certas, de orçamentos equilibrados e superavitários, de obras públicas notáveis, de progresso económico constante, de ordem nas ruas, disciplina nos quartéis, nas fábricas, nas escolas.
Eras "autoritário"?... Que falta nos faz agora quem o seja, no sentido do teu "autoritarismo", oriundo da tua enorme "autoridade"! Autoridade fundada no "respeito geral" que soubeste ganhar, e merecer, em Portugal e no estrangeiro. Pasma-se de pensar que durante a tua vida inteira e nos longos meses da tua luta contra a morte foste mais respeitado pelos teus próprios inimigos do que eles hoje são pelos seus próprios partidários!
Que fizeram eles, os que usurparam inesperadamente o lugar que tão honrada e honrosamente ocupaste, e aqueles que eles chamaram para os acolitar formando em três anos sete governos, promovendo quatro eleições, promulgando uma Constituição inviável?...
Consentiram que se instaurasse a desordem arruaceira nas ruas; deixaram conspurcar as cidades, destroçar os campos, desbaratar o comércio e a indústria, desacreditar a polícia e o trabalho, indisciplinar as forças armadas, extinguir o turismo, desorganizar as artes, degradar o ensino, correr à rédea solta a pornografia e o crime.
Num tempo recorde, empandeiraram a "pesada herança" que deixaste em ouro e em divisas; viram-se forçados a desvalorizar o escudo, a restringir aos nacionais a livre saída para o estrangeiro - sem contudo se privarem de lá ir, vezes sem conta, com luzidas comitivas, para assinar "acordos culturais", mas sobretudo mendigar uns milhõezitos de dólares para "restaurarem" o país que arruinaram estupidamente, que reduziram à escassez geográfica dumas plagas atlânticas e ao zero absoluto da íntima consideração universal. Mas viajam, caramba, viajam muito! Ao passo que tu, Salazar, desde que assumiste o fardo - tão pesado! - do poder, consciente da responsabilidade que assumias, só passaste a fronteira duas vezes, e para ir bem perto daqui. Para fazer o quê? Para evitar - como evitaste - que a tremenda guerra que então assolava quase o Mundo inteiro não transpusesse os Pirinéus e nos tocasse pela porta. Durante esses seis anos pavorosos mantiveste-nos em paz, em paz total, acolhendo todos os refugiados que à nossa paz se vieram acolher, e que festejaram connosco, em 1940, oito séculos de história - história maravilhosa que hoje há quem procure denegrir, nos monumentos, nos livros, nas escolas, nos espectáculos, nos jornais, nos meios ditos de "comunicação social"...
No estrangeiro, a cuja conspiração aberta ou oculta cabe talvez a maior culpa da nossa presente decadência, deram-te a suprema honra de nunca imprimirem o teu retrato na capa das grandes revistas internacionais - a "Life", a "Times", a "Newsweek", "Paris Match", "L'Express" - não te emparceirando com outros que lá têm aparecido - Fidel Castro, Che Guevara, Yasser Arafat, Indira Gandhi, Idi Amin... (Dos portugueses, foram lá prantados, nos últimos três anos, Spínola, Costa Gomes, Vasco Gonçalves, Otelo, Álvaro Cunhal, Mário Soares.)
Hoje, 28 de Abril, três dias depois duma data que já só se celebra com especiais cautelas, completam-se 88 anos após o dia em que nasceste, naquela humilde casa do Vimeiro onde gostavas muito mais de estar do que no Palácio de São Bento. Por isso, em nome de milhões de Portugueses que te recordam com desesperada saudade; em nome dos que ainda sobrevivem permanecendo fiéis à tua memória, neste pobre recanto da Europa ou exilados no estrangeiro; em nome dos que morreram combatendo, a defender o que era nosso desde há cinco séculos - parabéns, Salazar! Muitos parabéns.
ANTONIO LOPES RIBEIRO
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