domingo, novembro 30, 2003

Mário Beirão

Neste Domingo que antecede o 1º de Dezembro, lembrei-me de Mário Beirão. Lembrei-me de outros primeiros de Dezembro em que saíamos pelas ruas da cidade cantando versos de Mário Beirão.
Foi esse o pecado de Mário Beirão, o pecado sem perdão que o condena para sempre à maldição e ao esquecimento – escrever aqueles versos ... Poucos poetas terão pago tão alto preço pr um poema!
Em Beja, onde ele nasceu e que ele amou, venera-se o saramago, rasteira erva daninha que traiçoeira se enrola no caule do trigo, com as suas pequenas folhas ásperas e furtivas flores brancas a ocultar o vermelho do ódio.
Não se lembra o poeta maior do Baixo Alentejo, que esse escreveu para a mocidade a sua marcha.
Mas que importa – se não for amanhã será depois de amanhã, alguém irá descobrir os livros escondidos. E das páginas de “O último Lusíada”, “Ausente”, “Lusitânia”, “Pastorais”, “A noite humana”, “Novas estrelas”, “Mar de Cristo”, “O pão da ceia”, “O oiro e a cinza”, sairá vibrante o cântico que ele sonhou.
E pelas ruas das cidades soará a melodia que proclama “lá vamos, que o sonho é lindo,/ torres e torres erguendo,/ rasgões, clareiras, abrindo,/ alvas de luz imortal” ...
Hoje, em homenagem à sua terra, fica aqui um poema de Mário Beirão dedicado aos cantadores do Baixo Alentejo.

MODA ALENTEJANA
(Para os cantadores de Montes Velhos)

A ribeira do Xacafre
Vai rasa dos meus cuidados:
No escuro das águas tristes,
Há laivos ensanguentados...

Ó meus olhos, ó meus olhos,
- Noite e dia - que estais vendo?
A ribeira do Xacafre,
Da minha alma discorrendo!

Na ribeira do Xacafre,
Uma voz suspira fundo:
A voz da minha saudade,
A despedir-se do mundo!

Aldeia de Montes Velhos,
Não posso querer-te mais:
És a luz do sol-nascente,
Abrindo, em flor, nos meus ais!

Aldeia de Montes Velhos
És sempre luz de Alvorada
És sempre rosa de altar
Da chama de uma queimada!

Eu hei-de florir na urze,
Arder no vento suão,
Lá, na Charneca das Naves,
- Mar alto da Solidão!

A OLIVEIRA

"Naquele tempo - já não sei se na quarta classe da Instrução Primária se no primeiro ano do Liceu - todos nós aprendíamos a ter amor às arvores; a isso nos incitavam aqueles belíssimos versos de António Correia de Oliveira, que se incluíam nas selectas escolares e que assim começavam: "Ouve, meu filho: cheio de carinho,/Ama as árvores, ama” ...
Nas imediações das escolas e dos liceus não havia pois outro perigo moral que não fosse o tal jogo do “negus”; - em vez de traficantes de droga e de literatura “porno”, a clientela comercial que nos assediava era exclusivamente constituída por vendedores de gulodices, principalmente de intragável torrão de alicante. Destacava-se entre eles uma velhinha pequena e frágil, que nos vendia tremoços, amendoins, pevides e, supremo requinte, duríssimas pinhoadas; era tão pequena que agigantava qualquer de nós, mesmo os mais franzinos; todavia, mais do que a sua pequenez, mais do que a brancura imaculada dos seus bandós, mais do que o luzidio negrume das suas roupas de antiquíssima viúva, o que impressionava naquela figurinha era a espantosa vivacidade com que se movia, não obstante o peso dos cestos que a ajoujavam; era a sua extraordinária vitalidade.
Já em outro tempo - naquele em que se começa a ter ideias sobre a vida, as coisas e as pessoas - tomei conhecimento com o Largo da Oliveirinha e com a árvore que lhe dera o nome. O Largo era e é a meio da Calçada da Glória, encostado ao muralhão de S Pedro de Alcântara; a árvore, naturalmente, era uma pequena oliveira, quase anã, com um tronco rugoso a atestar-lhe a velhice, mas ainda com meia dúzia de ramadas cobertas de folhagem miudinha e esguia, naquele verde baço inconfundível. Velhíssima, sem dúvida, mas cheia de seiva.
Por qualquer misteriosa associação de ideias, a pequena oliveira da Calçada da Glória lembrou-me logo, simultaneamente, os versos que me exortavam a amar as árvores e a respeitosa admiração que me causava, à saída da escola, a velhinha vendedora de colares de pinhões. Enquanto por ali tive que passar quase todos os dias, a pequena oliveira da Calçada da Glória tornou-se-me querida - mais do que isso: tornou-se-me como que imagem de devoção no livro de horas lisboetas que eu começara a viver.
Muitos anos depois, ao voltar a descer ou a subir a íngreme calçada, tive o desgosto de ver que da pequena oliveira não restava mais do que um cepo, a oferecer-se como assento a quem vinha cansada da escalada; ou secara definitivamente ou alguém a havia decepado e morto; de qualquer modo, a velha oliveira, que reunira em si a memória de um poema e de uma vendedeira de pinhões, deixara de existir...
Isso julgava eu. Tornei há dias a passar pelo sítio. O que era um cepo voltou a ser uma árvore - uma velha o!iveirinha de que irrompem de novo as ramadas de miúda e esguia folha verde-cinza. Desde há muito eu sabia serem as oliveiras árvores que duram séculos (há quem diga que algumas das que se veneram em Jerusalém foram contemporâneas de Cristo), mas não calculava que fossem capazes de tamanha resistência. A oliveirinha da Calçada da Glória já não vale só, para mim, por me manter ligado ao amor às árvores e a uma longínqua recordação de infância. Vale, sobretudo, como lição de esperança.

O Recordador"


O texto acima foi publicado a 29 de Maio de 1980, no semanário “A RUA”, na coluna “Do passado ao presente”, de Abel Tavares de Almeida. Republico-o hoje porque de repente me surgiu como uma magnífica alegoria para este dia 1º de Dezembro.
E já agora, se me permitem a confidência, juro que também eu naquele Inverno de 1979 e Primavera de 1980 tinha observado com tristeza como por ocasião de umas obras menores ali realizadas o pessoal camarário tinha desnecessariamente reduzido a oliveirinha que dava o nome ao largo a um triste tronco decepado; e depois, meses corridos, continuando a subir e a descer o elevador da Glória, com súbita alegria constatei que a pequena oliveira reverdecia e alevantava ramos ao céu, mostrando-se vigorosa à gente que passava. Como no poema de Mário Beirão, o velho tronco em flor estendia os ramos, vivos e viçosos.
Haverá quase vinte anos que não vejo a Calçada da Glória, nem o velho elevador amarelo, nem o Largo da Oliveirinha. Não sei se a oliveira ainda lá está, ou se teve sumiço, vítima dalguma empreitada requalificadora.
Mas nunca mais esqueci a lição de vida e de esperança, como o Abel Tavares de Almeida.

1º de Dezembro

O Grupo dos Amigos de Olivença participará, como habitualmente, nas Cerimónias Oficiais do 1.º de Dezembro, em Lisboa (Praça dos Restauradores), às 16:00 horas.
A concentração será feita na sede, Casa do Alentejo, às 15:30 horas, de onde seguirá em comitiva para a Praça dos Restauradores.
Para que a Causa de Olivença tenha uma presença significativa, pujante e visível, é necessário que os sócios e apoiantes do GAO marquem presença no acto.
Olivença É Terra Portuguesa!

sábado, novembro 29, 2003

OS VENCIDOS DO CATOLICISMO

Simpatizo muito com João Bénard da Costa. É um homem culto, inteligente – e escreve bem, muito bem, o que nos tempos que correm é recomendação maior.
João Bénard é evidentemente de uma geração que coincide no tempo com a do meu pai, não tendo por isso comigo qualquer paralelismo de percurso, nem no aspecto temporal.
E os seus caminhos, como é notório, conduziram-no em direcções que não são as minhas.
Mas a sua geração interessa-me, desde logo pelo conjunto de talentos que reunia, e depois pelo itinerário pessoal e de grupo que os marcou.
Eles são os homens do catolicismo empenhado, numa primeira fase, de seguida são os intelectuais do progressismo católico, finalmente acabam praticamente todos como ex-católicos ...
Deixaram largo rasto, bastando lembrar Nuno Bragança, Ruy Belo, Nuno Teotónio Pereira, a “Moraes Editores”, “O Tempo e o Modo” ... a ligação a António Alçada Baptista, que também teve evolução pessoal semelhante.
A experiência mais marcante da vida mental e espiritual desta gente foi claramente a sua luta pela Fé, e a desistência dela.
Isso mesmo explicou Bénard da Costa numa sequência de textos que publicou no “Independente”, e que constituem um sincero e comovente relato desse itinerário pessoal e de grupo. Colocou-se então o autor sob a invocação de um poema de Ruy Belo, encarado como fiel retrato de uma geração perdida e desorientada, que aqui quero deixar como o depoimento deste, o poeta representativo do grupo.
Curiosamente, nesses textos memorialistas João Bénard pareceu-me deixar um desafio a D. António dos Reis Rodrigues, a quem os seus desde muito novos se habituaram a tratar apenas por “Sr. Dr.”, para que se explicasse, e os explicasse – a eles, que em tempos remotos tinham sido os meninos do sr. Bispo.
E tempos depois apareceu nas livrarias um livro de memórias do velho D. António dos Reis Rodrigues, que apesar da curiosidade ainda não tive oportunidade de ler. Não sei se em algum ponto responde às interrogações presentes no espírito de João Bénard.
Fica aqui o poema de Ruy Belo que João Bénard da Costa chamava implicitamente como também seu, e que é afinal de toda a geração dele – como homenagem minha, embora triste, aos “vencidos do catolicismo”.

NÓS OS VENCIDOS DO CATOLICISMO

Nós os vencidos do catolicismo
que não sabemos já donde a luz mana
haurimos o perdido misticismo
nos acordes dos carmina burana

Nós que perdemos na luta da fé
não é que no mais fundo não creiamos
mas não lutamos já firmes e a pé
nem nada impomos do que duvidamos

Já nenhum garizim nos chega agora
depois de ouvir como a samaritana
que em espírito e verdade é que se adora
Deixem-me ouvir os carmina burana

Nesta vida é que nós acreditamos
e no homem que dizem que criaste
se temos o que temos e jogamos
“Meu deus meu deus porque me abandonaste?”


Ruy Belo

Hino da Restauração

Portugueses, celebremos
O dia da Redenção.
Em que valentes Guerreiros
Nos deram, livre, a Nação.

A Fé dos Campos d’Ourique,
Coragem deu, e Valor,
aos Famosos de Quarenta,
que lutaram com Ardor.

P’rá frente! P’rá frente!
Repetir saberemos
As proezas portuguesas.

Avante! Avante!
É a voz que soará triunfal.
Vá avante, Mocidade de Portugal!

1º de Dezembro

No próximo dia 1 de Dezembro a Sociedade Histórica da Independência de Portugal promove em Lisboa as habituais cerimónias comemorativas da Independência de Portugal.
Pelas 16h00, concentração de homenagem aos heróis da Restauração junto ao Monumento dos Restauradores.
Pelas 18h00, missa solene de acção de graças na Igreja Paroquial de São Nicolau, na Baixa.
A direcção da S.H.I.P. conta com a participação de todos os sócios e amigos nas referidas iniciativas.

Quem faz injúria vil e sem razão,
Com forças e poder em que está posto,
Não vence; que a vitória verdadeira
É saber ter justiça nua e inteira.


