segunda-feira, julho 21, 2008

O estado da nação

O Paulo Borges, que foi sempre muito distraído, foi agora visitar a Assembleia da República. Veio de lá com algumas impressões que quis partilhar por meio da carta seguinte.

Caras Amigas e Amigos,

Passei hoje toda a manhã na Assembleia da República, para assistir à discussão da petição sobre os Direitos Humanos no Tibete, de que fui o primeiro subscritor e que obteve 11000 assinaturas. Mas não é disso que venho falar. Venho falar da confirmação directa da imagem que já tinha do estado da nação, no que respeita aos seus representantes parlamentares.
Hoje era o último dia de trabalhos antes das férias parlamentares, com uma agenda cheia de debates e votações sobre projectos de lei e petições. Às 10 horas, quando abriram os trabalhos, as bancadas teriam no máximo um terço dos deputados. À medida que os vários oradores, do governo e dos partidos, tomavam a palavra, aquilo a que se assistia era o seguinte: dos escassos presentes, ninguém parecia estar a ouvir absolutamente nada; uns levavam o portátil e mandavam mails, outros falavam ao telefone, uns conversavam em pequenos grupos, alguns de costas viradas para o orador, outros liam tranquilamente os jornais: diários, desportivos, etc. Apenas interrompiam estas actividades para aplaudirem maquinalmente o orador do seu partido, voltando depois ao mesmo.
Foi só por volta do meio-dia que o hemiciclo se começou a compor e só então chegaram as figuras mais relevantes e as caras mais conhecidas dos vários partidos, com ar descontraído, palmadinhas nas costas e sorrisos cúmplices para os seus correlegionários. Foi por essa altura que a petição relativa ao Tibete começou a ser discutida. Quando a deputada do PS começou a apresentar o relatório sobre a situação no Tibete, elaborado a partir das reuniões que o grupo parlamentar dos Negócios Estrangeiros manteve connosco, o ruído das conversas era tal que ela teve de parar por duas vezes e o próprio Presidente da Assembleia, Jaime Gama, de pedir silêncio aos "senhores deputados". Sem qualquer efeito. O ambiente era igual ou pior ao de uma turma das mais indisciplinadas do ensino primário ou secundário. Em abono da verdade, ressalve-se que só a bancada do Bloco de Esquerda e do Partido Comunista mantinha relativamente maior silêncio e compostura.
Após a apresentação das várias matérias em debate, nestas circunstâncias de total alheamento e desrespeito mútuo, ia-se seguir a votação.
Levantei-me e vim-me embora. Estava elucidado e só pensava que, após dois mandatos de quatro anos nesta vida, saem de lá com belas reformas para sempre.
Estou esclarecido sobre o estado da nação, espelhado no seu Parlamento, que deveria ser-lhe exemplo. Só pergunto, a mim e a vocês, se são estes os nossos representantes, se são estes que queremos como representantes. É isto democracia, partidocracia ou mediocrecracia? E o que fazemos?

terça-feira, julho 15, 2008

Miséria

O noticiário sobre os acontecimentos da Quinta da Fonte é ainda mais triste do que os factos propriamente ditos.
O Governo, atarantado, assegura que vai tomar todas as medidas necessárias. À evidência, nota-se que não tem ideia nenhuma sobre quais sejam essas medidas. Tenta gerir a crise, e esperar que passe.
Parece-me que intimamente a raiva vai toda para o autor do video: ai, se o apanhassem a jeito...
A oposição não faz nem diz melhor. Ouvem-se as banalidades da vulgata sociologico-compreensivista.
Na rua, ao contrário, fazem sucesso as barbaridades de taxista avinhado.
Entretanto, pelas últimas começa a verificar-se que, deixando-se ir ao sabor da corrente, as autoridades preparam-se para oficializar uma política de apartheid. Limpeza étnica institucionalizada. Bairro para pretos, bairro para ciganos. E subsídios para todos.
É a completa ausência de qualquer sentido de Estado, a capitulação e a cedência perante hordas que se organizam e pela força bruta tornam reféns parcelas da população, e do território nacional, assumindo desafiadoramente prerrogativas que têm que ser exclusivo da comunidade políticamente organizada.
Em troca de quê, a abdicação? A troco de uma acalmia temporária, uma aparência de ordem.
Esta gente que nos governa não tem emenda possível: ou foge antes disso, ou acaba com Portugal.

Purgatório das ideias

SIDA, lobby gay, aquecimento global, Idade Média, darwinismo.
São áreas demarcadas do pensamento único obrigatório.
Veja o que sobre isso escreve Manuel Brás, em Censura XXI.

segunda-feira, julho 14, 2008

Boff na estrada de Damasco?

