sexta-feira, maio 14, 2021

RACIOCINANDO SOBRE O CHEGA



Este gráfico foi divulgado nos últimos dias e pretende representar o quadro partidário actual. Torna oportuno transmitir umas breves reflexões.
A única possibilidade de alterar realmente este equilíbrio político reside no crescimento do CHEGA. Se isso acontecer significará uma alteração profunda no sistema de partidos, como não há outro exemplo desde o PRD (que foi uma mudança breve e efémera). Digo isto porque a IL só pode aspirar à consolidação por volta dos 5 ou 6%, é um partido claramente urbano e dirigido a um segmento limitado do eleitorado, a classe média/alta com bom nível de instrução e rendimento. Pode substituir o CDS e um certo PSD, mas só nesse segmento social, que é numericamente limitado. O CHEGA pelo contrário é um partido popular, e nisso está o seu potencial de crescimento, porque pode efectivamente alimentar-se no eleitorado que foi do PS, do PCP, da abstenção, sobretudo da abstenção, e não só dos revoltados à direita. Descontentes há muitos, e não só à direita. Porém, como me parece evidente, essa força potencial do CHEGA é também a sua fraqueza, porque é muito difícil organizar o crescimento de uma força dessa natureza, sem quadros políticos de qualidade, sem experiência organizacional, e tendo como matéria prima uma massa turbulenta heterogénea, pouco propensa a regras, e extremamente volátil, porque essencialmente emocional, movida por impulsos circunstanciais. Não sei se será possível. Tenho insistido em que o CHEGA se optar por ser apenas o partido da direita, competindo com o PSD e o CDS sobre qual é o mais direitista, então vai estagnar nesses tais 6%, o que me parece uma derrota e não implica grande alteração no xadrez político. Se pelo contrário apostar em ser um partido radicalmente popular, enquadrando todos os sectores do eleitorado que se sentem mal representados ou sem representação, então vai corroer seriamente as bases do eleitorado de esquerda, e não apenas os descontentes à direita, e pode aspirar a patamar muito superior. Há temas transversais, a luta contra a corrupção, a crítica à classe política, a justiça social, o apelo aos valores fundamentais, o problema da ordem pública, os problemas da imigração, a tirania fiscal, as questões da subsidiodependência... O CHEGA pode vir a ser muito. Mas as dificuldades que apontei também podem levar a que seja um balão que encheu e se esvazia, por entre quezílias internas, vaidades pessoais, querelas ridículas, protagonismos frustrados, e uma incapacidade de definir e manter um rumo coerente. Ser popular tem destes riscos, é fácil esvair-se num ambiente de fim de feira. Mas quem quiser um ambiente de gente fina e clube seleccionado e burguês tem o IL. Quanto ao CHEGA... tem agora o grande desafio das autárquicas (precisamente as eleições que lhe são mais desfavoráveis, dada a falta de máquina previamente organizada). Veremos qual a capacidade se superar. Tudo está nas mãos de uma legião de gente sem experiência política anterior, em geral desiludidos da política, sem fortuna nem pergaminhos, que luta pela vida trabalhando no país real, longe da vista das televisões e dos jornalistas e desconhecida dos corredores ou dos gabinetes climatizados. Não sei se o sucesso será possível. Mas se não for o povo ninguém o fará.