Camões, Os Lusíadas, X, 58

Missas de rito tradicional latino-gregoriano

Domingos: às 11 horas.
Segunda-Feira a Sábado: às 19 horas.
Sempre no Priorado São Pio X, na Estrada de Chelas, 29-31 (junto à Avenida D. Afonso III), em Lisboa

AZINHAL ABELHO

Joaquim Azinhal Abelho nasceu em Orada, Borba, em 1916, e veio a falecer em Lisboa em 1979.
Licenciado em Filologia Românica pela Universidade de Lisboa.
Dirigiu o jornal de poesia popular “A Voz de Portugal” e foi um dos fundadores da revista “Mensagem”.
Publicou os seguintes volumes de poesia: “Solidão, ai dão, ai dão”; “Confidências de um Rapaz Provinciano” (com o qual ganhou em 1936 o Prémio Antero de Quental, do extinto Secretariado Nacional de Informação); “Epopeia Vulgar”; “Victorial”; “Canto Chão”; “7 Ex-Votos a Nossa Senhora”; “ABECEdário de Lisboa”; “Domingo Ilustrado”; “Eu Fui Guadiana Abaixo” e “Os Anjos Cantam o Fado”. Organizou e publicou ainda as antologias “Cancioneiro do Natal Português” e “Cancioneiro do Vinho de Portugal”.
Foi também um homem do teatro, quer do teatro erudito, a que se dedicou em Lisboa, chegando a dirigir companhia própria, quer do teatro popular tradicional, deixando obra de inestimável valor com a sua recolha “Teatro Popular Português”.
Também muito conhecido durante anos pela sua ligação às festas populares de Lisboa.
Já agora, para os eborenses que disso se lembram, também responsável pelos famosos cortejos históricos e etnográficos que durante anos animaram as nossas festas de São João. E para os estremocenses com boa memória, também foi ele importante estudioso e divulgador da tradição da barrística de Estremoz.
Dedicou parte importante da sua obra à evocação da sua terra; tem hoje um centro cultural com o seu nome em Nossa Senhora de Orada, sua aldeia natal (homenageada no livro “Os da Orada”).
Importante vulto da cultura portuguesa e alentejana do século XX, foi um exemplo vivo de um intelectual multifacetado, activo e interveniente no seu tempo, ao mesmo tempo erudito e popular, sempre tradicionalista e fiel às raízes.

FADO CRAVO

Em fala amena e discreta
Pediram a um poeta
Para definir a saudade...
Estavam à beira do Tejo,
Reflectia-se no rio
A luz fraca da cidade.

Aqueles três companheiros
Ficaram silenciosos
À espera duma resposta.
Disse o poeta, escrevendo:
Saudade - é amar sofrendo
O que findou e se gosta.

A noite parte-se em duas;
Ouvem-se os ecos tranquilos
Das águas em movimento;
E até das ruas desertas
Chega o mistério do silêncio
Terrível desse momento.

Ninguém mais disse uma fala
O guitarrista do grupo
Deu a resposta a tocar.
Caminharam altas horas
A sós, para que ninguém visse,
Que é feio um homem chorar.


Azinhal Abelho

sexta-feira, novembro 28, 2003

Antigos Alunos do Liceu Nacional de Évora

Atenção retardatários! Aproxima-se o tradicional convívio do 1º de Dezembro!
A organização do jantar e da ceia exigem confirmação antecipada.
Vejam todas as informações no site dos Antigos Alunos, e aproveitem para se inscrever.

PERMANECER PARA CRIAR

Seja onde for que se manifeste qualquer maioria abdicando ou abandonando as atitudes e as ideias justas, nunca renegaremos os nossos princípios nem nos desviaremos das nossas convicções. Entendemos que o cumprimento do dever possui uma importância primordial e que é indispensável manter um testemunho inteiro da verdade. Desdenhamos do relativismo, tão corrente e crescente onde seria de estranhar que ele se instalasse. Recusamo-nos ao extraordinário acervo de contradições, de desnecessários e duvidosos realismos, de pressurosas adaptações.
Consideramos que certas posições representam uma forma de fatalismo, uma submissão a quanto nomeiam de irreversível (com extensões e funduras espantosas). Assim, praticam uma justificação de tudo aquilo e contribuem, afinal, para solidificar o que seria desejável que não se tivesse instalado e que seria meritório fazer todo o possível para abalar e - quem sabe? - derrubar. Por falta de intransigência, de constância, de acorrer aos postos de combate e aí permanecer, cada um de vários ou de muitos instaura um clima de deserção, de tibieza, de abastardamento; em vez de, pelo contrário, aumentar, intensificar e expandir a firmeza, a fé e o espirito de sacrifício. No meio da descrença geral, vão desaparecendo e renunciando os que deviam ser inamovíveis focos de resistência e luta.
Queremos apelar aos nacionalistas, para que reflictam e mergulhem bem no íntimo propulsor dos actos maiores. Quem se corrige pauta-se pela regra; quem se pauta pela regra regula-se; quem se regula torna-se semelhante ao rei e propriamente um rei.
Confessar um erro e emendar-se dele é nobre. Perseverar no erro é diabólico. Quando o espirito está afectado, a epidemia grassa: eis a porta aberta à morte e à possessão.
Em lugar do pequeno maquiavelismo, do jogo da alta-baixa política, preferimos a irredutibilidade dos que querem permanecer na honra, iguais a si mesmos e ao que os ultrapassa, ao que foi timbre e herança do passado e que cumpre transmitir ao futuro; como depositários, guardando as sementes e, na medida total das nossas capacidades, deitando-as à terra que laborarmos.
Afirmamos ainda que esta atitude de idealismo e de pretenso "irrealismo" tem uma função vital e decisiva na construção da realidade (que não se limita a mero dado), assumindo, pois, um carácter também realista.
Não nos remetemos à condição de resignados. Não nos curvamos ao jugo e à desculpa duma condenação. Acompanhando e confirmando a declaração de outros, não julgamos ser apenas os últimos de hoje; "afrontosamente", sustentamos ser os primeiros de amanhã.
As nossas recusas provêm do irrecusável, da aceitação de responsabilidades incómodas. As nossas rejeições traduzem um modo de assumir. Dizemos não, pelo imperativo sim a que estamos ligados. Não nos movemos no indiferentismo, nem com a interesseira prudência, nem por simples negativismo, mas sim na vivência da profunda afirmação.

GOULART NOGUEIRA

Mais papéis velhos

Tal como tinha prometido, vou continuar a transcrever, para proveito e exemplo, o que a briosa comissão ad hoc para investigação dos acontecimentos do 28 de Setembro de 1974 conseguiu apurar sobre as organizações reaccionárias da época. Do seu famoso relatório reproduzo o que diz respeito ao Partido do Progresso. Admire-se a perspicácia e a profundidade dos investigadores, e os crimes nefandos dos reaças.

9. Partido do Progresso/Movimento Federalista Português
A criação do Movimento Federalista Português deu-se logo após o 25 de Abril - e ainda nesse mês - por iniciativa do Professor Fernando Pacheco de Amorim e de outras pessoas.
Surgiu como conjugação de duas tendências ideológicas já existentes no regime fascista. Uma, tinha por base um grupo de militantes que vinham procurando refugiar-se na clandestinidade e que se auto-denominavam "Nacionalistas Revolucionários", actuando sob a capa legal da "Cooperativa Cidadela" (Porto e Coimbra); outra, constituída na sua maior parte por elementos com inclinações monárquicas. A linha-mestra que possibilitou essa união foi a defesa de uma solução federalista para o problema colonial. Para alguns dos seus fundadores, a mítica "evolução na continuidade" de Marcelo Caetano chegou mesmo a merecer, em tempos, a catalogação de "branda" e de "liberal".
A proliferação, contudo, de partidos de direita, desfazendo o sonho unitário que o Movimento Federalista acalentara, obrigou a que, em meados de Julho, se tivesse sentido a necessidade de o transformar em partido, com vista à luta eleitoral. Assim nasceu o Partido do Progresso.
Como dirigentes deste partido citamos, pela sua acção, Fernando Pacheco de Amorim, secretário-geral, Luís de Oliveira Dias, José Magalhães Valle de Figueiredo e Diogo Miranda Barbosa. Havia ainda outras figuras proeminentes no quadro da organização nacional, designadamente José Miguel de Alarcão Júdice, Luís Sá Cunha, José Augusto Carneiro da Costa Deitado e Joaquim Miguel Seabra Ferreira (director do "Tribuna Popular").
Neste periódico, "única voz da maioria silenciada", se repetiam um por um, todos os motes que pretendiam desacreditar a política seguida pelo Governo Provisório, nessa campanha orquestrada pela extrema-direita, visando a consecução dos seus intentos subvertores do espírito do 25 de Abril.
Por seu turno, um grupo de jovens que haveria de filiar-se no Partido do Progresso, constituiu no Porto um Comité Nacionalista de Acção Revolucionária (CNAR), que não passaria, afinal, de uma organização fantasma com o objectivo de, através de pinturas murais com frases ultra-reaccionárias e provocatórias, criar a ilusão da existência de uma organização clandestina da extrema-direita, forte e bem preparada, que desse alento aos saudosos do salazarismo. A inspiração para estas acções proveio e contou com o apoio de Fernando José Montenegro Sollari Allegro, o qual servia de meio para que a sede do Porto suportasse as despesas efectuadas pelo Comité.
De entre os factos relacionados com o Partido do Progresso, destacam-se, desde já, a contratação de um técnico de "marketing" político de nacionalidade americana (custou cerca de uma centena de contos a deslocação de Clifton White ao nosso País) e a existência nas suas instalações de uma longa lista de jornais a contactar e capazes de compensarem "em boa medida, o silêncio eventual da imprensa diária adversa" - seleccionados "por oferecerem maiores possibilidades de abertura ao ideário federalista e suas implicações", órgãos da imprensa regional cujo passado e presente dos seus responsáveis e escribas não deixa qualquer dúvida. E, para além de pormenorizados mapas do Instituto Geográfico e Cadastral que servem as Forças Armadas e nos quais se assinalavam indicações estratégicas, também vários livros foram sintomaticamente encontrados na sede deste partido - salientam-se: "Discursos de Salazar", "Livro Branco" de Pinochet, "Anti-Marx" de Pequito Rebelo.
A orientação política do Partido do Progresso não permite, pois, enganos a seu respeito - sendo mais um gravame a organização da sua "Comissão Operacional" que adiante será referida, em razão dos métodos e dos meios para ela preconizados.
Com base num estudo, encontrado nas suas instalações centrais, pode afirmar-se que o Movimento Federalista se considerava como gozando das simpatias dos meios militares afectos ao General Spínola e que dizia ter igualmente forte implantação no sector dos antigos combatentes, "bastante dispostos a aceitarem e a subscreverem um programa de defesa do Ultramar, de anticomunismo e de reformas sociais ousadas".
Finalmente, nesta breve caracterização do Partido do Progresso, note-se ainda que este teve diversos contactos e ligações com vários movimentos políticos fantoches surgidos nas colónias depois do 25 de Abril, tais como a "Associação Cívica Pró-Angola", a “ Frente Nacionalista Angolana", o "Movimento Federalista de Moçambique", a "Liga Popular dos Guinéus" e a "União Democrática de Cabo Verde".
Por outro lado, apurou-se que o Partido do Progresso mantinha relações com organizações fascistas estrangeiras, a saber: "Ordine Nuova", "Europe Action", "Giovane Nazione", com as quais Valle de Figueiredo, antigo aderente do movimento "Jovem Portugal" - organização da extrema-direita que actuava em Coimbra - se correspondia com frequência.


Uff!! Ainda bem que a revolução vigiava ...

A escola e a política

Penso que aquela corrente a que geralmente chamamos Esquerda ou Extrema-Esquerda, teve o mérito de ter sido a primeira a tomar consciência da realidade estrutural da inter-conexão de todos os sectores da mente e da actividade e, consequentemente, da realidade da impregnação ideológica destes sectores. A chamada Direita, pelo contrário, conservou-se durante bastante tempo prisioneira da ideia ilusória de que havia sectores “neutros” - ou (de um modo ligeiramente diferente) de que era possível voltar à situação anterior, na qual um consenso implícito era alcançável nestes sectores. Temos em França um bom exemplo dessa diferença de atitudes no campo da educação. Enquanto a extrema-esquerda se vai apossando de um importante número de posições-chave na educação secundária e universitária, a direita nada mais faz do que lastimar a “politização da escola”, que aparece de facto como irreversível (e que está hoje especialmente aberta ao criticismo porque é unilateral).
Aquilo que, no debate intelectual, fez a superioridade metodológica do esquerdista, foi ele ter sabido (e continuar a saber) o que cada um tem que pensar, do seu ponto de vista, em tópicos que são, à primeira vista tão diferentes como as relações de produção na Idade Média, a pintura abstracta, a invenção do cinema, o “Design” de “Mass Housing”, a genética molecular ou a teoria “Quantum” (ou pelo menos ele sabia que neste, como em qualquer outro tópico, a doutrina que ele tinha como sua, tinha uma palavra a dizer). A Direita pelo contrário não entendeu que não havia “verdades da ala direita” e “verdades da ala esquerda”, mas sim, caminhos de direita e de esquerda (para mais uma vez utilizar expressões convencionais) com o fim de calcular os factos admitidos, adquiridos pela mudança de conhecimento, organizando-os, colocando-os numa perspectiva particular que lhes dará igualmente um significado particular.
E é provavelmente a razão porque a esquerda e extrema-esquerda acertaram sempre mais sistematicamente na teorização, na formalização do seu “Approach” epistemológico e doutrinário, na criação de um corpus ideológico, útil para ser usado como referência em discussões posteriores.
Quer isto dizer que não há “ideologia da ala direita”? Claro que não. Mas em muitos casos, poderíamos afirmar que esta ideologia apenas existe por dentro, de uma maneira implícita. A direita ignora muitas vezes as suas potencialidades; muito raramente teve noção de todas as implicações das suas próprias aspirações. A sua “mensagem” está presente mas não explícita. Todo o trabalho, agora, consiste em trazê-la à superfície.