Alertado pelas suas repercussões mediáticas, estive a ler o falado artigo de Clodovis Boff intitulado "Teologia da Libertação e volta ao fundamento".
Dirão alguns amigos que me arrisquei, e segui por maus caminhos, mas respondo já que não dei o tempo por perdido.
É um documento notável, que, partindo embora do proclamado intuito de ajudar essa "teologia" (a "voltar ao fundamento"), faz uma arrasadora análise do que, desde a raiz, inquinou esse movimento pretensamente "teológico"; e não se poupa nas conclusões sobre a "inversão", apontada claramente e com todas as letras.
Deppois do que fica escrito por Frei Boff, não é possível ler sem um sorriso as suas referências aos "bons frutos" ou aos "ganhos inegáveis" dessa "inversão"; nem se descortina como será possível garantir-lhe um futuro.
Ao ler o que li, transportei-me para uns vinte e cinco ou trinta anos atrás - lembrei-me o que diziam e escreviam nessa época Frei Clodovis Boff e o seu famoso irmão Leonardo, e mais toda a legião dos seus sequazes - e que distância, meu Deus!
Não estaremos ainda perante uma conversão completa, e perfeita (e talvez que as conversões não surjam nunca assim, completas e perfeitas). Mas alguma coisa encontrou Frei Boff, que nunca tinha encontrado antes.
Compreendi perfeitamente os ataques, perplexos e desorientados, que apareceram de imediato, mesmo, e sobretudo, de Leonardo Boff.
Deus queira que Clodovis Boff prossiga na sua estrada de Damasco - para que se consume a sua iluminação, e todos nos possamos alegrar, "na felicidade dos pobres, na glória de Deus e na confusão do diabo". (Boff já acredita no Diabo!).

FALTA DE VERGONHA

(um artigo do General Garcia Leandro)

O modo como se tem desenvolvido a vida das grandes empresas, nomeadamente da banca e dos seguros, envolvendo BCP e Banco de Portugal, incluindo as remunerações dos seus administradores e respectivas mordomias, transformou-se num escândalo nacional, criando a repulsa generalizada.
É consensual que o país precisa de grandes reformas e tal esforço deve ser reconhecido a este Governo (mesmo com os erros e exageros que têm acontecido).
Alguém tinha de o fazer e este Governo arregaçou as mangas para algo que já deveria ter ocorrido há muito tempo. Mas não tocou nestes grandes beneficiários que envergonham a democracia, com a agravante de se pedirem sacrifícios à generalidade da população que já vive com muitas dificuldades.
O excesso de benefícios daqueles administradores já levou a que o próprio Presidente da República tivesse sentido a obrigação de intervir publicamente.
Mas tudo continua na mesma; a promiscuidade entre o poder político e o económico é um facto e feito com total despudor.
Uma recente sondagem Gallup a nível mundial, e também em Portugal, mostra a falta de confiança que existe nos responsáveis políticos deste regime.
Tenho 47 anos de serviço ao Estado, nas mais diferentes funções de grande responsabilidade, sei como se pode governar com sentido de serviço público, sem qualquer vantagem pessoal, e sei qual é a minha pensão de aposentação publicada em D.R.
Se sinto a revolta crescente daqueles que comigo contactam, eu próprio começo a sentir que a minha capacidade de resistência psicológica a tanta desvergonha, mantendo sempre uma posição institucional e de confiança no sistema que a III República instaurou, vai enfraquecendo todos os dias.
Já fui convidado para encabeçar um movimento de indignação contra este estado de coisas e tenho resistido.
Mas a explosão social está a chegar. Vão ocorrer movimentos de cidadãos que já não podem aguentar mais o que se passa.
É óbvio que não será pela acção militar que tal acontecerá, não só porque não resolveria o problema mas também porque o enquadramento da UE não o aceitaria; não haverá mais cardeais e generais para resolver este tipo de questões. Isso é um passado enterrado. Tem de ser o próprio sistema político e social a tomar as medidas correctivas para diminuir os crescentes focos de indignação e revolta.
Os sintomas são iguais aos que aconteceram no final da Monarquia e da I República, sendo bom que os responsáveis não olhem para o lado, já que, quando as grandes explosões sociais acontecem, ninguém sabe como acabam. E as más experiências de Portugal devem ser uma vacina para evitar erros semelhantes na actualidade.
É espantosa a reacção ofendida dos responsáveis políticos quando alguém denuncia a corrupção, sendo evidente que deve ser provada; e se olhassem para dentro dos partidos e começassem a fazer a separação entre o trigo e o joio? Seria um bom princípio! Corrija-se o que está errado, as mordomias e as injustiças, e a tranquilidade voltará, porque o povo compreende os sacrifícios se forem distribuídos por todos.

domingo, julho 13, 2008

Centenário da República

Aproxima-se o centenário da revolução republicana que, não sendo uma data feliz, é uma data histórica e como tal será assinalada. Se para os seus devotos se trata de comemorar, para nós monárquicos e cidadãos livres trata-se tão só de rememorar.
Garantidos estão já discursos laudatórios e pomposas evocações: o regime celebrará a data do seu nascimento e a sua sobrevivência por um século. As comemorações oficiais não se debruçarão sobre a república proclamada em 5 de Outubro de 1910, mas sobre um regime idealizado e abstracto, sobre generosas intenções que se presumirão nos republicanos de 1910, e das quais os políticos comemorantes se pretenderão afirmar-se herdeiros.
Acontece que estas celebrações, pelos equívocos em que se sustentam, constituem uma oportunidade única de sobrepor alguma verdade histórica à propaganda oficial. Assim, beneficiando da democrática ferramenta de comunicação que é Internet, um grupo de cidadãos juntou-se com a intenção de desenvolver uma plataforma informativa online: www.centenariodarepublica.com
Visitem-nos com regularidade pois que por aqui vai correr muita tinta: é que nós queremos fazer história.