Alain de Benoist

quinta-feira, novembro 27, 2003

A PERSPECTIVA INTEGRAL

O homem nasce primeiro como um herdeiro. Ele não nasce em série, ele nasce dentro de um povo, dentro de uma cultura, dentro de uma dada era, e é desta particular posição em que está que ele será levado a emitir juízos de valor e juízos de facto; (é tão necessário aspirar à objectividade, como quanto teremos que nos resignar que sempre será impossível alcançar uma objectividade total. É impossível considerar “objectivamente” todos os aspectos de um problema, assim como o é olhar a terra de dois pólos ao mesmo tempo).
Nesta relação, as leis que governam as sociedades humanas não diferem muito das leis da microfísica: a posição do observador determina em parte o esboço da “paisagem” estudada.
O que é certo, por outro lado, é que as ideologias, isto é, os modos de ver e conceber o mundo, ainda quando não se associam como tal, não foram sempre conscientes de si próprias como o são hoje, numa era em que já foram grandemente acumuladas e formalizadas numa multidão de sistemas. Esta “súbita preocupação ideológica” é, obviamente, uma consequência directa ou indirecta da revolução de 1789. De facto, logo que o princípio de autoridade que naturalmente governava as sociedades da pré-revolução foi posto em dúvida na sua legitimidade e nos seus fundamentos, tudo o que antes “was going with saying”, tudo o que era espontaneamente considerado como posição integrante de uma “ordem natural”, apareceu como convenção, isto é, como uma criação humana subjectiva, e, em consequência, deparou-se com uma grande quantidade de facções político-ideológicas, pretendendo todas, sucessivamente, possuir uma “nova verdade” e procurando os meios de assegurar o poder para si próprias.
Paralelamente, desde que o Estado se colocou na posição de ser questionado pelas diversas facções, as quais estão aptas a uma tomada do poder de um dia para o outro (como é hoje sabido), vimos, enquanto todo um edifício de contra-poderes era levantado frente ao poder estabelecido, simultaneamente surgir toda uma multiplicação e expansão de pólos de pressão ideológica.

Alain de Benoist

Versos da Mão Esquerda

Em Portugal há e sempre houve muitos poetas desconhecidos. A maior parte deles são muito justamente desconhecidos – e sorte a deles em não serem mais conhecidos.
Há, porém, de quando em vez, descobertas singulares. Há poetas esdrúxulos (no sentido de casos originais, singulares, raros, fora da regra) que mereciam mais detida atenção e conhecimento.
Veja-se o caso poético deste que agora apresento em amostra.
José Jacinto Cutileiro nasceu em Évora no ano de 1911 e faleceu em Lisboa no ano de 1956. De sua formação académica doutorado em Medicina. Deixou apenas um livro publicado: “Versos da Mão Esquerda”.
Este o poema que deu nome ao livro.

VERSOS DA MÃO ESQUERDA

Saúdo aqui a mão
Com que estas linhas traço
Ossuda extremidade
Do meu sinistro braço.

Sinistro: contrário de dextro.
Dextro, em sentido corrente,
Que tem jeito, habilidade,
Que é capaz, inteligente.

Que sabe desempenhar-se
Das tarefas complicadas
A que a vida bem obriga
De maneira apropriada.

Sinistro, neste sentido
Corrente que mencionei,
Que é sombrio, propenso a crime.
Que não conhece outra lei

Senão a obcecação
Da sua própria vontade.
Ainda noutro sentido:
Desastre, calamidade.

Saúdo pois esta mão
Sinistra que, paciente,
Vai transportando ao papel
O que me passa na mente.

Por isso de ser sinistra,
Porém, é bem natural
Que dê sua preferência
Ao que chamamos de mal

Que se compraza traçando,
Em correcta ortografia,
Aquilo que só de noite
Ousa vir à luz do dia.

O filho que cada um
Recusa, à hora chegada,
Por ter sido mal nascido
De uma boda improvisada.

E, diligente e ossuda,
A mão sinistra e pequena;
Não por mal, mas por ser
Assim, sinistra e pequena

Sem qualquer consideração
Por todo o resto de mim,
Pela sua dextra irmã
Que nunca se porta assim,

Vai lançando no papel,
Aos olhos de quem quer ler,
Quanto eu sem ela decerto
Nem chegaria a saber.

Por isso a saúdo aqui.
Por essa sua coragem
Lhe presto, neste momento,
A mais rendida homenagem.

Mas porque sei que, sem ela,
Bem melhor vida teria
Apesar de a estimar tanto
Talvez a adextre um dia.


José Jacinto Cutileiro

O REGRESSO AO MISTÉRIO

Porém, também em outros campos do pensamento verdadeiramente vital se assiste a uma importante ruptura e renovação. Na Etnologia, na Filosofia, na literatura, na Metaciência, abre-se desde o princípio do século um novo espaço ontológico, um domínio do Ser e do Sagrado em que se reconhece, implícita ou explicitamente, a impotência da Razão. Surge outra vez a consciência dos limites da capacidade humana para conhecer e perceber. Se no período anterior o campo dos problemas invadiu o campo dos mistérios, hoje volta a Zona do Mistério para além da Zona do Problema.
Na Etnologia, Mircea Eliade procura as bases perdidas pela Antropologia, demasiado racionalista e positivista. Na Metaciência, René Guénon e Jullus Evola revêem os mitos, os fundamentos valorativos, revisitando o Sagrado e os altos valores da Tradição Humana. Na Filosofia Antropológica, Arnold Gehlen faz um exercício completo sobre a Cultura e a disciplina superadora, que assegura a manutenção da civilização. Contra o mito rousseauista não cessa de exigir um regresso à cultura., opondo-o ao reaccionário ensinamento que proclama o regresso à natureza como factor de redenção.
Na Filosofia, Max Scheller, Husserl, Heidegger, Jaspers, continuam a apontar uma linha de procura do absoluto e de superação da razão eficiente.
Na Psicologia, Jung, Jensen, Eysenck, Bertalanffy, voltam aos fundamentos biológicos (aos instintos) e extraem consequências da Genética contemporânea e da Etologia, todas fundamentais para a nossa mundovisão.
Pouco a pouco, todos os campos científicos se vêem afectados pela revolução silenciosa e pela necessidade de recorrer às novas descobertas para explicar e entender o Real.
Entretanto, o Deus Vivo, Aquele que é, que fora afastado pela ciência racionalista que tudo explicava pelas relações mecânicas e os modelos hidráulicos, entra novamente no campo do Saber pela mão dos grandes Físicos. O milagre, que tinha sido banido por decreto - tudo funcionava como um relógio sem necessidade de zelador - insinua-se hoje no plano dos quanta através da formulação de Werner Heisenberg, ou seja, através do indeterminismo básico de toda a construção universal. Grande é a liberdade das coisas materiais, que não estão acorrentadas às sábias doutrinas de causalidade fechada. Grande e sábio é o construtor de tão grande mistério, que na própria base tem o Mistério.
É talvez por isso que hoje em dia as mais belas páginas de espiritualidade se encontrem nos grandes físicos ocidentais que se revelam ao mesmo tempo como grandes crentes da Sua Sabedoria. Não assegurou Cristo aos judeus, que o perseguiam por ter curado ao sábado o paralítico, “Meu Pai trabalha continuamente e Eu também trabalho»? Esta operação contínua de conservação não pode encontrar melhores entendedores que os que trabalham na fronteira do indeterminado.
Esta onda renovadora que traz muito de ruptura, não pode deixar de ter consequências práticas, político-sociais, ou seja, encontrar formulação e concretização a nível do social. Os elementos superadores da Velha Mundovisão estão disponíveis num corpo de conhecimentos verdadeiramente revolucionários que fundamentarão uma nova visão do mundo, e da vida. E as novas linhas sociais, económicas, políticas, espirituais, demográficas, não podem colidir com o acervo científico acumulado por centenas de ignotos investigadores. Ao contrário, as teorias, as explicações, a prática, terão de ir ao encontro desse saber, procurando aí as respostas para ase suas perplexidades. Para a edificação de estruturas político-sociais estáveis, onde o homem reintegrado na sua herança natural e cultural, possa viver feliz.

António Marques Bessa (excerto de "Ensaio sobre o Fim da Nossa Idade")

A COSEDURA

Perfume em toda a casa. O pão divino
- No tabuleiro, após a cosedura,
- Entrou no monte e, fresco e matutino,
A malta ungiu com beijos de fartura.

O pão sagrado, o seu aroma fino,
Encheu de amor, de graça e de ternura
A casa inteira, a monte pequenino:
Um ninho branco a ressumar alvura...

Que aroma doce... O monte reproduz
A sua voz: o cântico doirado
Que o forno ergueu e as casas alumia.

Espalha-a brandamente... E a própria luz
Parece aroma a irradiar alado
O sol da vida: o pão de cada dia!...

CELESTINO DAVID

quarta-feira, novembro 26, 2003

REFLEXÃO SOBRE A ELITE

A desigualdade individual origina no plano social uma divisão entre fortes e fracos, já constatada por Duguit. Os fortes capturam os poderes sociais (político, ideológico, económico) e governam a maioria da população. É o fenómeno das elites dirigentes e dominantes, da hierarquia, que tão bem evidencia a análise da sociedade animal. A reflexão mais desapaixonada sobre esta matéria foi efectuada pela escola sociológica italiana, com Vilfredo Pareto, Gaetano Mosca e Roberto Michels. Estes autores provaram a perenidade da minoria, a minoria poderosa, que impõe a sua vontade sobre a maioria dando-lhe a impressão de ser ela a decidir e a governar.
Analisando a sociedade e o homem tal como eles são, estes autores anteciparam-se de quase meio século às realidades científicas do nosso tempo. Identificaram correctamente os detentores do poder real e formularam as leis segundo as quais decorre a disputa da força. Identificaram igualmente as justificações mais ou menos elaboradas que a minoria criou para o seu poderio e chamaram-lhe fórmula política. Dizer que o poder lhe vem de Deus, ou do Povo, ou que é do autocrata a título de conquista, são tudo razões óptimas desde que operem e cumpram a sua função justificativa. Acontece que hoje as fórmulas políticas são as ideologias e nelas não há, como se viu, o menor grão de credibilidade. Está por nascer a fórmula política do nosso tempo, que reduza democracia e socialismo, social-democracia e marxismo, a meros trastes velhos da história da pulhice do homo sapiens.
Os autores que situam correctamente estes problemas numa análise neomaquiavelista são poucos. Todos ainda preferem as visões românticas e penetradas pela ideologia, justificativas em última análise do poder da minoria actuante ou da minoria que aspira ao poder. Contudo, com o desaparecimento desses grandes vultos do pensamento político, não é menos certo que ficaram certos autores que importa conhecer e que reflectem, na Teoria Política, a revolução intelectual a que se assiste noutros campos do saber. Carl Schmitt, o velho professor alemão, James Burnham, Wright Mills e Julien Freund, chegam para assegurar um exercício impecável em matéria de realismo político e transparência de concepção.
As minorias, portanto, longe de se confundirem com a multidão, são pela sua organização e coerência o único fermento social de mudança e poder. Só caem para ceder o lugar a outras, de modo que a História não passa de um velho e enorme cemitério de oligarquias. A lei de ferro da oligarquia, formulada por Michels, apenas se faz eco desta constatação empírica, tão desagradável aos doentes do igualitarismo acéfalo, fervorosos crentes no alibi da tábua rasa.

António Marques Bessa (excerto de "Ensaio sobre o Fim da Nossa Idade")

Estremoz: a Cozinha dos Ganhões

A XI edição da "Cozinha dos Ganhões", tradicional certame gastronómico organizado pela Câmara Municipal de Estremoz, inicia-se na próxima sexta feira e prolonga-se até domingo.
A novidade desta edição prende-se com o facto deste evento se realizar no pavilhão do novo Parque de Feiras e Exposições do concelho.
Nesta edição da "Cozinha dos Ganhões" vão estar presentes oito tasqueiros e cinco doceiras oriundos de algumas freguesias de Estremoz.
Ao longo dos três dias, os amantes da gastronomia alentejana podem deliciar-se nas tasquinhas. A marcar presença estarão também os vinhos alentejanos, com especial destaque para os produzidos em Estremoz.
A acompanhar a comida, a organização preparou ainda muita música, dança e poesia popular.
Ficam todos avisados: vindos do lado de Lisboa é à saída da auto-estrada, em Estremoz, nos dias 28, 29 e 30 de Novembro, no Pavilhão do Parque de Feiras de Estremoz.
E quem não couber pode sempre abancar no “Isaías”, ou no “São Rosas”.

Tuna Académica do Liceu de Évora

A Tuna Académica do Liceu de Évora, no âmbito dos tradicionais festejos académicos do 1° de Dezembro, e na impossibilidade de o fazer pessoal e individualmente, convida todos os interessados (professores, antigos professores, tunos, ex-tunos, alunos, ex-alunos, e simpatizantes) a participarem nos referidos festejos.
Formalmente, a Tuna comemora este ano o seu centésimo primeiro aniversário – de actividade contínua e ininterrupta devidamente documentada.
Saliento portanto que se trata da única instituição deste género no país que pode invocar para si uma tradição mais que centenária – nada tendo a ver com recentes e inventadas “tradições” com dez anos, inteiramente artificiais e desprovidas de história, frequentemente a caírem na grosseria, na boçalidade e no primitivismo das mentes que as inventam.
Haverá Baile de Gala, Serão Académico nas Escadinhas da Sé, Alvorada no dia 1º de Dezembro, Récita no Teatro Garcia de Resende, Jantar de Antigos Tunos, Ceia no Monte Alentejano, etc.
Para mais informações, ver os sites da Escola Secundária André de Gouveia e da Associação dos Antigos Alunos do Liceu Nacional de Évora.

Feira do Montado

A quarta edição da Feira do Montado arranca hoje em Portel, a pensar no futuro da economia local.
O Segundo Encontro da Cortiça está entre as principais novidades do certame, que decorre entre 26 de Novembro e 1 de Dezembro, com exposições, iniciativas e animações várias, visando constituir um fórum de debate, de discussão e de políticas na área do montado.
Convidam-se os lisboetas a ganhar o fim de semana, conhecendo Portel, Alqueva e o resto – nomeadamente a gastronomia, para variar do ritual semanal da comida de plástico e das mangedouras colectivas dos balcões corridos.
Com sorte até acabam o serão ouvindo o senhor Presidente da Câmara cantar – e que bem que ele canta, seja a tradição alentejana, seja uns fados de sabor clássico ou umas canções de Coimbra, acompanhados pelo caprichado tocar das guitarras.

Marx e Freud: dois sistemas envenenados

“Pode-se ser antimarxista e reconhecer o génio de Marx; pode-se ser anti-freudiano e continuar a reconhecer o génio de Freud. Os dois sistemas falharam inchando de exageros, de petições de princípio, de preconceitos camuflados e - observando bem de perto - de erros em muitos detalhes. E contudo, encarados no seu conjunto, estes sistemas, têm o efeito irresistível das mudanças de clima. Quando lanço um olhar aos dezoito volumes das obras completas de Freud, nas prateleiras da minha biblioteca, lembro-me por vezes, do aviso de Rembrandt aos visitantes do seu atelier, convidando-os a olhar para as suas telas de longe. “Não metam o nariz nos meus quadros, o cheiro da pintura envenenar-vos-ia” .
Poder-se-ia perguntar em que momento esse cheiro a pintura fresca se transformaria em veneno - em que momento Marx se torna marxista e Freud freudiano. Seria satisfatório desculpar o mestre e atribuir todas as culpas ao alunos. Marx não teria certamente aprovado os métodos de Staline e Freud ter-se-ia dificilmente responsabilizado pelos pesadelos iluminados de uma Mélanie Klein. Mas as sementes de tudo isto estavam já presentes no próprio mestre na sua tendência fatal de saltar do pressentimento e da hipótese à asserção dogmática, de brincar como um malabarista com os símbolos, de propagar uma mitologia pessoal na qual mistura o museu Grévin e o Panthéon grego."


Arthur Koestler, no prefácio de “La scolastique freudienne”, de Pierre Debray-Ritzen.

terça-feira, novembro 25, 2003

Fascistas!

E como têm notado alguns bloggers mais vigilantes, parece que andam por aí uns perigosos fascistas a pedir música.
Pois que vão ao sítio certo, e descarreguem à vontade.

Giovinezza, Giovinezza, primavera di bellezza
nella vita e nell'asprezza, il tuo canto squilla e va.

CELESTINO DAVID

Nasceu na Covilhã, em 1880 e faleceu em Évora, em 1952, depois de ter vivido quase meio século no Alentejo, onde constituiu família e do qual foi sempre entusiasta e apaixonado.
Como poeta, publicou: "O Livro de um Português"; "Alentejo Terra de Solidão"; "Poemas Regionais"; "Évora Rapsódia de Imagens" e "Poemas Alentejanos".
Além dos livros, deixou também larga descendência, entre filhos, netos e bisnetos - não sei se também plantou árvores ou não, mas é certo que obra não lhe falta.

PRELÚDIO

Da terra alentejana as graças canto
Em versos claros de lirismo e cor.
Traduzo a vida, a luz e tudo quanto
Distingue e doira o meu país de amor.

Com devoção exalto, ao céu levanto:
O vinho feito sol, o trigo em flor,
A lã divina, a calma do seu manto,
A carne, o pão, e o tempo criador.

A vida escuto, a sua origem traço,
Da seiva ausculto a vibração que morre
Em voz e cor de cântico disperso...

Com alma e fé a linda terra abraço,
Aspiro o forte aroma que a percorre
E tento dá-lo, vivo, a cada verso...


Celestino David

João Branco Núncio

Em Novembro de 1976, no primeiro número da revista “A Semana”, de Miguel de Araújo, surgiu uma comovente despedida a João Branco Núncio, na hora do seu desaparecimento. Foi escrita por Mascarenhas Barreto, multifacetado autor, muito mais conhecido pelas suas incursões na História (o “Colombo Português”) do que pela sua vertente de aficionado.
Aqui fica essa vibrante homenagem a Mestre João Branco Núncio (a ele que nunca gostou que lhe chamassem mestre...), o maior vulto da tauromaquia portuguesa, nobre figura de alentejano, cavaleiro e lavrador.


UM HOMEM: João Branco Núncio

Que outra figura poderia escolher para breve antecâmara de crónicas taurinas?
Raros homens, neste século de galopante putrefacção do carácter, reuniram, como ele, tão altas virtudes de português autêntico: o amor à terra, a coragem moral e física, a generosidade discreta - quase humilde - o sacrifício abnegado nas mais cruéis circunstâncias.
Vejo-o fechando na mão tisnada um punhado de torrão seco, enquanto os olhos perscrutavam um céu desesperadamente nu de ansiada chuva. Na luta contra a terra, conquistara honradamente os frutos que generosos só são quando por eles se sangra um trabalho tenaz, constante.
Vejo-o fechando na mão tisnada o ferro com que, nas arenas ardentes de sol e emoção, desafiava o toiro, na mais nobre e tradicional festa popular portuguesa. Na luta contra a fera, soubera grangear o mais alto troféu de um toireiro: a admiração, o amor do povo que, ali, com ele se irmanava na valentia instintiva, no gosto por essa arte cinética secular.
Vejo-o, enfim, fechando na mão tisnada as rédeas amargas, quando vilmente espoliado da enxada que sempre trouxera na carne para desbravar a terra, empunhava agora a única que lhe restava - na alma: a do toireio equestre.
A este trouxera a inovação, o sentido simplista de síntese e medidas, e uma grandeza inolvidável.
Não só como Centauro se oferecera aos toiros. De igual, lidava-os a pé, de capote e muleta; corria-os em campo aberto, na euforia do derrube, no apadrinhamento da apartação dos bezerros - a mesma euforia e também o mesmo anseio criador com que sofria o despontar e o envigorar das searas, dos arrozais, da vida que só a terra dá e o homem rouba...
Com Núncio passou o toireio equestre a definir-se por axiomas diferentes, magistrais. Poder-se-à dizer que se tornou fronteira de estilos na lide montada: antes de Núncio; depois de Núncio. Contudo, na sua modéstia natural parecia não se aperceber de que criara uma nova era tauromáquica que seus contemporâneos seguiriam: os cânones nuncistas.
Como Juan Belmonte, para o toireio a pé, João Núncio foi expoente máximo para o toireio a cavalo. Em crónica futura se falará desta Arte.
Nasceu João Alves Branco Núncio a 15 de Fevereiro de 1901, na Herdade de Parchanas, de São Romão, para onde seu avô, Joaquim Mendes Núncio, lavrador da Golegã, se trasladara, em 1878. Aí, em Alcácer do Sal, cingiu esporas. Aos 13 anos, a 23 de Agosto de 1914, toireou pela primeira vez em público, num cavalo - Teodoro - que fora de Manuel Casimiro, quando a glória da "Festa Brava" equestre se disputava entre este cavaleiro e o Morgado de Covas. Depois, alternando com seu pai, Inácio Augusto Murteira, surgiu na Praça de Évora, a 20 de Setembro desse mesmo ano, "não apenas como um caso de precocidade, mas também, e principalmente, como deslumbrante revelação artística" - aplaudiu a crítica: era a sua segunda corrida.
Finalmente, veio a hora da regra tradicional: na tarde de 27 de Maio de 1923, António Luís Lopes concedeu-lhe a alternativa, na Praça do Campo Pequeno. Ele próprio a concederia, mais tarde, a onze cavaleiros tauromáquicos: Dr. Fernando de Andrade Salgueiro e Dom Vasco Jardim (1938), Francisco Murteira Correia (1943), Eng.° José Rosa Rodrigues (1944), Dom Francisco de Mascarenhas (1945), Francisco Sepúlveda (1952), Gastón dos Santos (1954), seu filho, Eng.° José Barahona Núncio (1962), Eng.° José Samuel Lupi e Alfredo Conde (1963), Frederico Cunha (1968) e José João Zoio (1972).
Em Espanha, onde múltiplas vezes ergueu as praças de entusiasmo e admiração, foi o primeiro cavaleiro português a matar toiros, a cavalo, a estoque. Em Portugal, consagrou-o o povo como sendo "o maior". Era-o, de facto: o maior vulto da história do toireio a cavalo em todo o mundo.
Depois, não mais parou de empolgar as arenas, senão quando o acidente da queda de um cavalo aniquilou seu filho e o desgostou para sempre de honrarias, ovações.
Contudo, aos 75 anos - salvados três cavalos do assalto infame da negra saga de ocupações predatórias - não lhe faltou coragem para enfrentar, de novo, a vida nos redondéis. Por fim, na Golegã, quando serenamente preparava um dos corcéis, veio a enfrentar a morte - derradeiramente.
Estava a cavalo, enforquilhado na sua sela-charrua; pés bem firmes nos estribos da honradez, da dignidade.
Pelos olhos nublados, entre terra e céu, ter-lhe-iam desfilado, nos cenários edénicos verde-azuis das lezírias e calmosos verde-pardos das charnecas, essas montadas fiéis em que se prolongara a sua imagem cavaleira: Relâmpago, Santander, Pregonero, Alpompé, Lidador, Numerário, Quo Vadis, Pincelim, Sultão, Gaio, Malhinha, Marialva, Temporal, Gaiato, Ribatejo, Glorioso, Garoto e tantos outros, crinas ao vento, alados como pégasos. Também os toiros, não como adversários de violência animal, mas como nobres lutadores leais (que não os homens semeadores de ódio) e sobretudo aquele inesquecível Trompeta que foi base da sua ganadaria de sangue Urquijo.
Inscreveu-se Núncio ao centro de um triângulo: Toiro, Cavalo, Terra. Triângulo iluminado de amor, quase signo da Pátria que ele visceralmente vivia. Nunca a traiu. Quem da vida faz altar de trabalho e esperança não pode - não sabe trair.
À terra desceu, entre o amor dos homens - não da escassa escumalha arrebanhada por traidores rapaces, mas do povo-Povo, em cujas veias corre sangue puro, como os ares lavados das manhãs campestres: seiva da própria terra.
Morto para a Pátria - com a Pátria -, outro triângulo mais alto o ilumina: o signo de Deus.