sábado, julho 12, 2008

Manifestação em frente da Embaixada da China

É necessário continuar a agir:
Para chamar a atenção para o desrespeito pelos direitos humanos na China, pese embora os compromissos assumidos, a Secção Portuguesa da Amnistia Internacional, vai realizar uma manifestação em frente da Embaixada da República Popular da China, na Rua de São Caetano, 2 (à Lapa), em Lisboa, na próxima 2ª feira, dia 14 de Julho, entre as 18 e as 19h 30mn.
Serão exibidas 16 faixas carimbadas e assinadas pelo público de várias cidades de Portugal, encimadas pelas seguintes frases, em mandarim e em inglês:
Fim das execuções (Stop executions)
Julgamentos justos para todos (Fair trials for all);
Respeito pelos direitos humanos (Rights respected)
Fim da censura (Freedom from censorship)
Finda a manifestação, as faixas serão enroladas e tentar-se-à entregá-las na Embaixada.

http://grupodeapoioaotibete.blogspot.com/2008/07/manifestao-frente-emb-da-rpc-14-julho.html

quinta-feira, julho 10, 2008

Em Vila Nova de Gaia: inauguração da RUA DE OLIVENÇA

Por iniciativa do Senhor Presidente da Junta de Freguesia de Canidelo, no âmbito das Festas locais, com o apoio da Câmara Municipal de Vila Nova de Gaia e a colaboração da Delegação do Porto/Gaia do Grupo dos Amigos de Olivença, será inaugurada no próximo dia 12 de Julho, na localidade, a Rua de Olivença.
Contamos com a presença de todos os associados e amigos, bem como de todos os que lembram e defendem a portugalidade de Olivença.
A cerimónia está marcada para as 10 horas, com intervenções dos Presidentes da Delegação Porto/Gaia do GAO e da Junta de Freguesia de Canidelo.
Grupo dos Amigos de Olivença
www.olivenca.org

Esquerda, Direita, e troca o passo

"Ser de esquerda, hoje, é recusar a normalização imposta pelas ideias únicas, "objectivas", que se apoiam na antinomia: modernização mundial, ou o caos."
Quem o escreve é José Gil, na "Visão" de hoje, 10 de Julho de 2008.
Recusar a "normalização"? As "ideias únicas"? O dilema "modernização mundial ou o caos"?
Isso é ser de esquerda?
Estes filósofos estão a deixar-me um bocado baralhado.
Palavra que eu estava convencido que tais posições eram, precisamente, as da direita.

quarta-feira, julho 09, 2008

Lembrando Orwell, e 1984

A People's History of American Empire, by Howard Zinn



http://howardzinn.org/default/

http://www.tomdispatch.com/

Vauban, património universal

Segundo li na imprensa francesa, o comité do Património Mundial da UNESCO, composto por representantes de 21 países, anunciou no passado dia 7 de Julho, além do mais, a inclusão na sua lista de doze fortificações construídas no século XVII pelo arquitecto militar francês Vauban (1633-1707).
O comité de especialistas reúne-se uma vez por ano para analisar e escolher as candidaturas que lhe são presentes, em função do seu "excepcional valor universal" e do seu plano de protecção.
Todas as construções reconhecidas como património mundial ficam situadas em território francês; todo o trabalho da promoção da candidatura foi da responsabilidade dos interessados franceses. Compreende-se.
Todavia, para um eborense, mesmo adoptivo, não é possível deixar de recordar que se há um sítio no mundo em que o perfil urbano de uma cidade foi decisivamente marcado por Vauban esse é notoriamente Évora. Todavia, nem os franceses parecem querer conhecer a presença de Vauban em Évora nem os responsáveis eborenses parecem conhecê-la efectivamente.
Pelo contrário, tendo em conta as orientações consagradas no novo e extraordinário estudo/projecto/plano da ParqueExpo, apresentadas a público em recentes reuniões muito participadas, é razoável recear que as fortificações de Vauban, juntamente com a muralha fernandina, sejam o principal inimigo a considerar no formidável desígnio de apagar a distinção entre cidade intra-muros e extra-muros... É ver o verdadeiro frenesim de apagamento do tal traço distintivo que enforma o aluvião de propostas trazidas aos perplexos eborenses (e que já é bem patente nalgumas empreitadas recentes, e noutras em curso, todas dispostas em anel, pelo interior e pelo exterior do recinto amuralhado, esforçando-se por amesquinhar, esmagar, ocultar, sobrepor-se a tão horrenda herança).
Por entre as novas rodovias e ciclovias, e a ânsia de ocupação dos espaços não edificados, não me espantaria que ainda surgissem uns projectos vanguardistas de construção de imóveis para habitação em cima dos baluartes. São lugares com muito boas vistas, e, com uns traços futuristas, umas torres coloridas e muito envidraçadas em cada baluarte, à roda da cidade, conseguia-se indiscutivelmente deixar uma marca original a assinalar para a posteridade estes nossos desvairados tempos.
"Planos de protecção", imagine-se, diz a UNESCO... O que é preciso é enquadrar e engolir tudo na malha urbana, fazer desaparecer essa ignóbil diferença entre a cidade intra-muros e extra-muros... (Ai de mim, parece-me que a especificidade eborense reside precisamente nesse carácter único que lhe confere a permanência de uma cidade intra-muros, preservada e claramente delimitada e personalizada, num conjunto único e harmonioso, cuja fronteira visível, que cumpria sublinhar e valorizar, está exactamente na cerca medieval, com os acrescentos que lhe foram justapostos pelos conflitos de épocas posteriores, como a de Vauban). Ainda por cima o trabalho de Vauban traz em si a recordação de um período obscurantista, em que os portugueses se batiam pela continuidade e independência da Pátria, preocupação nada condizente com esta era avançada e cosmopolita.
Não tenho esperanças de ver seguida a perspectiva da minha preferência (durante algumas décadas foi, através de um trabalho coerente e sistemático, que deu à cidade aquilo que ela ainda tem).
A propósito de Vauban, tenho a impressão que a única lembrança dele que se encontra na urbe eborense é um restaurante, mantido pela EPRAL para aprendizagem dos seus alunos. Os mais curiosos, que reparam no nome, devem pensar que se trata de algum cozinheiro famoso.