Mascarenhas Barreto

1º de Dezembro

Os meus amigos já pensaram como vão comemorar o 1º de Dezembro?
Lembrem-se que um dia destes pode ser proibido ...

PARA UMA ALTERNATIVA

A insistência nas causas profundas da crise ou decadência nacional contemporânea - o espírito do arrivismo, oportunismo e amoralismo sistemáticos, de uma classe dirigente sem princípios nem objectivos comunitários - leva à consideração de uma alternativa consubstanciada na restauração, numa perspectiva metapolítica, de uma ética e de uma concepção do mundo, do Estado, da Sociedade, como corpo de valores anterior â formulação pragmática das soluções. Mas esta ética ou concepção metapolítica não pode ser confundida nem com uma ideologia - uma mundivisão com tendência para o reducionismo e para o receituário programático geral - e ainda menos com uma cartilha de postulados preceituais, que encerram, magicamente, a verdade das verdades. A vivência ética do Estado e da Política não se corporiza nem espartilha em dogmas ou vademecuns, mas realiza-se na pesquisa e na realização existencial dos Valores, admitindo a prova contraditória e aceitando o juízo e a sanção da comunidade.
A reforma (ou revolução) intelectual e moral do País é, pois, a condição sine qua non, da restauração nacional. Assim como as falsas concepções e os pseudovalores trouxeram a dependência e a decadência, assim as perspectivas de uma política do real hão-de trazer o quadro mental para as soluções.
Tendo uma opção de teoria e valor, a sua dinamização social e comunitária depende dos seus suportes humanos, entendidos como os núcleos de intelectuais, de quadros, de militantes, de cidadãos activos e capazes de entrega e de serviço. Nesta pista haverá que procurar naqueles grupos que fizeram a prova de fogo da generosidade e da dádiva cívicas - como os combatentes - ou que por condição geracional estão libertos da teia manipuladora e paralisante das dependências e interesses criados - como os jovens - a massa crítica de recrutamento dos elementos para uma acção política renovadora. Os núcleos de mobilização e aglutinação de tais forças - ligas, núcleos universitários, movimentos - deverão ser dinamizados e projectada a sua acção numa perspectiva independente mas de convergência unitária, com base num projecto que seja em princípios, em valores e em estilo frontalmente distinto e alternativo à classe política.
A crise nacional tem também, na sua raiz, uma «traição dos intelectuais». Muitos dos mandarins e literatos empenharam-se,, no contrapoder e no grupo de pressão marxizante e, no seio do actual regime, constituíram lobbies que se anicham nos media, nos institutos e nos centros de poder e intoxicação da mediocracia partidocrática, contribuindo para manutenção do statu quo onde, ao lado de tecnocratas e burocratas do sector público e da direcção político-económica do sistema, participam na classe política. Que os intelectuais patriotas e independentes, dentro e fora da Universidade, constituam o contrapoder e a contracultura do sistema, contribuindo para revolução cultural nacional, eis a resposta ao sistema e o seu modo ideal de servir. E numa época propícia, já que, por todo o mundo euro-americano (e entre nós por reflexo) se observa uma decadência do modelo evolutivo e das suas várias versões, que só têm servido para aprisionar ou empobrecer os povos, e uma expectativa de regresso ou instauração das grandes certezas e valores comunitários.
O tempo é escasso e os perigos múltiplos nesta década e meia que nos separa do milénio. Entregues a uma alternativa diabólica dentro do regime - entre os moderados thermidorianos que, cada vez mais isolados ocupam o poder, e os maximalistas radicais que já entraram nos caminhos da desestabilização e da conspiração para o assalto ao Estado - todos os portugueses, patriotas e independentes, que cuidam do bem da Pátria, da continuidade da Família, da defesa das liberdades reais, têm de intervir, com disciplina, com lucidez e com coragem na vida pública, sacrificando os seus gostos e as suas repugnâncias circunstanciais, para cumprir o seu dever.
Só assim sobreviveremos como Nação; só assim podemos continuar como homens livres.

Jaime Nogueira Pinto (1985)

segunda-feira, novembro 24, 2003

Apoio à Vítima

Nestes tempos difíceis em que toda a sociedade se confronta com a realidade do crime, importa não esquecer a realidade da vítima.
Existe uma grande organização destinada a institucionalizar mecanismos de apoio à vítima (psicológicos, médicos, jurídicos, ou outros). É a Associação Portuguesa de Apoio à Vítima.
A APAV é uma organização de voluntariado social. Os voluntários são a força solidária da APAV e a razão do seu sucesso, disponibilizando determinadas horas por semana para apoiarem gratuitamente as vítimas de crime.
Quem sente a vontade e a disponibilidade para fazer qualquer coisa, tem um caminho: contacte a APAV.

MFA e partidos

Ainda não parei com as recordações do ano de 1974. Não se diga que são lembranças sem interesse, meras curiosidades sem relevância histórica. Com efeito, o quadro político-partidário ainda hoje vigente nasceu dos acontecimentos de então. Os que não passaram dessas eliminatórias nunca mais entraram no campeonato. E os escolhidos da altura monopolizaram até agora a representação política. A direita escolhida pelo poder militar para subsistir e ficar a representar essa função, de modo a poder ser apontada como tal para o estrangeiro apreensivo, foi o CDS. Não pode deixar de notar-se que o relatório oficial sobre os acontecimentos do 28 de Setembro nem uma só vez refere a existência do CDS, que já estava em pleno funcionamento desde Maio anterior. E o certo é que faz referência a acontecimentos concretos, ligados à preparação da famosa manifestação da maioria da maioria silenciosa, em que para além das pessoas e organizações que são mencionadas estiveram também pessoas do CDS e o próprio partido – pelo menos tão envolvidos como outros que ficaram apontados para pagar a conta.
Ou seja: o documento em causa parece-me tão revelador pelo que esconde como pelo que diz. Quem tomou o poder em 28 de Setembro de 1974 fez claramente opções sobre quem podia e não podia continuar em campo. Consequentemente, os partidos, organizações e jornais a quem saiu bola preta foram de imediato ocupados e saqueados, os seus responsáveis presos, e os que não o foram tiveram que exilar-se ou calar-se.
Os seleccionados para, embora de forma condicionada, continuar no sistema a representar a direita e o centro, foram apenas o PPD, porque já estava no governo, e o CDS, porque até estava representado no Conselho de Estado, e tinha fortes ligações internacionais – e sobretudo porque nessa fase a revolução ainda temia as reacções exteriores se avançasse também contra esses.
A evolução posterior veio a determinar que o sistema partidário se consolidasse assim – de modo ainda mais fechado e definido quando o permanecente PDC foi também colocado fora de jogo logo em Março seguinte.
Em resumo: os acontecimentos despoletados pela inventona do 28 de Setembro, completados depois com o processo ligado ao 11 de Março, foram o verdadeiro acto fundacional do sistema partidário português. O pacto MFA-Partidos só reduziu a escrito o contrato já imposto aos aderentes.

Termino agora com um saboroso naco do inestimável “relatório do 28 de Setembro de 1974”, onde os briosos investigadores militares puseram a nu as tenebrosas maquinações da reacção.

“6. Os meios de comunicação social eram, aliás, um dos pólos de atenção dos mentores da ofensiva da extrema-direita.
A sua utilização surge na sequência de uma campanha de dinamização política e financeira liderada por um grupo de influentes elementos fascistas que se organizaram para esse fim, entre os quais se destacam os nomes de: General Kaulza de Arriaga, que assegura o apoio financeiro; Pedro Feytor Pinto, que, perante a "importância dos jornais das vilas", para eles pode fazer uma útil "canalização"; Luís Folhadela de Oliveira, que escreve a um amigo de Vila Nova de Famalicão a comunicar-lhe que "a Rádio Alto-Douro, da Régua, pertence a um tipo fixe que está avançado em idade e quer que se faça barulho" e que andava a averiguar “quem é o titular de uma hipotética licença de estação de rádio para Braga"; Artur Agostinho, de cujos serviços este grupo se procura assegurar.
Diga-se ainda que outro dos propósitos confessados de tal grupo era o lançamento de dois jornais diários - um no Porto e outro em Lisboa; e que o apoio aos periódicos primeiramente mencionados era também ponto assente, em particular depois de, numa reunião efectuada no Algarve em Agosto, com a presença de José Harry de Almeida Araújo e de um indivíduo português da ITT, se ter concluído pela enorme dificuldade em conseguir posição nos capitais das empresas proprietárias de publicações e estações emissoras.
7. A utilização nesta campanha de certos meios de comunicação baseava-se, como é evidente, em três pressupostos:
- 0 de ter a reacção necessidade de fomentar a criação de um clima social propício ao desenvolvimento da manobra que intentava empreender, pelo descrédito que pretendia lançar sobre o Governo Provisório, sobre o Movimento das Forças Armadas e sobre o processo em curso desde o 25 de Abril, de modo a que ficasse justificada a instauração de um poder pessoal que salvasse a Pátria;
- O de serem eles veículos através dos quais poderia fazer chegar a sua voz junto das massas menos politizadas e, por isso, mais sensíveis às ideias que lhes desejava impor, pelo desempenho fiel e sectário do papel que a esses meios de comunicação reservava no contexto da ofensiva - preparação psicológica de certas camadas da população (maioria silenciosa ou não); e ainda
- O de vigorar no País uma liberdade de imprensa que lhe possibilitava pronunciar-se quase impunemente contra a nova ordem estabelecida, pela subversão ideológica confundida e baseada no uso de tal liberdade.
8. Por outro lado, era imperioso para as forças reaccionárias disfarçarem o seu reagrupamento e as suas actividades. Recorriam, para tanto, à invocação de fachadas partidárias muito próprias, sob as quais pretendiam entrar no jogo democrático, que não aceitavam afinal, mas que no condicionalismo presente lhes poderia servir de via para alcançarem os seus objectivos anti?democráticos.
Por isso, as organizações políticas à sombra das quais se refugiavam nomes altissonantes do fascismo, foram surgindo. Sem preocupações cronológicas, refiramos algumas das que mais directamente se relacionaram com o "28 de Setembro" e caracterizemo-las brevemente: (...)


Fica para outra vez a descrição das organizações proscritas, e dos facínoras a elas ligados. Tenham paciência, e não desamparem o blogue.

NOVA DIREITA - OS NÓS DA QUESTÃO

"Nova Direita" é uma designação inventada pela esquerda francesa. Mas que foi aceite, ao menos como bandeira provocadora. A realidade das ideias é mais complexa e deve ser situada com mais rigor.
Se me perguntassem sobre o que entendia como Nova Direita, diria muito simplesmente - e não há como ousar definições para a gente entender-se de uma vez para sempre - que poderemos defini-la como a Direita que avançando para um diálogo com a Ciência e incorporando novas áreas de preocupação, veio a confirmar cientificamente noções que já eram património da Direita tout-court. Ou seja: a “Nova Direita” trouxe à Direita a confirmação científica das suas principais noções. Pela atenção dada aos novos ramos de investigação, os autores que se reclamam da Nova Direita vêm dizer à Direita que as novas descobertas da Ciência confirmam os seus princípios fundamentais e que não há nada a temer - antes pelo contrário - do que se vai descobrindo no campo científico.
As noções de território, hierarquia, pessimismo sobre a natureza humana, desigualdade, totalidade, unidade orgânica, ganharam nova confirmação através dos trabalhos desenvolvidos pelas Ciências que se situam na vanguarda da investigação, desde a Etologia e a Genética das Populações, à Física Teórica e à Teoria Geral dos Sistemas.
“Diálogo com a Ciência” não quer dizer “cientismo” e é importante distinguir-se para poder responder a algumas observações que justificadamente se têm feito e a que não se tem dado a resposta pertinente.
Não se trata de culto da Ciência pela Ciência pois, a ser assim, cairíamos num reducionismo e num relativismo que levariam a erigir a descoberta de cada momento na verdade absoluta, passível, também a todo o instante, de ser revogada. Dar-se-ia o caso de haver descobertas que hoje postulam ou confirmam princípios da Direita, e amanhã logo as impugnam, porque novos dados contestariam o que hoje se tinha como certo e irrefutável.
Trata-se, tão só - ao contrário do que tem sido comum às teorias políticas tanto da esquerda como da direita - de dar atenção ao universo científico, recolhendo - por parte da Direita - a decantação que se vai fazendo e registando dos eixos fundamentais da investigação que se processa.
É sabido - ou deveria sê-lo - como a Mecânica Analítica, teorizada no século XVIII, repercutiu em todo o pensamento que se lhe seguiu, da Ciência à Política, e como a noção de substância fundou todo o conhecimento posterior. Postas em causa uma e outra, surgida a noção de campo, implementada desde a Teoria do Campo Electromagnético até à do Campo Unificado, que a Física Teórica mais avançada desenvolve, é lógico que a sua repercussão nos vários ramos do Saber terá de se sentir. E isto é verdade para uma série de outras noções que o património científico vai adquirindo e que também inevitavelmente acarretará sequências no plano doutrinário.

Divulgar e sintetizar

Quando Konrad Lorenz formulou os princípios fundamentais da Etologia partiu da recolha prévia de dados fornecidos por variados investigadores que trabalhavam, cada um, no seu campo particular de pesquisa. Um dedicava-se ao estudo dos macacos lemures. Outro a certa espécie de pássaro, aquele mais além virava-se para o estudo dos gorilas no Jardim Zoológico de Londres, e por aí adiante. A difusão destes conhecimentos, a sua divulgação feita por Lorenz, levou a criar--se uma corrente muito forte de interesse pela investigação do comportamento animal, de que nasceria uma nova síntese, pois a divulgação feita por Lorenz eclodiria necessariamente num novo enquadramento uma vez que a perspectiva com que esses trabalhos eram apresentados eram só uma e a mesma.
Como se sabe, não há divulgação atomística; há sempre uma ordenação prévia que acaba por hierarquizar os dados fornecidos dando-lhes, mais tarde ou mais cedo, nova animação.
Foi exactamente isto que sucedeu com os trabalhos de Alain de Benoist e é desde esta perspectiva que tem de ser analisada a sua “Antologia das Ideias Contemporâneas”, vista desde o ponto de vista da Direita. Não quero dizer com isto que desses trabalhos saia toda uma nova ciência ou uma nova filosofia; o que eu quero dizer é que está subjacente uma visão e uma ordenação que permitem estabelecer o trânsito da simples divulgação para a teoria, para o pensamento, que vem integrar novos dados num fundo que é permanente.
É neste plano que deve ser analisada a sua obra, e não noutro. E é neste plano que a minha geração lhe deve um serviço inestimável, eliminando certos preconceitos e evitando que caíssemos na perniciosa e tradicional alergia da Direita à Ciência, provando, pelo contrário, que nada temos a ver com o campo arqueológico vastíssimo que ainda é o pensamento político institucionalizado e vigente.

José Valle de Figueiredo

domingo, novembro 23, 2003

O pensamento e a acção

Nestes tempos em que a lucidez mandaria limpar armas, a imagem oferecida pela área dos que se dizem nacionalistas é deveras desoladora. Para os que guardam a ilusão de que tudo poderia ser diferente deve ser mesmo angustiante. Numa época em que todos os sinais dos tempos parecem indicar a iminência de grandes coisas, quando o mundo em que nascemos parece abanar por todos os lados e estar em vias de afundamento, seria de esperar que os que a si mesmos se elegeram paladinos de uma Nova Idade ao menos se erguessem em vigilância tensa, aptos e disponíveis para os combates que não podem deixar de vir.
Mas não. É como se os nacionalistas portugueses à força de “viver habitualmente” lhe tivessem tomado o gosto. Mesmo quando tudo aconselha a fazer o contrário. Parece que a habitualidade lhes corroeu a imaginação e a audácia, a inteligência e a fé. Assim, enquanto muitos dormem outros fazem flores.
Alguns limitam-se a repetir erros antigos; no entusiasmo gregário de fardas, hinos e bandeiras, esquecem as ideias, que são sempre o mais importante. Movem-se em círculo fechado, parados no tempo, fazendo gala de uma estética ultrapassada e de uma linguagem que só ela constituiria barreira suficiente para impedir a aceitação pela massas, cujo espírito crítico é apesar de tudo capaz de rejeitar a retórica balofa de quem nada traz de novo.
Outros nem se dão ao luxo de cometer erros. Encerraram-se nas suas torres de marfim, inventaram alibis mais ou menos consoladores para as próprias consciências, e esperam em casa que a história lhes vá bater à porta.
Poucos são os que, no cepticismo de quem conserva a cabeça fria e o espírito lúcido, se mantêm no seu posto sem desânimo nem descrença, sabendo que o futuro começa agora e que Deus costuma ajudar aqueles que se ajudam. Na trincheira que a cada um de nós coube sabemos que é preciso dar forma nova às verdades eternas, deixar morrer o que merece ser enterrado para afirmar no seu fulgor imaculado os princípios que nos comandam. Dentro da linha de modernidade e vanguardismo que é própria dos que se querem construtores do Futuro.
Apesar do panorama traçado não se julgue que pensamos haver razão para derrotismos. Antes pelo contrário: pensamos que o desespero é uma estupidez desprezível. Parece-nos que nada há de estranho em que as coisas sejam como são, e as explicações nem são muito difíceis de encontrar. E acreditamos que o fermento constituído por aqueles que nunca desistiram de intervir, e conhecem o mundo e a história, e sabem o caminho, há-de ser bastante para vencer a ganga que ao passado pertence e imprimir o rumo que leva à vitória.
Para os que não percebem muito bem o que isto quer dizer, deixamos uma frase para reflexão, esperando não os deixar ainda mais perplexos: “Todas as juventudes conscientes das suas responsabilidades tentam reajustar o mundo. Tentam pelo caminho da acção e, o que é mais importante, pelo caminho do pensamento, sem cuja constante vigilância a acção é pura barbárie”.
A frase é de José António e é sempre grata de recordar por quem sente que ela, por direito adquirido, também lhe diz respeito.


(palavras de um velho amigo deste bloguista)

CEIFEIROS

Estes ceifeiros não são
Os ceifeiros do Fialho.
Têm braços, mãos, almas duras,
Têm fogo no coração,
Têm amor ao seu trabalho,
Por ser trabalhar no pão.

Estes ceifeiros são
Grilhetas, são orgulhosos
De darem, ao mundo, pão;
Porque são eles que o dão
A pobres ou poderosos

Está hoje vento suão.
Está quente, - oh gentes! Está quente!
Vamos lá, outro empurrão!
Não vá desgranar-se o grão ...
- E a fila marcha prà frente.

Range o restolho cortado,
Pela serrilha da foice,
E aquele mar ondulado,
Que foi lindo mar doirado,
Não tem espiga que baloice.

Quando a gente está afeito,
Quase não sente o calor.
Cortar o pão quer-se feito
Co'a ternura, gosto e jeito
Com que se fala de amor.

A espiga está grada e bela.
O Inverno ainda vem longe
E, nesta vida singela,
Ter pão é estar à janela
E poder olhar pra longe.

Estes ceifeiros não sabem
Mais que a vida natural.
Mas têm a intuição que cabem,
As mãos que esta fama acabem,
Dons do sobrenatural.

Francisco Bugalho

Outro professor

Esqueci-me de referir outro blogue feito por um professor: o "Crónicas do Deserto", da responsabilidade, conforme se lê in situ, de um jovem eborense, professor de profissão, socialista e benfiquista por opção.
Fica o mea culpa e a reparação ... é sempre mais fácil escorregar para a injustiça do que seguir o rumo justo.

Vozes de professores

Afinal, existem mesmo vozes de professores a levantar-se e a fazer-se ouvir sobre o ensino e os seus problemas.
Encontrei excelentes textos a esse respeito no "Real Colégio", no "Portugal e Espanha" e no "Blogue de João Tilly".
Em qualquer dos casos, saber de experiência feito. Que outros venham, e se façam ouvir, é o que gostaria de esperar.
Estes merecem leitura e reflexão atentas.

sábado, novembro 22, 2003

O silêncio dos professores

Fui professor durante alguns anos. Conheci tanto o secundário, em todos os graus deste, como a universidade.
Já então o panorama era desolador.
Entretanto, segui outros caminhos. Afastei-me. Segundo me dizem os conhecidos que continuaram no ensino, as coisas nestes últimos vinte anos só têm piorado - e todos me transmitem uma visão depressiva e pessimista.
Tenho um amigo que é responsável pelo pelouro do pessoal numa Direcção Regional de Educação. Quando me encontra conta-me sempre com renovado espanto o que aprende aí: as baixas, as juntas médicas, as reformas antecipadas – parece que anda todo o pessoal docente em esgotamento ou quase, com problemas psicológicos ou mesmo psiquiátricos. Tudo à beira de um ataque de nervos (os que ainda não chegaram lá).
E não me admiro: o experimentalismo constante, as reformas sucessivas, as estratégias, o planeamento, as fichas para tudo e para nada, as orientações pedagógicas em mutação permanente, as teorias mais delirantes circuladas à vez por cada nova equipa reinante, os programas, os livros, tudo em revolução incessante, tudo somado a um burocratismo amalucado, são para dar cabo da cabeça mais sólida. Nem era precisa a indisciplina que da sociedade alastra para as escolas e para as salas de aula, fruto da deseducação institucionalizada em casa.
Os resultados do regabofe que tem sido o ensino nestas últimas décadas estão à vista de toda a sociedade: já temos resmas e resmas de licenciados que não sabem escrever – e nem ler, e nem falar, se entendermos estas acções como implicando um domínio um pouco mais que rudimentar do vocabulário e das regras básicas da língua.
Resta referir que tudo isto ainda por cima é sempre acompanhado de optimismo oficial e obrigatório – se não está tudo no melhor dos mundos para lá caminha, evidentemente. E o “sucesso escolar” medido invariavelmente pela não retenção do aluno: se todos transitarem de ano é um “sucesso escolar” retumbante - cem por cento, como dirão os relatórios a enviar para a Unesco.
Acresce que, como todos concordam, não é exagerado afirmar que as questões relacionadas com o ensino e a educação são de tal maneira cruciais que condicionam de todo o futuro da sociedade portuguesa.
Ora é perante estas constatações que não cessa de me intrigar o silêncio de uma classe tão numerosa como são os professores. Perante as experiências em que são passivas cobaias, os maus tratos, o desrespeito sistemático, a degradação que não pára, não se vislumbram reacções, nem públicas nem privadas, que não sejam a resignação, o alheamento, o desinteresse, o afastamento, quando a saturação chega e a paciência ou a saúde não dão para mais.
O direito à revolta, proclamado por um dos pais da pátria que temos, ainda não chegou a tais bandas.