Cuando salí de la habana, válgame dios...


Placido Domingo canta "La Paloma" (escolheu a letra original, válgame Diós...)

La Paloma


Bette Davis, e em fundo "La Paloma". A canção de Iradier está a caminho dos 150 anos!

terça-feira, julho 08, 2008

Aranjuez


Joaquin Rodrigo, e Paco de Lucía. Sublime.

segunda-feira, julho 07, 2008

Metropolis


Versão original de Metropolis descoberta em Buenos Aires: foram encontrados 20 minutos perdidos de um filme que entrou para a história do cinema como uma obra-prima absoluta. A versão original de Metropolis, a visionária ficção científica que Fritz Lang realizou em 1927, que não é vista desde a estreia em Berlim e se julgava perdida para sempre, acaba de ser descoberta em Buenos Aires.

domingo, julho 06, 2008

Rocío Jurado- Estudiantina Portuguesa

CELIA GÁMEZ - ESTUDIANTINA PORTUGUESA


Ay Portugal por qué te quiero tanto!!!

Heidegger speaks

Histoire de Tintin


sábado, julho 05, 2008

Defesa dos povos indígenas

actualidades educativas

Os testes de Português podiam ser substituídos por uns papeluchos como os do Totobola , por Maria Filomena Mónica.
(Sobre o prodigioso milagre da Matemática não recomendo nada, porque os milagres não são para compreender: ou se acredita ou não se acredita)

Sobre Salazar

Um ensaio de Nuno Rogeiro:

Salazar, grande e pequeno -1
Salazar, grande e pequeno -2
Salazar, grande e pequeno -3
Salazar, grande e pequeno -4
Salazar, grande e pequeno -5

Música e poesia

Canções do Movimento Nacionalista - a voz de José Campos e Sousa, versos de Diogo Pacheco de Amorim, José Valle de Figueiredo, António Manuel Couto Viana, Jorge Nogueira. Lembrando ainda Manuel Sobral Torres e Miguel Seabra.
Requiem por Jan Pallach - aqui o poema de José Valle de Figueiredo surge na voz de Manuel Rebanda (este está de parabéns pelo recente prémio em S. Petersburgo). Uma oferta do blogue de Manuel Varella.

sexta-feira, julho 04, 2008

Canto XLV (With Usura)

Ezra Pound

A MA

Da navegação vária se recolheu
o porto e o abrigo, de tão longe ansiados,
da procelosa vaga colhido
após tormentas e angústias diversas,
eis quantas alegrias aqui, quantas agruras,
quantas porfias de tanta caminhada;
da variada sorte cresceram cantos e versos aqui deixados plea manhã,
vindos ao lugar pacífico e sereno;
dessa deusa porfiosa e fasta
se deu à terra o barco
e a própria vida; nada infelice
se criou o lugar de que se disse,
após tanta viagem temerosa,
que seria o mais feliz e propício:
e se à própria vida chegou nesta praia primitiva,
foi à vida que veio a morte
tão antiga e tamanha, e tal sorte.


José Valle de Figueiredo, O Provedor de Vivos, Lisboa, 1988

Descobrimento

Na imagem de um rio chinês
busco a água de tanta mágoa:
um verso de cada vez
vem ao poema como um navio
que vai ao largo e não volta mais.
Uma orquídea exilada
de um outro espaço
pousa ao pé desta casa:
dir-se-ia que um sábio antigo
abriu, passo a passo,
o que há tanto se encobriu.

José Valle de Figueiredo, O Provedor de Vivos, Lisboa, 1988

quinta-feira, julho 03, 2008

A violência só vem depois...