Ordem Nova

O movimento “Ordem Nova” (não confundir com outros que noutras épocas usaram o mesmo nome) foi formalmente criado por escritura notarial de 25 de Julho de 1980. Teve como fundadores António Alves Dinis, António Júdice de Abreu, Eduardo Quinhones da Silva Pereira, Gilberto Santos e Castro, João Carlos Beckert d’Assumpção, Joaquim Navarro de Andrade, José Valle de Figueiredo, Luís da Silva Martinez e Zarco Moniz Ferreira.
Teve a sua sede instalada na Rua Tomás Ribeiro, n.º 8, em Lisboa, num terceiro andar em que sucedeu à “Renovação - Associação Nacional de Estudos Políticos e Sociais”, que ali tinha funcionado nos anos anteriores tendo como principais animadores Santos e Castro e José Valle de Figueiredo.
Uma vez em marcha, a Ordem Nova veio a ser fortemente marcada pela personalidade de Zarco Moniz Ferreira, secretário-geral, que lhe imprimiu os seus traços caracterizadores, nas palavras, nos actos, no estilo, na propaganda, até na encenação visual e estética.
Zarco Moniz Ferreira, entretanto falecido, foi presença constante nestes movimentos, desde o “Jovem Portugal” dos primórdios da década de sessenta até uma efémera “Frente de Libertação Nacional Sindicalista”, que criou em finais de 1977 e funcionou durante alguns meses de 1978 – da qual o que mais lembro foi que publicou um manifesto, uns folhetos, uns dois números de uma revistinha, “Em Frente”, e tinha como jovens animadores António Maria Pinheiro Torres e João Gonçalo Dias Rosas, então estudantes do Colégio São João de Brito.
A Ordem Nova atraiu alguma militância nacionalista, sobretudo jovens, dos meios estudantis e também trabalhadores, tendo a sua ala juvenil assumido todo o destaque, dada a crise que desde o início afectou de notória inoperância os órgãos estatutários (e que aliás haveriam de determinar mais tarde a decisão de dissolver a associação).
Essa juventude foi desde o início liderada por Paulo Teixeira Pinto, então jovem estudante de Direito, na Universidade Livre e na Faculdade de Direito de Lisboa, mas já largamente conhecido nos meios nacionalistas.
Teixeira Pinto desde os seus tempos liceais animara um grupo que ainda hoje tem marcas visíveis nas paredes de Lisboa (“Mocidade Patriótica”), nesse tempo em colaboração estreita com, entre outros, Filipe Gouveia. De seguida, ainda acompanhado por Filipe Gouveia, chefiara a Juventude Democrata Cristã, imprimindo-lhe uma orientação pouco consentânea com a designação. Posteriormente, e após um ensaio de aproximação ao Movimento Nacionalista, este já com alguns anos de funcionamento e estruturas de comando mais ou menos fechadas, surgira então como o responsável da juventude da Ordem Nova, fazendo-o enquanto esta durou com todo o entusiasmo, dinamismo e energia.
Para além de Paulo Teixeira Pinto, militaram nesses primeiros anos da década de oitenta na “Ordem Nova” muitos outros jovens, e alguns menos jovens, dos quais recordo Álvaro Santos (também já falecido), Luís Fernandes, Paulo Jorge dos Santos Filipe, Miguel Teixeira Pinto, Manuel Osório de Aragão, Filipe Silva Carvalho, Rui Tabosa, João Diogo, Francisco Garcia dos Santos, João Salvado Martinho, Pedro Cymbron, José Lúcio, Marcos Miranda, Paula Bussaco dos Santos, João Paulo Silva e Sousa, Luís Catarino, Pedro Pimenta Valentim, Nuno Serra, Bernardo Calheiros, Gonçalo Fragoso, Nuno Sarmento de Beires.

Missa de Domingo

Horário das missas de rito tradicional latino-gregoriano marcadas para este Domingo, 23 de Novembro:

Em Lisboa: às 11 horas, no Priorado São Pio X
Estrada de Chelas, 29-31 (junto à Avenida D. Afonso III)
(Em qualquer dos outros dias da semana, de Segunda-Feira a Sábado, é às 19 horas, no mesmo local)

Em Monforte: às 18.30 horas, na Capela Nossa Senhora Rainha de Portugal
Avenida General Humberto Delgado, n.º 3

sexta-feira, novembro 21, 2003

A AÇÃO INTEGRALISTA BRASILEIRA

Em 15 de Fevereiro de 1932,em São Paulo, Plínio Salgado fundou a Sociedade de Estudos Políticos (S.E.P.), que congregou jovens estudantes das escolas e elementos do maior valor intelectual e moral, que acabaram criando um movimento de profunda brasilidade meses mais tarde: a Ação Integralista Brasileira , que foi fundada oficialmente em 07 de Outubro de 1932.
As Raízes do Integralismo vinham de Euclides da Cunha, quando nos mostra o contraste entre o litoral e o sertão, vinha da inspiração de Gonçalves Dias, dos poemas de Olavo Bilac, enaltecendo o serviço militar, vinha do filósofo Farias de Brito, que incutiu no espírito de Plínio Salgado o sentimento espiritualista, vinha de Alberto Torres, que inspirou em Plínio uma apaixonada orientação Nacionalista, e por fim Oliveira Viana, que na opinião de Plínio Salgado foi o maior sociólogo que o Brasil produziu.
A partir daí, Plínio Salgado organizou a AIB em todo o País, ensinando ao povo a mística da Grande Nação. Os Integralistas passaram a pregar a Unidade da Pátria, a independência da Nação de qualquer influência estrangeira, o culto das tradições e dos Símbolos Nacionais; a moralidade e as virtudes públicas e privadas, o respeito à Ordem e o amor da Disciplina, e à Brasilidade mais pura, e o prestígio ao Poder Central.
Grandes figuras públicas brasileiras no início de suas carreiras políticas cerraram fileiras nas hostes Integralistas, como Gustavo Barroso, Miguel Reale, Câmara Cascudo, Alceu Amoroso Lima e D. Hélder Câmara. De 1933 em diante, o Integralismo prosseguiu sua obra construtiva, fundando nesse período mais de 4.000 núcleos de nacionalismo e propaganda doutrinária; puseram em funcionamento milhares de escolas de alfabetização em toda a Nação Brasileira, milhares de ambulatórios médicos, lactários, farmácias, campos de esporte, bibliotecas, cursos profissionais e outros serviços de Benemerência. Fundaram mais de 100 jornais, dos quais 8 eram diários. Fundaram uma revista de cultura, e realizaram numerosos cursos de altos estudos relativos a assuntos nacionais ou universais. Tudo isso, foi feito mediante um sentido de extrema exaltação mística. O Integralismo organizava-se com nobre aspiração religiosa (Deus dirige o destino dos Povos). Pregavam a Revolução Interior, a mudança de costumes das pessoas. Um verdadeiro ascetismo purificava as almas de milhões de homens e mulheres (em 1936, a AIB chegou a ter mais de um milhão de membros filiados!).

(dedico este texto à memória de Plínio Salgado - que Deus conserve para sempre junto do Si - e ao Embaixador Dario de Castro Alves - que Deus conserve muito tempo junto de nós.)

QUEIMADA

Lenta, ondulante, latente,
Fulgurante ou decadente,
A longa queimada vem,
Na faixa do horizonte.

Avança desde o poente,
Enche a noite e cala a fonte.

Tudo se cala, se encerra,
Em volta na escuridão,
Toda a paisagem se aterra,
Não há estrela na amplidão:
- Que o lume, raso se aterra
Matou-lhe a cintilação.

Há cheiro a palha queimada,
A matos secos ardendo,
Gritos soando, na noite,
Há caça, louca, correndo,
Sem saber onde se acoite,
À espera da madrugada.


Francisco Bugalho

Famílias numerosas

A coragem e o heroísmo podem assumir múltiplas formas.
As menos notadas e elogiadas são as que vivem na tranquilidade do quotidiano, ao nosso lado.
Se eu mandasse, havia um monumento às famílias numerosas; e às mães, e aos pais, que dessas famílias fizeram as suas vidas.
Conheçam a associação - e meditem no que eles dizem.

0 Alentejo na poesia de Miguel Torga

MIGUEL TORGA, acima de tudo poeta da terra, foi uma das vozes que melhor sentiu e cantou o encanto da planura alentejana.
Do seu "Diário", ficam aqui dois pequenos poemas do grande escritor transmontano.

"INSÓNIA ALENTEJANA"

Pátria pequena, deixa-me dormir,
Um momento que seja,
No teu leito maior, térrea planura
Onde cabe o meu corpo e o meu tormento.
Nesta larga brancura
De restolhos, de cal e solidão,
E ao lado do sereno sofrimento
Dum sobreiro a sangrar,
Pode, talvez, um pobre coração
Bater e ao mesmo tempo descansar...

* * *
Terra parida,
Num parto repousado,
Por não sei que matrona natureza
De ventre desmedido,
Olho, pasmado,
A tua imensidade.
Um corpo nu, em lume ou regelado,
Que tem o rosto da serenidade.

A jumentude

Bem o dizia o meu avô, com a sua sabedoria de alentejano velho.
Estes rapazes de agora são como os frangos de aviário: crescem muito, mas não cantam nem galam nada.

Eu já escrevi sobre isso ...

Aqui neste blogue publiquei eu há tempos sete "reflexões sobre o Iraque", que, confesso, acabrunhado, não impressionaram ninguém. Ninguém achou aquilo nada de especial.
Ninguém, vírgula: eu, ao contrário, sempre achei que se tratava das observações mais bem observadas que já aqui deixei para alheia observação.
Com mais reflexão, continuo a reflectir do mesmo modo. Eu é que tinha razão! Agora até já se fala em público na teoria dos três iraques, já se vislumbram fissuras entre as linhas de orientação americanas e israelitas ...
Se isto vai por este caminho, ainda reclamo estatuto de profeta.
E ainda não expus a minha teoria sobre a "guerrilha universal" ...
Ora vão lá reler, se faz favor.

quinta-feira, novembro 20, 2003

Tem música, sim senhor!

E para que não digam que ao meu blogue só falta ter música, ou que me esqueci do 20 de Novembro, ofereço aqui a música adequada ao dia que passou.
Vão ao "Cancionero de Juventudes", e ponham-se em escuta. Recomendo que comecem pelo "Cara al Sol", pois claro, e depois sigam com "Montañas Nevadas", "Prietas las Filas" e "Cubre tu pecho".

Montañas nevadas,
banderas al viento,
el alma tranquila,
Yo sabré vencer!
Al cielo se alza
la firme promesa,
hasta las estrellas
que encienden mi fe.

TOSQUIA

Rente, rente, rente
A tesoura corta.
E, na tarde quente,
Junho está à porta.

Vem do campo, em volta,
Mágico fulgor
De aroma, que solta
O feno inda em flor

Aperna-se o gado,
Pra tirar-lhe a lã.
Ficou encerrado
Desde esta manhã.

Rente, rente, rente;
Que a tesoura corta
E, na tarde quente,
Junho está à porta.

Um halo de neve,
Espuma ou algodão,
Envolve de leve
As reses no chão.

Na luz forte, em roda,
Zumbem as abelhas.
E há balidos soltos
E tristes de ovelhas.

E ao soltar aquelas,
Livres, já, dos velos,
Parecem gazelas,
Em saltos singelos.

Rente, rente, rente,
A tesoura corta.
E, na tarde quente,
Junho está à porta.


Francisco Bugalho

De novo a poesia

Deixando o intermezzo histórico, a que todavia regressarei em breve, volto-me novamente para a poesia. O espírito pode debruçar-se sobre o campo chão das coisas do tempo, mas a alma aspira às alturas. E volto a afixar um poema de Francisco Bugalho, que já mencionei pela sua dedicação a Castelo de Vide e ao agro alentejano. Aqui fica, em manifesto deslumbramento pela paisagem e pelo homem que a enche – sempre a fidelidade às raízes.

CORTICEIROS

No silêncio ardente do dia parado,
Há lida de gente no denso montado.
Há troncos despidos, já lívidos, frios,
E troncos que esperam, em funda ansiedade,
Com gestos convulsos, de sonhos sombrios,
Em dor e silêncio, por toda a herdade.

Os pés descalços trepam ágeis,
Sobem ...
O machadinho crava-se e segura,
Como se fora um croque de abordagem,
O homem
A subir, na faina dura.

E há pasmo na canícula.
E há silêncio, de assombro, na paisagem!

Troncos dilacerados!...

E lembra-me, assim vistos a distância,
- Os vultos a trepar pelos troncos gigantes –
Como, em contos de infância,
Cornacas dominavam enormes elefantes.

- Que os troncos majestosos e inermes
Têm o ar daqueles paquidermes,
Lentos, laboriosos, resignados. –

Desses trágicos braços contorcidos,
Que mais tarde, a sangrar ,
São a gala maior desta paisagem,
E, agora, estão gelados, confrangidos
Pela tortura sem par,
No pino da estiagem,
Vão homens rudes, escuros e suados,
Lenço metido sob o chapéu largo,
Arrancando aos bocados,
Em férrea luta obscura,
Com qualquer coisa de febril e amargo,
A epiderme dura.

- Oh, velhas árvores dos montados!