(escrito para o semanário regionalista O Almonda, de Torres Novas)

Se tentarmos fazer esse exercício de imaginação, rapidamente concluiremos que é muito difícil encontrar uma burrice que seja tão grande, tão grande que nunca tenha encontrado defensores dos mais ilustrados e brilhantes. Sobretudo, entre os especialistas.
Pensei isto, mais uma vez, ao deparar com as considerações de um especialista em violência escolar, tema que está agora em congresso (problema “complexo” e “multidimensional”, já se sabe).
Perguntado sobre as raízes do problema, explica o especialista:
Apontaria em primeiro lugar as características físicas e arquitectónicas das escolas em relação à qualidade e conforto de espaços formais e informais, em segundo lugar a qualidade do projecto pedagógico de cada escola em paralelo com uma boa supervisão dos alunos e finalmente a existência de projectos de intervenção centrados na diminuição da violência (vítimas e agressores).
Ficamos esclarecidos. Mudem-se as características físicas e arquitectónicas, criem-se comissões que redijam magníficos projectos pedagógicos e projectos de intervenção, e as escolas que actualmente produzem delinquentes e analfabetos passarão a ser um alfobre de santos e sábios.
Da mesma escola de pensamento devem ser os especialistas do Ministério da Justiça, que anunciaram ao mundo com espavento um portentoso programa de construção de um novo parque prisional. São as futuras prisões-hotéis, construídas de raiz, com muitas actividades de lazer, salas de cinema, bibliotecas recheadas, campos de futebol, salas de aula, espaços autónomos para visitas de amigos, famílias e advogados, e ainda unidades para os casais, recluso e cônjuge, de forma a terem mais privacidade. Daqui a muitas centenas de milhões de euros sairão dali só ex-reclusos ressocializados e integrados, cidadãos tão exemplares como se andassem na juventude socialista desde pequeninos.
Sobre a violência nos tribunais, assunto que explodiu por estes dias (e que receio fundadamente poder ainda dar muito mais que falar, quanto mais não seja pelo efeito de imitação que o destaque noticioso geralmente provoca) o tom dos especialistas ouvidos também se inclina muito para as condições de segurança dos tribunais, os espaços físicos em que funcionam, os edifícios, a vigilância, os equipamentos, a polícia. Não são, obviamente, questões menores. Mas não é certamente por aí que se explica o aparecimento da violência nesses locais. É fácil percorrer muitas dezenas de tribunais, de um extremo a outro do país, sem nunca encontrar nenhum que tenha as agora faladas “condições mínimas de segurança”. Nem mínimas nem máximas: nunca tiveram nenhumas. Seguindo por aí, fechavam todos. Os tribunais sempre foram locais de acesso inteiramente livre, sem qualquer constrangimento, onde todos podiam entrar e deambular à vontade, desde as salas de audiência às secretarias, desde as áreas destinadas ao público até às destinadas aos magistrados. Só há poucos anos começaram a surgir, em uns poucos, alguns típicos sinais dos tempos: polícias à entrada, detectores de metais, uns resguardos e separadores envidraçados... Mas isso é ainda exclusivo de dois ou três, em Lisboa e no Porto. Em regra mantém-se tudo por todo o lado como desde tempos imemoriais: de dia entra quem quer, e vai para onde quer, e de noite só não vai lá quem não quiser (basta normalmente um leve encontrão numa porta ou numa janela, caso esteja fechada).
Em nenhuma repartição ou organismo público é observável semelhante ausência total das, agora faladas, “condições de segurança”.
E - concluo agora com aquilo que tinha aqui guardado para dizer - a verdade é que não eram precisas. Por piores que fossem as instalações, por nulas que fossem as precauções de segurança. Nunca acontecia nada. (Facto que, a meu ver, constituía um bom motivo para congratulação e orgulho).
Não eram necessárias, essas preocupações de segurança. Agora, como resulta de tudo o que se vai sabendo, parece que são mesmo. O que mudou, evidentemente, em nada se relaciona com as realidades focadas nos discursos dos especialistas. Por esse caminho poderão conter-se ou atalhar-se as manifestações mais óbvias da doença. Mas o mal (este mal) está bem a montante, muito a montante.

Manuel Azinhal
manuel.azinhal@gmail.com

quarta-feira, julho 02, 2008

Um sentido para o capitalismo

(com a devida vénia, reproduzo o mais recente artigo de Manuel Brás, um dos mais seguros valores das novas gerações, de entre os que têm surgido a pensar a política)