Movimento Popular Português

Continuando aqui generosamente empenhado em fazer luz sobre os acontecimentos de 1974 que têm vindo a ser referidos de forma notoriamente parcial no blogue “Aliança Nacional”, venho hoje aditar o que a fls. 31 e 32 do “relatório do 28 de Setembro de 1974” ficou escrito pelos desconhecidos membros da “comissão ad hoc encarregada de investigar os acontecimentos do 28 de Setembro”.
Com a autoridade que resulta da sua indiscutível fidelidade ao processo revolucionário em curso, e com conhecimento profundo dos factos, escreveram os dedicados militares de Abril, explicando honradamente que o faziam “após termos procedido à análise de número considerável de documentos e termos apreciado as declarações de detidos e outras pessoas chamadas a depor”, as seguintes linhas sobre os delitos imputáveis a alguns antros de delinquência a que o citado blogue lamentavelmente tem procurado dourar a imagem:

“12. Movimento Popular Português (MPP)
A ideia da constituição de uma frente unida de forças de direita que pudesse "dar combate nas eleições" às forças de esquerda era uma das linhas mestras da actuação deste Movimento Popular Português. Nesta base, pretendia que fosse dada existência a uma Frente Democrática Nacional (FDN), que viesse substituir as iniciativas já tentadas de uma Frente Democrática Unida (FDU) e de uma Frente Social Democrata (FSD), a qual englobaria todos os partidos das direitas.
Surgido em Maio de 1974, o MPP envia, no princípio de Julho, uma carta ao Primeiro-Ministro Palma Carlos em que, agradecendo uma audiência que por este lhe tinha sido concedida, adianta os seus “propósitos inequívocos de contribuir com a sua actividade para compenetrar a grande massa silenciosa dos portugueses das suas enormes responsabilidades nesta hora em que é mister para salvação da nossa Pátria no seu todo pluricontinental a criação de uma grande frente unida para combater o avanço das ideias marxistas e para simultaneamente apoiar o Chefe do Estado e o seu Primeiro-Ministro para que possam levar a cabo o programa que nos anunciaram logo após o golpe de estado de 25 de Abril."
Da comissão organizadora do MPP fizeram parte o Eng. Adelino Felgueiras Barreto, o Eng. Agnelo Galamba de Oliveira e o Dr. Manuel Braancamp Sobral, presentes na audiência referida.
Outras das orientações que norteavam a actuação do MPP eram, respectivamente, o anti-marxismo (confundido e identificado com anticomunismo) e o integralismo da Pátria. Estas linhas ressaltam claramente de uma passagem da seguinte carta enviada por um dos seus aderentes: “. . . A ideia inicial consistiu em enquadrar todas as forças da direita e centro-direita, num movimento amplo que não se limitava à propaganda de ideias muito específicas, mas que se lançasse numa acção permanente de combate, como meio para atingir a maioria das várias forças da direita e centro com base em dois princípios fundamentais: o anticomunismo e a defesa da Pátria do Minho a Timor"...
O anti-marxismo foi largamente demonstrado em cartazes extremamente reaccionários que o MPP mandou imprimir e afixar, tarefa para a qual se serviu, no Norte do País, do Partido Nacionalista Português.
A difusão das suas ideias contou ainda com a utilização do Círculo de Estudos Sociais Vector e também da revista "Resistência", na direcção da qual estavam indivíduos intimamente relacionados com o MPP, tais como o Dr. António da Cruz Rodrigues e José Luís Pechirra. Este último, aliás, igualmente esteve na origem de um opúsculo largamente distribuído pelo Pais e que se intitulava "PCP um Partido Fascista", subscrito pelo pseudónimo José V. Claro.
Tal como a revista "Resistência", o MPP tinha como principais centros de implantação os meios católicos do interior e norte do País. Nos seus planos de acção se incluía ainda uma campanha nas aldeias a “desmascarar” os cursos de alfabetização.
O MPP colaborou, finalmente, , com a manifestação da "Maioria Silenciosa".


P. S. – Fartei-me de rir com aquela descoberta sobre o Dr. Pechirra! Andou meio país a perguntar-se quem era o “José V. Claro”, e zás!, os nossos militares revolucionários descobriram logo que quem via claro era o Pechirra. Ah valentes militares sem sono!

ACÁCIAS RUBRAS

Era uma vez ...
Era uma vez uma bela cidade debruçada sobre as águas azuis de uma grande, vastíssima baía, saída de sete rios, entrada para sete mares. Nela vivia gente de todas as raças, - europeus, africanos, asiáticos - como se fossem todos de uma só raça. Nela havia templos de todas as religiões. Era uma cidade ecuménica. E, além de ecuménica, paradisíaca: Todos os anos, quando Outubro chegava, toucavam-se de lilás as copas frondosas dos seus jacarandás; semanas depois, ao romper da manhã, o Sol incendiava as suas acácias rubras.
Era uma vez uma cidade, onde toda a gente se conhecia, onde toda a gente se cumprimentava, onde toda a gente perguntava: -"como está, passou bem?,". Ninguém tinha pressa e todo a gente atravessava as ruas nos sítios onde elas deviam ser atravessadas - e só nesses.
Não havia nessa cidade - e com grande espanto das cidades suas irmãs - o uso da gorgeta. O facto de se servir uma cerveja bem gelada, de se cortar o cabelo e desfazer a barba a uma pessoa, de se deslocar de automóvel um transeunte, implicava, apenas, o custo do serviço.
Também com espanto dos outras cidades suas irmãs, havia cinzeiros nas mesas dos cafés dessa cidade. E ninguém ignorava que os cinzeiros estavam ali para receber a cinza e as pontas dos cigarros e não para serem levados para casa, como se fossem lembranças das Caldas da Rainha. Era, em suma, uma das mais civilizadas, mais bem-educadas cidades que até hoje conheci por todo o mundo.
Tinha a cidade, como todas as cidades, enormes bairros suburbanos; imensas “favelas" - mas por essas favelas qualquer pessoa passava tranquila a toda a hora; a delinquência não vivia ali. E tinha, como todas as cidades já têm, prédios muito altos, muito parecidos com armários, colmeias de cimento, ficheiros gigantescos de aço e de vidro; mas não eram prédios para neles se viver - eram prédios para negócios; para se viver, cada qual tinha a sua casa, o seu pequeno jardim, a sua varanda. Em matéria de urbanização, poucas cidades se lhe comparavam.
No campo gastronómico, essa linda cidade era famosa, pelos seus camarões fritos ou grelhados; eram bons, os camarões. E eram baratos!
Como todas as cidades, grandes ou pequenas, lindas ou feias, também essa tinha os seus segredos, a sua história-que-não-se-conta, as suas esquinas de pecado, que eram, às vezes, apenas, o pecado das suas esquinas. Mas tinha, em contrapartida, o discreto recato daqueles frutos muito doces, muito saborosos, que todavia não dispensam o talher de sobremesa ...
Agora, em cada Outubro, vejo florir num jardim vizinho de minha casa a copa desgrenhada de um velho jacarandá, trazido para Lisboa sabe-se lá por quem, sabe-se lá quando, sabe-se lá de que terra dos trópicos. Sei que tal acontece nos jacarandás da perdida e distante cidade. Sei que todos os anos, quando Outubro chega, continuam a toucar-se de lilás claro os jacarandás, para semanas depois, como sempre, o Sol incendiar as acácias rubras; fazer de cada árvore uma fogueira: Mas o resto, como é agora? O resto, como foi e para onde foi?
Nunca me recordo de como se chama agora aquela cidade. Só me lembro de que se chamava então - Lourenço Marques.

0 RECORDADOR


A pequena crónica acima transcrita foi publicada há 22 ou 23 anos no semanário “A RUA” (não sei a data, porque a encontrei num recorte sem data). Saiu numa coluna intitulada “Do passado ao presente”. Também não tenho a certeza da identidade de quem a escreveu; embora as opções sejam poucas ...
Publico-a hoje aqui lembrando a memória saudosa de António Maria Zorro e de Abel Tavares de Almeida; e com um aceno de amizade para José Maria Zorro, José Maria Tavares de Almeida, e, sempre, Cristina Câmara.

quarta-feira, novembro 19, 2003

Papéis Velhos

Constatando que o Dr. Cruz Rodrigues tem vindo a puxar pelas memórias, e porque a história sempre foi uma das minhas paixões, resolvi ajudar recorrendo a material de arquivo.
E, como se verá, a fontes indiscutivelmente autorizadas. Nada menos que o pomposo e solene “Relatório do 28 de Setembro de 1974”, editado pelo Movimento das Forças Armadas, no ano da desgraça de 1975, no qual a “comissão ad hoc encarregada de investigar os acontecimentos do 28 de Setembro” deu a conhecer ao país e ao mundo as malfeitorias de que tinham sido capazes as negras forças da reacção no período subsequente à alvorada libertadora – até ao dito 28 de Setembro, altura em que as forças da liberdade se tinham encarregado de pôr fim a tais desmandos, pondo a bom recanto, em levas prisionais de centenas de cada vez, os malfeitores que não puderam ou quiseram atempadamente colocar-se no seguro do exílio.
Por agora fica só aqui uma pequena amostra; a fls. 23 e 24 figuram uns trechos directamente relacionados com o que tem vindo a ser publicado na Aliança Nacional. Ora lá vai.

“Por agora, detenhamo-nos na enumeração de alguns dos factos mais significativos apurados, após termos procedido à análise de número considerável de documentos e termos apreciado as declarações de detidos e outras pessoas chamadas a depor.
A matéria de que dispomos permite afirmar, desde já, que manobra de tal envergadura fora objecto de preparação consciente e responsável. Com efeito, a partir de fins de Julho, o País começou a assistir a uma ofensiva orquestrada pela extrema direita, que se manifestava nas inscrições provocatórias, na difusão de boatos alarmistas, numa ampla afixação de cartazes com palavras de ordem reaccionárias e ainda, com especial relevo, através de uma certa imprensa identificada com o seu ideário. Nesta imprensa se destacaram os periódicos "Tempo Novo" (órgão do Partido Liberal), "Tribuna Popular" (órgão do Partido do Progresso) e "Bandarra", que pretendia apresentar-se como independente para se poder afirmar "imprensa livre".
4. Este último - propriedade da "Editorial Restauração" que meses antes suspendera a publicação de um outro semanário cronicamente deficitário , e que também lhe pertencia, "O Debate" - merece uma referência particular, seja pela forma opulenta com que se apresenta, seja pela matéria criminosa com que preenche as suas páginas.
Quanto ao primeiro aspecto - o do financiamento do luxo das edições - refira-se desde já que o Banco Espírito Santo & Comercial de Lisboa aceitou duas livranças de quatrocentos mil escudos, subscritas pelos administradores da editorial.
Este empréstimo justificava-se, uma vez que o movimento da empresa não era de molde a proporcionar-lhe lucros que pudessem cobrir os custos do semanário. Diga-se ainda, a propósito, que dela são accionistas preponderantes Pedro Soares Martinez, Bernardo Mendes de Almeida (Conde de Caria) e Filipe de Bragança.
Quanto ao segundo aspecto - o da matéria escrita, onde se multiplicavam as provocações à população e ao Governo Provisório e tendo como constante a agressão ideológica, realizando assim uma das finalidades da citada ofensiva da extrema-direita, mais exactamente, a preparação de um clima social e psicológico propício ao êxito da manobra.
O autor desses textos é Manuel Múrias, salazarista dos mais convictos, responsável, juntamente com Míguel Freitas da Costa, pela orientação deste periódico, o qual, na edição com a data de 28 de Setembro, anunciava implicitamente a vitória sobre as forças democráticas.
5. Além destes três citados jornais, muitos outros colaboraram na propagação do clima contra-revolucionário. Uns, ligando-se directamente a elementos activos de partidos reaccionários e outros, apenas por identificação ideológica.
É curioso citarem-se alguns, para exemplo, sem se esgotar, porém, a sua enumeração. Assim, referimos de Lisboa "A Resistência" e o "Economia e Finanças", de Braga "O Clarim", de Ovar o "João Semana", de Valença do Minho "O Valenciano", de S. Tiago (Seia) o "Mensageiro Paroquial", de Beja o "Jornal do Sul", o "Jornal da Bairrada", o "Vilaverdense", o "Jornal de Famalicão".
Seria longa a lista de publicações que procuravam denegrir a nova ordem portuguesa. Em especial no Minho, encontramos muitas outras que poderíamos abarcar nesta referência. Julgamos desnecessário prolongá-la, pois o teor de muitos outros jornais de província facilmente evidencia o seu reaccionarismo”.


Creio que está esclarecido o mistério das letras que nunca foram apresentadas a pagamento pelos novos responsáveis do Banco; pura e simplesmente a “comissão ad hoc” tinha-se apoderado delas como documentos comprovativos dos crimes da reacção, e nunca mais as devolveu. Perderam-se. E deixaram de existir para o banco: não estavam na instituição!
Muito mais existe no delicioso relatório, no mesmo estilo de detective de caserna. Mas lá iremos. Em pequenas doses.