Os últimos meses têm sido terrivelmente reveladores de que, afinal de contas e ao contrário do que alguns pensavam, nem o mundo, nem o capitalismo, nem o mercado são perfeitos. Basta recordar o subprime, a juntar aos terríveis aumentos de combustíveis e de alimentos, que os mais modernos modelos económicos não conseguiram prever. Quem diria?
Porém, não tenhamos dúvidas nem ilusões.
Se o capitalismo e a economia de mercado não são perfeitos, muito menos o é a economia socialista, dirigida e aporreada pelo Estado. Se vivêssemos numa economia planificada pelo socialismo científico, isto já tinha estoirado, como estoirou a economia socialista do leste sovietizado, sem os americanos dispararem um tiro. Em termos económicos, e só nesses, aquilo caiu tudo sozinho.
O capitalismo, como sistema, tem um grande defeito: quem não tem um mínimo de capital fica fora do sistema. Mas tem uma grande vantagem: uma flexibilidade e plasticidade que permitem a adaptação da economia e do mercado às mais adversas condições, ao contrário da rigidez da economia socialista. O que é rígido tende a partir.
É tarefa da política, não da economia, dar um sentido ao capitalismo e ao mercado, sem o qual se podem tornar cegos. A economia é uma ciência autónoma, que tem as suas próprias e legítimas ferramentas, que podem ser postas ao serviço deste ou daquele sentido, desta ou daquela política. Depende do que se quer.
São os agentes da sociedade civil, que intervêm na acção política, desde a pessoa, passando pela família, pelos municípios, aos grupos profissionais e culturais, que devem orientar e dar um sentido à economia, com primazia em relação ao Estado. Primeiro, os intervenientes da sociedade, e por fim, o Estado, de forma subsidiária, na medida e naquilo em que a sociedade civil, pelos seus meios, não puder cumprir. Política e sociedade civil não são o mesmo que Estado, que deve ser mínimo. É aqui que está a grande diferença entre a nova direita e o socialismo.
A direita tem ideias para a sociedade. A direita é social: contra o estereótipo absurdo de que a direita se ocupa da economia e a esquerda das questões sociais. Aí estão os resultados das políticas sociais de esquerda nas últimas décadas.
É à direita que incumbe fazer com que a sociedade civil funcione com liberdade e responsabilidade, com que o capitalismo e a economia de mercado funcionem de maneira a que o todo valha mais que a simples soma das partes, com que a sociedade, preferencialmente pelos seus meios, integre de forma orgânica todos os seus elementos.
Faz parte, pois, de uma agenda social de direita:

1. Alertar os portugueses que não vão enriquecer com os subsídios da UE e desencorajar a confiança no lucro fácil.
2. Valorizar o trabalho, o mérito, o empenho em iniciativas da sociedade civil, como formas de crescimento económico e social e de vencer as dificuldades.
3. Harmonizar o trabalho e o capital, como duas forças interdependentes e absolutamente necessárias para a sociedade, ao invés de as considerar como antagónicas.
4. Defender os direitos de propriedade privada e que deles decorrem responsabilidades e uma função social.
5. Reduzir o peso do Estado ao mínimo: o que a sociedade na sua organização puder fazer, não faz o Estado.
6. Privatizar gradualmente os sectores da educação – introduzir o cheque- ensino – e da saúde.
7. Estimular e orientar os empresários (agrícolas, industriais, do sector terciário) para investimentos nas actividades económicas mais apropriadas, em especial no interior do País.
8. Choque fiscal: diminuição de impostos (IVA, IRC, IRS, ISP, taxas…)
9. Política de apoio à família e maternidade: há muitas formas de pôr em prática este tipo de políticas, e não apenas uma, limitada à rigidez de uma lei geral. Algumas dessas formas são a agilização de horários laborais compatíveis com a atenção aos filhos, a equiparação da atenção doméstica dos filhos a uma profissão com as suas particularidades, o desagravo fiscal às famílias numerosas, maiores deduções em despesas familiares (educação, saúde, etc…)
10. Alertar os portugueses de que a nossa sobrevivência colectiva está em perigo, estreitar o contacto com os emigrantes portugueses e estancar a saída de “cérebros” para o estrangeiro.

DARWIN´S EVOLUTION THEORY DISPROVED WITH SCIENCE

A rã sem pernas não ouve

Alguns leitores já conhecerão a história, mas não resisto a contá-la aqui.
É aquela do menino que aspirava a ser cientista, e levava muito a sério essa sua vocação. Vai daí iniciou um estudo sobre o comportamento das rãs. Treinou uma a obedecer a comandos simples. Concretamente, dizia-lhe para saltar, e ela saltava. E ele tudo apontava no seu caderninho, como investigador cuidadoso e metódico. Confirmou repetidamente os resultados: sempre que ele gritava “salta!”, o animal invariavelmente obedecia e dava um saltinho. Prosseguindo a experiência, resolveu arrancar uma perna à rã. Depois voltou a fazer a experiência: ordenou-lhe que saltasse, e ela lá saltou, embora não com a ligeireza e prontidão anteriores. Continuando, o jovem investigador arrancou segunda perna à rã. A seguir transmitiu o comando habitual: “salta!”. O bicho, desajeitadamente, lá conseguiu dar um impulso para a frente - e saltou. Em prol do conhecimento e da ciência, o rapaz arrancou então terceira perna da rã. E de novo lhe gritou que saltasse. A pobrezinha, em sofrimento, agitou o corpo, fez força na pata restante, e ainda deu um trambolhão para a frente. Nesta altura o promissor cientista atingiu o auge da emoção: tirou a última das pernas da rã. Depois, insistiu no teste: “salta!”, salta!”. Porém, por mais que ele gritasse, o infeliz batráquio limitava-se a arfar, na sua respiração dolorida, mantinha o olhar vítreo e inexpressivo, e permanecia imóvel. Imóvel de todo.
No caderninho das observações o sábio aprendiz exarou então a conclusão: “a rã sem pernas não ouve”.
Ocorreu-me esta anedota a propósito da divulgação agora feita pelo Ministério da Justiça do Relatório da Monitorização dos primeiros seis meses de vigência da pomposamente chamada “reforma penal” (o conjunto de alterações avulsas introduzidas nos Códigos Penal e Processual Penal).
O relatório, da responsabilidade do inevitável Prof. Boaventura, veio confirmar prolixamente aquilo que era por demais e se podia dizer com poucas palavras. Em síntese, que as alterações nada trouxeram que beneficiasse o funcionamento dos tribunais ou o andamento dos processos. Que as modificações introduzidas se traduziram num aumento desmesurado dos direitos dos arguidos, e na correspondente diminuição das garantias das vítimas. Que as exigências consignadas no que respeita v. g. a segredo de justiça, a intercepção de comunicações e a prazos de investigação inviabilizam qualquer inquérito que ultrapasse em complexidade o furto da galinha da vizinha ou em que o visado tenha estatuto social e económico um pouco acima de um qualquer zé ninguém.
E que em resumo o único objectivo realmente alcançado da famosa reforma foi o esvaziar das prisões. Em primeiro lugar porque as polícias, altamente limitadas a esse respeito, prendem muito menos; em segundo lugar porque os juízes, pressionados por exigências legais desenhadas para obstar a essa medida, aplicam muito menos a prisão preventiva; e em terceiro lugar porque os condenados alcançam a liberdade condicional mais cedo e com muito mais facilidade, saindo das cadeias a partir do meio das penas que lhes foram impostas em julgamento.
Em concreto, informa o relatório que nestes seis meses o número de prisões preventivas aplicadas desceu 30 % em relação ao semestre anterior, e que as situações de liberdade condicional aumentaram em 65%. Não refere o documento, porque isso não se consegue saber, quantas detenções deixaram de ser efectuadas pelos órgãos de polícia criminal, porque fora de flagrante delito isso lhes é quase impossível, e mesmo em flagrante delito o zelo se lhes afigura muito provavelmente inútil.
Temos assim, como único efeito desejado e proclamado da obra que o Ministério obrou, uma notória diminuição do número de presos nas cadeias portuguesas no período de tempo em referência.
Receio muito que o Ministério da Justiça conclua triunfante que a criminalidade desceu substancialmente no período em questão.

terça-feira, julho 01, 2008

Vendas Novas, 29 de Junho: o Dia do Combatente



http://ultramar.terraweb.biz/index.htm

Da negação ao descobrimento

Ou a ruidosa conversão de um filósofo ateu:

entrevista com Anthony Flew.

(aqui en español)

Che bella cosa!

O triunfo da reciclagem?

Um comentário de António Bastos a propósito do aparente triunfo da reciclagem:

"Um artigo assustadoramente objectivo de Hitchens. O democratismo ocidental gera a patologia do politicamente correcto e a concomitante empatia pelo comunismo o que por sua vez permite a existência do "comuna reciclado". O comunismo apesar de morto como regime continua intocável e inatacável. O anti-comunismo é, ainda hoje, um tabu. Repare-se, a titulo de exemplo, na forma embevecida e ridícula com que os media nos mostram aquele "velhinho simpático" do Fidel. Quando veremos nós filmes sobre as horrorosas purgas estalinistas dos anos 30, ou sobre os goulags?"

O comuna reciclado

Detectando um dos fenómenos capitais destes tempos que correm:

Ando há uns tempos a tentar escrevinhar alguma coisa sobre o fim do comunismo e sobre o elemento essencial deste mundo pós-comunista que reside no “comuna reciclado”. Quase todos os que governam a Europa lá andaram em maior ou menor conluio, durante mais ou menos tempo. Compreender o que é que mudou nas suas mentes e que reformulações dos seus quadros conceptuais sofreram, é o grande trabalho para os sociólogos dos próximos vinte anos.


Ler mais, n'O Pasquim da Reacção.

Tratado de Lisboa tem sido conduzido “no isolamento e no secretismo”

Em entrevista exclusiva ao novo semanário REGISTO, conduzida por Vitório Rosado Cardoso, o Prof. António Marques Bessa, catedrático do Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas aborda as crises europeia e nacional, no rescaldo do referendo irlandês ao Tratado de Lisboa.
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Autor de obras de referência nacionais e internacionais no campo da Ciência Política, especialista dos estudos da Geopolítica e das Elites, António Marques Bessa tem nos últimos anos lançado diversos “avisos” à classe política portuguesa e ao rumo dos negócios entre Portugal e o Mundo.
“Quem Governa - Uma análise histórico-política do tema da Elite”, “A Arte de Governar”, “Introdução à Política” ou “Introdução à Etologia - A nova imagem do Homem” são algumas das suas obras, que têm servido de referência no estudo e investigação da Ciência Política em Portugal.
No rescaldo da vitória do “Não” da Irlanda aoTratado de Lisboa e de possíveis consequências e impactos para o processo da construção europeia, o catedrático alerta para o que diz ser a “preparação” de um “Governo estrangeiro” para Portugal, num momento em que se comemoram os 200 anos da vitória luso-britânica na Guerra Peninsular.
Sempre que o tema da integração europeia é focado a questão peninsular ou luso-espanhola acaba por ser referenciada. António Marques Bessa acredita que “a Espanha não deve ser nem uma preocupação nem uma barreira”, mas critica o primeiro-ministro quando “lhe deu na ideia de falar espanhol, mostrar que sabe falar castelhano”.
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Que impacto para Portugal se o Tratado de Lisboa entrar em vigor?
A classe política portuguesa tem conduzido este processo sozinha, no isolamento e no secretismo. Parece que têm medo do povo. E com razão. O povo, em Portugal, costuma corrigir os desvarios da sua classe dirigente. O melhor é fazer tábua rasa do povo e depois elogiar muito as decisões populares, ou seja, dos representantes de ninguém. Os impactos só se podem ver no futuro mas para um país de dez milhões de pessoas, sem recursos, descapitalizado, sem alimentos, que poderemos esperar? O governo do estrangeiro. Os britânicos vivem o seu complexo de ilha coroada, de ilha imperial, não estão dispostos a agachar-se.
Faz então sentido a denúncia de Nigel Farage sobre o totalitarismo “à soviética” da União Europeia?
Eu denunciei já há muito tempo a formação de uma classe política de eurocratas. É o começo da consolidação de uma nomenclatura de funcionários bem pagos que nada querem saber dos cidadãos. A cidadania diminuirá e os privilégios da nomenclatura aumentarão.
O esquema europeu baseado em altos e médios funcionários não vai a lado nenhum. A não ser ao marasmo, para onde já se inclina. Não basta ser entusiasticamente europeu. É preciso saber onde termina a Europa e quem é que lhe vai dar estrutura, ou seja, coluna vertebral. Porque ainda lhe falta muito para a ter.
Os povos continuam a responder pelas suas identidades de modo que não há nacionalismo europeu, a não o ser o sentimento europeu muito presente no pessoal político, a quem o assunto interessa.
Haverá algum paralelismo com os ideais Pan-Europeístas de Napoleão de há 200 anos?
Napoleão quis criar um Império continental de Lisboa a Moscovo e São Petersburgo, do Canal ao sul da Itália. Hoje as coisas são semelhantes: sem perspectiva marítima a Europa veste khaki, aposta pouca na construção marítima e na navegação. Os navios de transporte fogem às suas bandeiras e são construídos no Oriente. Os três maiores portos do mundo estão na China.
Admira-me que os Estados europeus, exceptuando o Reino Unido, a França e a Itália, só se ocupem em controlar mares locais e costas, como se tivesse desistido do “sea power”.
Os países com alguma tradição marítima não têm condições para a impor na União. Terão de vestir khaki à força porque a política pública estará alinhada com a política da Comunidade.

Sendo assim, existem ainda os chamados atritos ou conflitos entre países de visão e vivência maritimistas e continentalistas?
Não. Existem países que ainda se estão a continentalizar e organizar internamente como a Rússia, a China, o Brasil e países que ultrapassaram essa fase e se envolveram em fortes actividades marítimas de Guerra e Comércio como é o caso dos Estados Unidos, da Inglaterra e da França. Os Países do Oriente tornaram-se grandes construtores navais sem maritimidade suficiente, mas hegemónicos em termos de comércio marítimo. É preciso lembrar que mais de 90 por cento dos bens segue a rota marítima. A UE ainda não percebeu o problema e continua a apostar nos caminhos-de-ferro, estradas e aeroportos. Numa península totalmente rodeada por mar, cheia de ilhas, isto é verdadeiramente um paradoxo.
Que soluções para Portugal? Qual o actual estado da geopolítica portuguesa?
Para Portugal, infelizmente, já passou o tempo de tomar decisões. Mas a sua elite política é claramente continentalista. Nem vale a pena apontar-lhes o velho caminho do mar. Não o compreendem.
Nos dias que correm fazem ainda sentido termos como soberania, independência e nacionalidade?
Só para alguns. Não faz sentido para os funcionários e eurocratas, isto é, para a nomenclatura. Irá fazendo sentido para cada um, a seu modo, na medida em que perceba a terra dos mortos e a comunidade de sonhos.
Sobre as elites, como analisa as opções dos actuais líderes europeus como parte integrante de uma “elite” Haverá alguma contra-elite? E no caso português?
As contra-elites morreram de cansaço ou esconderam-se de vergonha. Desgastaram-se em embates sem sentido por toda a Europa culta. Aqui também. Ou entraram no “grande sistema” como fizeram os comunistas, bloquistas e quejandos ou não conseguiram entrar, mas porque não conseguiram votos para um deputado. A vontade geral dos potenciais representantes do povo representado é estar visível.
A elite faz como Ernst Junger recomendou: retira-se para a floresta. E aqui também. A floresta pode ser um convento, uma universidade, uma Misericórdia, um Hospital, o campo de Vale de Lobos, as serras de Torga, o País dos Uvas de Ramalho, a Terra dos Hobbit de Tolkien, A Costa Negra de Conan o Bárbaro, as Escarpas de Mármore de Junger, e assim por diante.